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Cobrança da água a agricultores familiares deve ser discutida nos comitês de bacias

Chegou à Assembleia Legislativa mais uma ação da mobilização dos pequenos agricultores capixabas em repúdio à possível cobrança pelo uso da água e apoio estatal para a recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e construção de caixas secas nas pequenas propriedades familiares.

Alegando que são produtores de água, vários representantes da agricultura familiar explicaram a injustiça do procedimento em audiência pública realizada na última quinta-feira (12) pela Comissão de Saúde e Saneamento, presidida pelo deputado Doutor Hércules (MDB).

“Nós não vamos pagar a água porque nós não devemos nada. O pagamento de água não vai trazer as cachoeiras e a água de volta”, disse Daniel Plaster, presidente da Associação Santamariense em Defesa da Vida de Santa Maria de Jetibá.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pancas, Reginaldo Monez, ponderou que é preciso “espaço para expressar o nosso desejo e nosso sentimento. Quem acabou com a água no Estado não foi a agricultura familiar. Foram os governos que incentivaram a produção de eucaliptos. Não é pagando, penalizando e taxando a água que se vai se resolver o problema”, avaliou.

O secretário de Meio Ambiente e Agropecuária de Santa Maria do Jetibá, Egnaldo Andreatta, destacou que 70% do município trabalha na agricultura familiar, assim como na maioria dos municípios. Segundo considerou, o agricultor também é responsável pela “produção” da água consumida pelos capixabas.

No município, um abaixo-assinado promovido entre agosto e outrubro de 2017 reuniu mais de 16 mil assinaturas de apoio ao pleito da isenção da cobrança e apoio para reflorestamento e caixas secas.

Afonso Cláudio, Anchieta, Aracruz, Castelo, Colatina, Santa Teresa e Vargem Alta também estão mobilizados, e outros municípios continuam a aderir.

Mais florestas e menos eucaliptos

Na Assembleia Legislativa, o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Jucu, Elio de Castro Paulino, argumentou em uníssono com os produtores familiares. “Em nenhum momento foi dito que a agricultura familiar vai pagar pelo uso da água. Quem vai decidir, de acordo com sua realidade, é cada um dos comitês, que são espaços democráticos”, ponderou. Segundo ele, os maiores consumidores são a grande agricultura e a Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan).

Elio Paulino, que é vice-presidente do Fórum Capixaba de Recursos Hídricos, lembrou que hoje a realidade é diferente do período anterior, quando havia a crise hídrica. Atualmente, os rios estão cheios. Paulino afirmou que periodicamente há problemas nas bacias por conta do desmatamento, assoreamento, poluição doméstica e industrial. “Em 2016, perdemos mais de 50% de nossa produção agrícola por conta da falta de água”.

O coordenador da Descida Ecológica do Rio Jucu, Eduardo Pignaton, informou que o pequeno agricultor consome cerca de 5% da água do rio, e a maior parte é consumida pela população urbana. Entretanto, a atividade é sempre responsabilizada pelo mau uso dos recursos hídricos.

Pignaton criticou a política do Estado, por meio do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf), que, conforme disse, aplica multas contra o agricultor. “Quem tem que ter o domínio das águas são vocês”, pontuou, referindo-se aos representantes dos agricultores na audiência.

Para Pignaton, é preciso ter programas de recuperação dos rios e não incentivar a plantação de eucaliptos. “Essa é uma política de governo”, analisou. No entanto, “é preciso chamar o agricultor para discutir o problema”. O coordenador ressaltou que a foz do Rio Jucu está repleta de esgoto doméstico. “Se os moradores pagam taxa de esgoto, por que então o esgoto não é tratado?”, perguntou.

Política Estadual de Recursos Hídricos 

No Espírito Santo, há 14 comitês de bacias hidrográficas, mas nem todos estão funcionando plenamente. Participam dos comitês os usuários de água, a sociedade civil organizada e o Poder Público. Os comitês representam a instância de debate e deliberação da Política Estadual de Recursos Hídricos, cujas informações técnicas são subsidiadas pela Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh).

A cobrança pela utilização da água foi instituída pela Política Nacional de Recursos Hídricos, por meio da Lei 9.433/1997. No Estado, questão está disciplinada pela Lei 10.179/2014. O fundamento da legislação se assenta no reconhecimento de que a água é um bem de domínio público, limitado e com valor econômico. O responsável pela cobrança da captação da água no Espírito Santo é o Fórum Capixaba de Recursos Hídricos.

O deputado federal Givaldo Vieira (PCdoB) destacou a importância dos comitês de bacias hidrográfica. Comentou que grandes corporações no mundo estão transformando a água doce em mercadoria e que água precisa ser preservada e ter seu uso democratizado.

Givaldo, que é relator da comissão que estuda a crise hídrica na Câmara Federal, lembrou que o campo no Espírito Santo tem a característica de ser predominantemente de agricultura familiar. “É preciso apoiar a agricultura familiar, pois ela preserva a água muito bem. Tem que fazer caixas secas, ajudar o agricultor a reter a água”.

O deputado é contrário à proposta de cobrança da água utilizada pelo agricultor. Ele destacou a importância que tem os comitês de bacias hidrográficas.

Audiências nos Comitês

Ao se referir ao papel da sociedade civil nas cobranças aos órgãos públicos, o presidente da Agerh, Antônio de Oliveira Júnior, destacou que é preciso “entender as regras, porque elas foram criadas de forma democrática”. As discussões têm de passar pelos comitês de bacias, segundo seu entendimento. “A sociedade tem de se apropriar desse debate”.

Ele afirmou que Agência é responsável pelos estudos técnicos dos recursos hidrográficos e não tem poder deliberativo e nem assento nos comitês hidrográficos.

O debate na Comissão propôs a realização de audiências públicas em cada um dos 14 comitês de bacia para contemplar o debate em torno das realidades e necessidades, que são diferentes em cada lugar.

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