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Academia Feminina de Letras comemora 69 anos

Os tempos mudaram, mas não de forma natural. “Esse espaço de escritora não foi dado, foi um espaço conquistado pela mulher. O espaço dado era o da cozinha, mas há muito tempo as mulheres não aceitam essas imposições e querem escolher seus espaços”, diz Renata Bomfim, nova presidente da Academia Feminina Espírito Santense de Letras, que comemora nesta quinta-feira (30) seus 69 anos de fundação, em evento realizado na Biblioteca Pública Estadual.

A história da entidade começa oficialmente em 1949, quando um grupo de mulheres não tinha acesso à academia, então exclusivamente masculina. Obviamente, não era só uma questão local.  Para se ter uma ideia, a primeira mulher a entrar na Academia Brasileira de Letras foi Rachel de Queiroz, só em 1977.

Uma das fundadoras da Academia Feminina no Espírito Santo foi Judith Leão Castello Lopes Ribeiro, que integra a cadeira de número um. Além de escritora, ela foi a primeira mulher eleita deputada estadual, função que exerceu por cinco mandatos. “Foi uma grande contribuição nesses primeiros anos, nas décadas de 40, 50 e 60 havia muito cerceamento do discurso feminino. Só na década de 70, com o movimento feminista, o cenário começa a mudar. Hoje a mulher não busca só uma inserção nesse cânone patriarcal. Ela escreve do jeito que quiser, tem seus cânones e letras próprias”, considera Renata.

A presidente da Academia Feminina lembra que quase toda crítica literária era feita por homens e as mulheres que trabalhavam em jornais e revistas não eram bem vistas, pois o ideal era ser “bela, recatada e do lar”. 

Ela lembra que fizeram parte da Academia escritoras como Virgínia Tamanini, poetisa e dramaturga que traz um discurso rico em torno da emancipação feminina; Maria Antonieta Tatagiba, a primeira mulher a publicar um livro de poesia no Espírito Santo; e Guilly Furtado Bandeira, primeira capixaba a publicar um livro em 1914, no Rio de Janeiro.

“Não sabíamos da existência dessa obra, que foi descoberta em 2015 na Biblioteca Nacional. E editora Garnier, mesma que publicou Machado de Assis, doou as edições que tinha depois que fechou as portas. Nem a família possuía a obra. Penso em quantas escritoras ainda não tiveram suas obras descobertas”.

Entre as patronas, que dão nome às cadeiras, estão mulheres de trajetórias incríveis na literatura e na vida, como Maria Stella Novaes, Aidê Nicolucci e Carmélia de Souza, que todo capixaba deveria conhecer. E ainda há outras que Renata considera que a instituição está “em dívida” e que merecem homenagens, como Dora Vivacqua, mais conhecida como Luz del Fuego. “É um legado que precisamos levar adiante. É uma herança que a gente recebe”, afirma.

Seguindo o modelo francês que foi expandido para todo mundo, a Academia possui 40 cadeiras, que são ocupadas por novas escritoras após a morte de uma integrante. “É um momento alegre e triste, pois é necessário a perda para o lugar ser preenchido por outra. Escritores são imortais. A gente diz que não morre, desaparece. Porque a escrita é permanente, é o que importa. A gente é passageiro, mas as ideias permanecem”.

Hoje a Academia tem entre suas integrantes mais conhecidas nomes como Elisa Lucinda e Bernadette Lyra, que acabaram reconhecidas por aqui depois de terem ido para fora do Estado. “Temos essa dupla subalternidade, de ser mulher e capixaba. Estamos fora do circuito, mas no fundo transformamos isso em potência, há uma escrita muito singular das mulheres que produzem aqui”.

Além da questão da mulher na literatura, a presidente diz que a entidade também vem buscando outra desconstrução, a que se refere à visão elitista sobre as Academias de Letras. “O formato está mudando. Estamos felizes, ampliando e desconstruindo a academia como lugar de seletos, mas sim de pessoas que estão pensando e refletindo sobre a cultura. Além de desconstruir a ideia sobre o feminino, que é uma construção social”.

O grupo se reúne e promove coletâneas de escritos, não só das acadêmicas mas também de outras mulheres que ainda não publicaram, busca visibilizar as obras existentes e o acesso das mulheres a esses discursos, realiza palestras, e atividades em escolas para promoção da literatura.

Durante o evento de aniversário no próximo dia 30, haverá uma breve apresentação dessa história da Academia e da resistências dessas mulheres que a construíram, além da outorga da Medalha Cora Coralina, láurea máxima da Academia para a escritora Ailse Therezinha Cypreste Romanelli, da realização de sarau poético e shows musicais com Alex Kruger e Maria do Carmo Schneider. E claro: vai ter bolo para cantar os parabéns!

AGENDA CULTURAL

69º Aniversário da Academia Feminina Espírito-Santense de Letras

Quando: Quinta-feira, 30 de agosto, 19h

Onde: Biblioteca Pública do Espírito Santo – Avenida João Batista Parra, 165, Praia do Suá – Vitória/ES.

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