Memória. Território de disputa. De significados, de formas de entender o mundo. A memória não é só disputa pelo passado mas também pelo presente e, principalmente, pelo futuro. A memória caminha com o povo, com suas lembranças e esquecimentos sobre conquistas e resistências.
Na madrugada deste sábado (17) para domingo (18), caminhando pela noite virão mais uma vez os Zumbis Contemporâneos, na tarefa de lembrar uma revolta de negros escravizados, de apontar seus heróis e mártires: Chico Prego, Eliziário Rangel e João da Viúva. A história a contrapelo. A história dos vencidos continua a ecoar… teriam sido mesmo vencidos, então?
Este ano será a oitava vez que se realiza a Caminhada Noturna dos Zumbis Contemporâneos, saindo de Serra Sede rumo às ruínas da Igreja construída há 169 anos pelos negros, que após o feito não tiveram cumprida a expectativa de alforria e liberdade e decidiram se rebelar, numa das maiores revoltas contra a escravidão do Espírito Santo.
O lema deste ano traz a luta para o presente: “O sangue dos mártires de Queimado exige: parem de matar a juventude negra”, lembrando que a violência e dominação seguem nos dias de hoje, afetando principalmente os descendentes da escravidão.
“Hoje o movimento negro da Serra busca lembrar símbolos que para transmitir às novas gerações a questão da luta, da militância, de manter as tradições. A gente busca muito a ancestralidade e temos como referência muito importante os heróis de Queimado”, diz Márcio Barros, do Fórum Chico Prego, que organiza a caminhada e hoje atua também como diretor de Esportes da Secretaria de Turismo, Cultura e Lazer da Serra (Setur), além de integrar o Movimento Negro Unificado, ambos apoiadores do evento.
A noite de sábado vai começar com uma grande celebração a partir de 21h na praça da Igreja Matriz da Serra, contando com apresentações de capoeira, maculelê, dança afro, poesia, hip hop, contação de histórias e outras atividades relacionadas, com presença de figuras importantes do movimento negro e cultural como Teodorico Boa Morte, João Luiz Castello, Mizinho do Samba, Clério Borges e outros.
À meia noite terá início a caminhada noturna, não sem antes saudar a estátura de Chico Prego, localizada nas proximidades. Dali, são 18 km noite adentro até chegar nas ruínas de Queimado no início da manhã de domingo. Quilômetros que serão preenchidos com declamações, palavras de ordem e outras intervenções para lembrar a história e fortalecer a militância.
O caminho, conta Márcio, é o mesmo que os negros escravizados de Queimado faziam para buscar utensílios na Serra Sede, o faziam a pé enquanto seus proprietários ia à cavalo ou charrete. “Quando Chico Prego foi capturado veio carregado pelo percurso no sentido oposto, arrastado até a Igreja Matriz para ser enforcado. É um caminho de sangue e sofrimento, com todo um simbolismo”. Ele destaca que é preciso vir preparado para atividade física, já que se trata de um percurso considerável, com beleza única, desconhecido pela maioria dos capixabas. “Mas venham especialmente com o coração preparado para muitas emoções, para conhecer mais da história do povo negro, com a mente aberta, será uma experiência marcante para todos”, considera.
Durante o caminhar haverá duas paradas: uma para um café no sítio Recanto Morro do Céu e outra na Lagoa das Almas, local onde eram lançados corpos dos escravizados que não tinham uma cova, o que o faz emblemático para o movimento negro. Após a chegada na manhã de domingo, será realizada uma celebração afropopular interreligiosa na entrada da mata de acesso à Igreja de Queimado, com participação de integrantes das religiões de matriz africana e de igrejas cristãs.
SERVIÇO
8ª Caminhada Noturna dos Zumbis Contemporâneos – 169 anos da Revolta de Queimado
Data: 17 e 18 de março
Concentração: A partir das 21h na Igreja Matriz de Serra Sede – com diversas atividades culturas e políticas
Saída: Meia-noite, com percurso de 18 km até as ruínas da Igreja de Queimado
Chegada: pela manhã, com celebração ecumênica às 9 horas de domingo
Inscrições: https://goo.gl/forms/ItPIDTZ4atHdG2J13