No dia 26 de junho de 2014, três detentos alegaram ter sofrido agressões físicas e psicológicas de inspetores penitenciários nas dependências da Penitenciária de Segurança Máxima II (PSMA II), em Viana. Depois do fato, que foi relatado à defensora pública Roberta Ferraz, os detentos foram encaminhados ao Departamento Médico Legal para a realização de exame pericial. No retorno, ao entrarem no presídio, sofreram diversas novas agressões (tapas, chutes e socos). Além disso, ficaram sem alimentação e sem tomar banho, além de terem sido ameaçados, caso eles ou suas famílias levassem os fatos ao conhecimento de outros.
Quando realizaram os exames de corpo de delito, policiais civis que ouviram as supostas vítimas relataram que alguns apresentavam marcas de enforcamento e roxidão em um dos olhos. “Mesmo diante de tais evidências, a Polícia Judiciária, em meados de 2015, manifestou-se pela não continuidade da apuração do caso. Houve diversas manifestações nos autos para o arquivamento, tanto pelo Ministério Público quanto pelo Poder Judiciário. Enfim, o inquérito policial foi instaurado somente após transcorridos quase dois anos dos fatos, principalmente em razão da insistência da Defensoria Pública no que tange à apuração do ocorrido dada a materialidade invocada”, diz relatório da Defensoria divulgado neste mês.
Depois do arquivamento do inquérito policial pelo MPES, a Defensoria Pública peticionou, em fevereiro de 2018, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, buscando melhor apuração da denúncia de tortura. “De qualquer modo, é inquestionável que as denúncias devem ser averiguadas pelos órgãos competentes e atores do sistema de Justiça. Até porque o descrédito preliminar aos relatos dos apenados contribui com a perpetuação de condutas abusivas e cruéis, além de fomentar a impunidade dos servidores faltosos e de generalizar toda uma classe de trabalhadores como se todos fossem coniventes com violações de direitos”.
Em maio deste ano, representantes de entidades de Direitos Humanos repercutiram os votos do desembargador Pedro Valls Feu Rosa, confirmando condenações para agentes públicos envolvidos em casos de tortura no Estado. Para eles, as decisões reiteram que o uso da violência e dos maus-tratos contra presos e suspeitos são práticas permanentes e institucionalizadas, ocorrendo até em unidades socoieducativas (para menores de 18 anos).
Na ocasião, Pedro Valls Feu Rosa, da Primeira Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado (TJES), condenou três inspetores penitenciários da Secretaria de Estado da Justiça (Sejus) e quatro policiais militares de Cachoeiro de Itapemirim, sul do Estado. No primeiro voto, negou provimento à apelação, que pedia nulidade de sentença que condenou os réus por tortura em penitenciária estadual (Vila Velha) em 2013. No segundo, reformou decisão de primeiro grau, condenando os PMs, impedindo, ainda, que o processo, de 2001, prescrevesse.
Em seu voto, Pedro Valls relembrou casos escabrosos de tortura nos presídios capixabas e também fez duras críticas: “O sistema penitenciário capixaba foi recentemente elogiado por suas estruturas físicas, sendo reportado como exemplo a ser seguido pelas unidades prisionais do País. Contudo, em que pese os avanços estruturais, um ponto não mudou, a falta de humanização no trato diário com os presos. Vê-se isso claramente nas imagens contidas nos autos. O ar de superioridade, de um autoritarismo cego, impera dentro das unidades prisionais. Constata-se muita arrogância, maus-tratos, tortura e pouca ressocialização”, escreveu o desembargador, que completou: “O resultado: temos índice de reincidência próximos a 80%, dentro dos maiores do planeta!”.