“O processo de expansão do eucalipto é um processo de exploração, expropriação e extermínio de córregos, nascentes, de biodiversidade e de comunidades inteiras”. A afirmação é de Adelso Rocha Lima, da coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), um dos palestrantes na audiência pública que a Câmara de Conceição da Barra realiza, no próximo dia 24, sobre “O impacto provocado pela monocultura de eucalipto no município de Conceição da Barra”.
A audiência foi proposta pela presidente da Câmara, Mirtes Eugênia Rodrigues Pereira Figueiredo (PR), e acontecerá a partir das 18h, no Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) de Braço do Rio. Outras duas palestras confirmadas serão feitas por um representante da Suzano Papel e Celulose e pela professora Simone Raquel Batista Ferreira, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
As empresas Aracruz Celulose (Fibria) e Placas do Brasil e as comunidades quilombolas do Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte também estão sendo convidadas, garante a presidente da Câmara. O objetivo, ressalta, é “discutir os impactos, positivos e negativos. Orientar, levar conhecimento pra população”. “A Lei Orgânica do Município [Emenda nº 11/2006] não permite expandir o monocultivo de eucalipto em Conceição da Barra. Monocultivo que restringe a agricultura familiar”, comenta a parlamentar.
Traduzindo em números a fala da presidente da Câmara, Adelso destaca o consumo de água da indústria de celulose e a evasão de empregos que ocorre dentro do deserto verde. Utilizando dados das próprias indústrias, o líder camponês informa que são necessários 30,7 mil litros de água para a produção de cada tonelada de celulose.
A produção de 2014, de 5,3 milhões de toneladas, pela Aracruz Celulose (Fibria), consumiu, portanto, 162,7 bilhões de litros de água, o que corresponde ao consumo de água de toda a população do Espírito Santo durante dois anos e meio, segundo dados de 2013 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento. E isso somente o processo industrial dentro da fábrica. “Se for somar o consumo no viveiro e no plantio, é um volume exorbitante!”, alarma.
Com relação aos empregos, Adelso lembra que, segundo dados do Censo Agropecuário, o eucalipto cobria, em 2006, 66% da área agricultável de Conceição da Barra, mas era responsável por apenas 3% dos postos de trabalho no campo, empregando uma pessoa a cada 936,5 hectares. Os assentamentos da Reforma Agrária no município, por sua vez, empregam, em média, uma pessoa a cada 5,5 hectares. “A situação deve estar pior hoje”, estima, considerando que as modernas tecnologias têm reduzido continuamente o emprego de mão de obra.
A monocultura de eucalipto, no entanto, é um dos maiores obstáculos à democratização do acesso à terra no Espírito Santo, por ser um dos principais rostos do agronegócio. O agronegócio e em especifico o monocultivo de eucalipto são atividades que bloqueiam a Reforma Agrária”, afirma o líder do MST.
Massacres
Outro agravante é que os poucos empregos gerados no deserto verde são extremamente caros. Bom exemplo é a inauguração da fábrica de MDF Placas do Brasil. Na página inicial de seu site na internet, é informado que o investimento total de R$ 393,5 milhões – com recursos públicos via Programa Estadual de Incentivo ao Desenvolvimento Invest-ES – vai gerar 150 empregos diretos na fase de operação, ou seja: o custo é de R$ 2,6 milhões para cada posto de trabalho. “São recursos públicos investidos nas empresas que não beneficiam a população”, observa Adelso.
“O Estado usa o seu aparato jurídico, político, técnico, econômico e ideológico pra expandir o monocultivo, como se fosse uma necessidade da sociedade, o que na verdade é uma necessidade da empresa. Enquanto isso, os trabalhadores estão sendo massacrados”, denuncia.
Apesar de tantas evidências sobre os impactos negativos dos monocultivo de eucaliptos, e mesmo de uma lei municipal proibindo sua expansão, o deserto verde continua avançando no Espírito Santo, agora sobre áreas abandonadas de cana-de-açúcar e pastagens, ameaçando diretamente diversas comunidades camponesas. Se no passado os alvos primordiais foram as comunidades quilombolas e indígenas, agora são os camponeses do norte e noroeste que estão na mira das indústrias de celulose. As próximas vítimas, prospecta o líder camponês, serão as comunidades da Fazenda São Joaquim, arrendada pela Suzano, e de Água Preta, nas proximidades.
Atualmente, diz Adelso, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Estado tem 250 mil hectares de silvicultura, sendo que 99,6% é de eucaliptos. Essa extensão corresponde a 8,7% da área agricultável, mais que o quádruplo do percentual médio brasileiro, de 2,1%.