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Produtor rural teme uma tragédia na região da Barragem do Rio Jucu

“Tem gente com espingarda calibre 12 carregada, pra quando oficial de justiça chegar, dar um tiro e ‘seja o que Deus quiser’”. A previsão trágica é do produtor rural Julio Cesar Velten, um dos 79 proprietários que judicializaram suas demandas por indenizações justas para a desapropriação das terras que serão alagadas para a construção da Barragem do Rio Jucu, entre Viana e Domingos Martins.

Diante das notícias oficiais, sobre os benefícios que a obra trará para 1,1 milhão de pessoas da Grande Vitória, o lamento de 79 famílias pode parecer oportunista para alguns, insignificante para outros e pouco legítimo para muitos. Afinal, eles irão receber uma indenização calculada pelo Estado e estão sendo assistidos pelo serviço social da Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan).

No dia a dia do Córrego da Onça, no entanto, onde as comportas da represa serão erguidas, o sentimento é de desespero e dá uma ideia da forma autoritária e predatória com que grandes obras, invariavelmente, são erguidas.

Setenta e nove famílias, a maioria moradoras do lugar há décadas, humildes – muitas pessoas não sabem ler e escrever –, estão sendo obrigadas a aceitar valores que correspondem a 10% ou 15% do valor real de mercado de suas propriedades. O que poderão comprar com esse dinheiro, longe de seu território, afastadas da terra que é parte de sua própria identidade?

“Assistente social da Cesan [Companhia-Espírito Santense de Saneamento] vem aqui contar histórias pra pessoas humildes, só pra ganhar tempo e essas pessoas vão perder o direito de recorrer na Justiça”, alerta Julio.

Pedidos de audiência já foram feitos ao governador Paulo Hartung e ao vice-governador, César Colnago. “Ninguém responde e nem dá a mínima”, reclama Julio. “As famílias estão já passando necessidades, devido à falta de emprego e outros transtornos que essa represa, que ainda nem saiu do papel, já está causando”, diz, reportando-se às mensagens enviadas ao Palácio Anchieta.

Nessa sexta-feira (15), uma edição extra do Diário Oficial do Espírito Santo publicou o aviso de licitação nº 001/2018 da Cesan, informando sobre a abertura do processo de licitação para “contratação de empresa para elaboração de projetos básicos e executivos, execução de obras, serviços, operação e manutenção da Barragem do Rio Jucu Braço Norte em Domingos Martins e Viana”, assinado pelo presidente da Comissão de Licitação, Romeu Souza Nascimento Junior.

Os números

Segundo o governo do Estado, o lago da Barragem do Rio Jucu, uma das maiores das 60 previstas no Programa Estadual de Barragens, terá capacidade de armazenar 23 bilhões de litros de água, que servirão de segurança hídrica para o abastecimento direto de cerca de 64% da população metropolitana.

O espelho d' água do lago da barragem ocupará uma área de 14 hectares e a barragem terá 50 metros de altura. O conceito básico do projeto é funcionar como sistema de acúmulo de água no período úmido para uso no período seco, ou seja, o lago deverá trabalhar como uma enorme caixa d'água para suprir as necessidades de abastecimento em períodos de forte estiagem. 

Um trabalho efetivo de reflorestamento nas bacias hidrográfica e um investimento consistente no fortalecimento da agricultura camponesa, em substituição aos milionários financiamentos e isenções de impostos cedidos no agronegócio, no entanto, são ações das quais não se tem notícia.

R$ 3,5 milhões por emprego gerado

Ao contrário, o noticiário oficial e da imprensa hegemônica bombardeiam o imaginário capixaba com pílulas de convencimento da “vocação” do Estado para os grandes empreendimentos portuários e agregados, no litoral, e de celulose e madeira exótica no norte e noroeste, justificando assim o escoamento do Tesouro estadual para as obras faraônicas e nada sustentáveis.

Exemplo recente é a Fábrica Placas do Brasil S/A, em Pinheiros, que produziu sua primeira placa de MDF nessa quinta-feira (14). Enquadrada no Programa Estadual de Incentivo ao Desenvolvimento Invest-ES, a empresa vai gerar míseros 160 empregos diretos, após um investimento de R$ 550 milhões.

Pode-se considerar razoável o valor de quase R$ 3,5 milhões para cada emprego gerado numa atividade que produz, como agravante, imenso passivo ambiental e social nas áreas usurpadas de camponeses e quilombolas para plantio de monoculturas de eucaliptos? Com a palavra os economistas capixabas, que se mantém em um silêncio constrangedor sobre o elevadíssimo custo de geração de emprego dos anacrônicos setores industriais que o Espírito Santo continua recebendo, com incentivos generosos dos gestores públicos. 

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