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Barra do Riacho chora mais uma vez

A nova Licença de Instalação (LI) da Imetame, emitida nesta quinta-feira (19) pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), anuncia o agravamento das mazelas sociais e ambientais que há meio século atormentam o outrora bucólico balneário de Barra do Riacho, município de Aracruz, no norte do Espírito Santo.
Mas, como sempre, foi anunciada por membros do Executivo e Legislativo capixaba, incluindo o próprio governador Paulo Hartung, em clima de comemoração, com base no conhecido discurso de “desenvolvimento e geração de empregos” – investimentos de R$ 590 milhões e 350 empregos diretos na fase de implantação, com pico de 650 e, na fase de operação, com pico entre 640 e 1.100.
A construção, bem como a ampliação do Portocel da Aracruz Celulose (Fibria) na região, só foi possível após mudança na poligonal feita pelo governo federal em 2015, a pedido do governo do Estado. E a licença emitida ao Imetame, que era para offshore e cargas gerais, passou a ser também para contêineres e graneis sólidos, líquidos e gasosos.
Apesar da festa realizada no Palácio Anchieta, porém, as comunidades impactadas sequer têm conhecimento se tiveram suas demandas de condicionantes sociais e ambientais contempladas pelo Iema na emissão da LP.
Após a segunda audiência pública relacionada ao novo projeto da Imetame, realizada pelo Iema em Barra do Sahy no último dia 20 de março, os moradores de Barra do Riacho e região se mobilizaram para apresentar as propostas. As entidades da sociedade civil de Barra do Riacho – Associação de Moradores dos Bairros São Pedro, Pindorama e Xique Xique, Associação Comunitária de Barra do Riacho e Amigos da Barra do Riacho – listaram mais de 70 solicitações que foram protocoladas no dia dois de abril na sede do Iema.
Passados 17 dias corridos, o órgão anunciou a liberação da licença sem dar uma única resposta aos moradores sobre suas legítimas demandas. “Não deu nem satisfação! “, reclama Herval Nogueira, ativista da Rede Alerta Contra o Deserto Verde.
Entre as solicitações, estão a preservação da Praia do Sossego – menos de um quilômetro de praia espremida entre a Imetame e o Portocel, da Aracruz Celulose (Fibria) – como área de lazer da comunidade, a última que ainda resiste, sob séria ameaça, do seu usurpado litoral.

E, ainda, outra essencialmente ambiental , que é a criação de uma unidade de conservação ao norte da foz do Rio Riacho, na categoria de Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), ou outra que os devidos estudos técnicos indicarem mais adequado.
No âmbito econômico, foram solicitados cursos de capacitação para atuação na construção e na operação do empreendimento. “Nós queremos ser operadores de equipamentos portuários, e não só caldeireiros”, enfatiza Herval, repudiando o hábito das empresas invasoras de, entre os poucos empregos aos moradores locais, direcionar exatamente os de salários mais baixos.
Desemprego
A geração de emprego é uma questão crucial em Barra do Riacho. Mesmo recebendo diretamente todos os terríveis impactos sociais e ambientais produzidos pela indústria petroquímica, de celulose e outros setores que proliferam na região, a comunidade sofre com grave desemprego.
“Não enche uma Kombi os moradores daqui que trabalham na Fibria”, denuncia Herval, citando a pioneira em devastação, Aracruz Celulose, instalada na década de 1970. O que dizer então dos que vieram depois? Isso, prossegue, “apesar de termos engenheiros e professores universitários aqui, arquitetos, e, se formando, médicos e dentistas”.
As entidades também solicitam a instalação de uma unidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e outras instituições voltadas à capacitação para trabalho no setor industrial; reforma e reestruturação técnica do Sistema Nacional de Emprego (Sine); e disponibilização de transporte seguro para os trabalhadores.
Aos pescadores, entre outras solicitações, é reivindicado que participem das definições sobre o a operação do aterro marítimo que será feito para o offshore da Imetame, a princípio, localizado no mesmo lugar que o do Portocel. 
'Fábrica de miséria'
Indignado com a falta de respeito do Iema em não dar qualquer atenção às demandas da comunidade, Herval desabafa seu horror com a notícia da concessão “incrivelmente rápida” de instalação do empreendimento. “Vai ser mais uma fábrica de miséria, de prostituição, de assassinato”, diz, citando tragédias com as quais a comunidade convive há décadas, resultado de uma “ditadura empresarial que não respeita a democracia e a sociedade”.
“Nós temos que saber do Iema, oficialmente, o que ele aproveitou dessas condicionantes. Queremos um parecer dos analistas sobre cada uma dessas condicionantes”, exige.
Até hoje, passados 50 anos de usurpação do território da comunidade, de severa poluição da água e do ar, de inviabilização da pesca (atividade econômica tradicional e esteio da identidade cultural local), de perda de áreas de lazer, de violências e crimes, de desemprego e tantas outras mazelas, o ativista lista apenas três condicionantes aprovadas em licenciamentos ambientais, com alguma significância para a comunidade: um atracadouro para embarcação artesanal, um programa de menor aprendiz ,e um curso básico de informática.

“É um projeto desumano, autoritário, prepotente e sem nenhum respeito com a sociedade. Onde as autoridades do Executivo e do Legislativo 'se prostituem' e deixam seus filhos órfãos, nós sociedade, abandonados à miséria”, diz.  

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