(Atualizado às 20h20 de quinta-feira) O Pleno do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) não analisou, na sessão desta quinta-feira (25) do Pleno, o caso da homologação do concurso público para ingresso na atividade de cartórios, aberto em 2013. A conclusão da seleção é uma das metas do novo corregedor-geral de Justiça, desembargador Samuel Meira Brasil Júnior. No entanto, uma denúncia em tramitação – ainda sem resposta – sobre a utilização de diplomas falsos por candidatos aprovados coloca todo o processo em xeque.
A denúncia foi encaminhada à Corregedoria do Tribunal e ao Ministério Público Estadual (MPES), que já investiga o uso de diplomas falsos em processos seletivos no Estado. As suspeitas sobre o concurso para cartórios também são de conhecimento dos demais desembargadores do TJES, que receberam em seus gabinetes uma cópia de todas as acusações por meio da Associação dos Escreventes Juramentados do Espírito Santo (Assejes).
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela exigência da validação de todos os certificados apresentados em concurso semelhante no Rio Grande do Sul. No caso capixaba, os documentos não tiveram uma análise criteriosa por parte dos responsáveis pela seleção. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também é favorável à necessidade de validação de todos os certificados.
A denúncia cita os nomes de 30 aprovados que teriam recorrido às fraudes para obter uma melhor colocação na seleção. Neste tipo de concurso, diferentemente de outros processos de seleção no poder público, a posição do candidato é fundamental para a escolha de uma serventia extrajudicial (cartório) mais vantajosa do ponto de vista financeiro.
De acordo com a denunciante, Jodite Maria de Souza, esse grupo de candidatos teria apresentado diplomas de pós-graduação irregulares, além de falsas declarações de exercício da advocacia e até certificados adulterados de prestação de serviço à Justiça Eleitoral. Tudo para obter uma melhor colocação no concurso.
No final de agosto, o Tribunal de Justiça realizou a sessão pública para escolha dos cartórios, apesar dos documentos terem sido colocados sob suspeição. A própria denúncia seria do conhecimento do desembargador Samuel Meira, que optou por dar seguimento ao concurso sem se pronunciar sobre a acusação.
A denúncia pede uma apuração rigorosa do caso, mencionando o fato de que a Comissão do Concurso e a entidade organizadora (Cespe/UnB) não teriam realizado sequer uma pesquisa mais cuidadosa sobre os documentos apresentados pelos candidatos. E por conta de uma “guerra de liminares”, os interessados não puderam ter acesso prévio aos títulos – como havia sido exigido pelo CNJ. A decisão do órgão de controle do Judiciário foi cassada por liminar da Justiça Federal movida justamente por uma das candidatas com os diplomas sob suspeita, Gabriella Cristina de Lima Silva.
Somente a autora dessa ação que impediu a transparência no concurso apresentou 12 certificados de cursos de pós-graduação lato sensu, sendo que em dez deles há indícios de irregularidades nos cursos e vícios fatais de invalidade desses documentos. Essa candidata teria cursado quatro cursos em apenas dez meses – incluindo neste período o prazo dedicado à confecção das respectivas monografias.
Mais grave é o fato da instituição de ensino Faculdades Integradas Jacarepaguá, responsável pelo curso, não ser credenciada para oferecer qualquer curso de pós-graduação em Direito, como exige o edital do concurso. Ainda assim, os títulos foram reconhecidos e ajudaram a candidata a subir na classificação final.
A mesma entidade de ensino, sediada no estado do Rio de Janeiro, também é alvo de investigações por Ministérios Públicos Estaduais e pelo Ministério Público Federal (MPF) por suspeita de fraudes. Outras supostas Instituições de Ensino Superior (IEs), alvos de suspeitas de irregularidades país afora, também aparecem por trás de certificados apresentados por outros candidatos aprovados no concurso para cartórios no Espírito Santo. Todos os casos foram devidamente citados na denúncia feita por Jodite Maria.
Além dos diplomas irregulares, a denunciante menciona que candidatos fizeram uso de declarações falsas de exercício na advocacia e até documentos falsificados para comprovar a prestação de serviço à Justiça Eleitoral – que também é um dos critérios para bonificação na avaliação dos títulos. O documento cita os casos de candidatos que juntaram procurações e certidões de atuação em processos, porém, não há o registro dos atos praticados, condição obrigatória para comprovação de atividade efetiva como advogado.
O uso de diplomas falsos não chega a ser novidade em certames no Espírito Santo. Em agosto, o Ministério Público deflagrou a segunda fase da “Operação Mestre Oculto”, que desarticulou um esquema de fraude em concursos públicos por meio da falsificação de documentos de graduação, pós-graduação e certificados. Ao todo, onze pessoas foram investigadas e denunciadas à Justiça – seis delas chegaram a ser presas pela prática dos crimes de estelionato, falsidade ideológica e contra o consumidor.
Em relação ao concurso no Espírito Santo, a denúncia aponta uma “irreparável erosão nos mais comezinhos princípios éticos e morais” por parte dos candidatos citados. Ao final, a denunciante pede que todas as irregularidades sejam apuradas e extirpadas do concurso antes que ele se encerre. “Não se pode tolerar essa desavergonhada ausência de probidade e retidão em candidatos que postulam a posição de depositários e legítimos representantes de parcela da soberania estatal: o poder da fé pública. Tolerância é um passo abaixo da aceitação, e neste caso, não se trata de uma virtude”, diz a peça.