Os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Maus Tratos realizados em Vitória nestas quinta e sexta-feiras (24 e 25), se de um lado gerou dividendos políticos para o seu presidente, senador Magno Malta (PR), de outro provocou críticas em vários setores, principalmente entre o público evangélico, seu reduto eleitoral, e gerou uma nota da Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES).
A Defensoria recomenda que “os trabalhos da CPI dos Maus Tratos observem os princípios e garantias fundamentais ligados ao segredo de Justiça dos processos envolvendo crianças e adolescentes vítimas de agressões, crimes e maus tratos”.
O senador transferiu os trabalhos da CPI para ouvir, principalmente, o cabeleireiro que se diz pastor, George Alves, acusado de ter assassinado as crianças Joaquim Butkosvsky, 6 anos, seu enteado, e Kauã Alves, 3, seu filho, na cidade de Linhares, norte do Estado, no dia 21 de abril desse ano.
A tragédia abalou o Estado pela frieza como o crime foi cometido e pelo fato de o criminoso ser conhecido como um líder religioso na cidade. No entanto, a vinda da CPI ao Estado perde a sua finalidade, considerando que os trabalhos desenvolvidos pela polícia já esclareceram a tragédia bárbara, apontando Gerge como o criminoso, cabendo agora à Justiça o encaminhamento do processo.
O trabalho de investigação policial, considerado exemplar, com destaque para a perícia realizada no local do crime e a tomada de depoimentos, desvendou o crime, tornando sem justificativa o deslocamento dos trabalhos da CPI para Vitória. No entanto, não podem ser esquecidas que as ações midiáticas geradas são altamente positivas para o senador, candidato à reeleição em 2018.
A nota da Defensoria Pública reafirma “ a importância do debate, especialmente no âmbito do Senado Federal, sobre maus tratos cometidos contra crianças e adolescentes, vez que o Brasil é signatário de diversos documentos internacionais de proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente”.
E prossegue: “A instituição apoia todos os trabalhos que visam à promoção dos direitos humanos das crianças e adolescentes, inclusive por conta das graves violações de direitos sofridos por essa parcela especialmente vulnerável da população capixaba, seja no contexto do sistema socioeducativo estadual, seja pelo falho atendimento às suas demandas de saúde, seja por conta dos altos índices de morte violenta de adolescentes e jovens, cujas apurações a sociedade aguarda elucidação”.
Contudo, ressalta a manifestação da Defensoria, “em toda atividade estatal, não se admite a fragilização de direitos e garantias fundamentais da população – em destaque os direitos à imagem e a à intimidade – notadamente aqueles protegidos pelo chamado segredo de Justiça”.
“Esses direitos não assistem apenas aos investigados, aos acusados e condenados de prática de crimes, mas também, e especialmente, as crianças e adolescente vítimas, art. 190-E da Lei 13.441/2017, resultado da CPI da Pedofilia do Senado de 2008”, diz o texto.
E conclui: “Em razão destes fatos, a DPES, como instituição permanente de cunho constitucional, exercendo sua função de orientação jurídica, promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, recomenda que os trabalhos da CPI dos Maus Tratos observem os princípios e garantias fundamentais ligados ao segredo de Justiça dos processos envolvendo crianças e adolescentes vítimas de agressões, crimes e maus tratos”.
Magno Malta ouviu, nesta sexa-feira, Geoge Alves, em uma repetição pública do que ocorreu durante a investigação policial. O senador, que é cantor gospel, se notabilizou no cenário político nacional com a bandeira “em defesa da família, da criança e do adolescente, contra pedofilia” e outros temas que tocam diretamente as famílias.
Com senso oportunista elevado, ele mantém essa imagem estampada em camisas com frases de efeito sobre temas de forte apelo popular.
Nesta sexta-feira, a Convenção das Assembleias de Deus no Espírito Santo (Cadeeso), a exemplo do que fez a Convenção das Igrejas Batistas, na época do crime, divulgou nota esclarecendo que referência a George Alves como “pastor” vem causando transtorno aos que exercem “o ministério pastoral de forma séria, regular e reconhecida por uma convenção devidamente reconhecida e registada perante os órgãos oficiais”.