Arremesso de lança, bodoque ao alvo, zarabatana, luta corporal, arco e flecha, cabo de guerra, corrida de tora, natação no rio. Essas foram as modalidades presentes nos I Jogos Tradicionais Indígenas realizados na aldeia Tupinikim de Caieiras Velhas, em Aracruz, norte do Estado, que aconteceram no último final de semana (23 a 25).
O evento surgiu a partir do diálogo entre jovens e o mais antigos preocupados com a cultura e identidade. “Os jogos surgem a partir da necessidade de repensar essa tradição e cultura que cada vez mais têm sucumbido diante das mídias e imposição de uma cultura genérica. Pensamos nas práticas esportivas para chamar atenção dos jovens”, diz Jocelino Tupinikim, um dos organizadores do evento.
Foto: Rogério Medeiros
“O bodoque e o arco e flecha hoje são usados para ativar a memória de quando era tempo de caçada”. Esses instrumentos, que foram caindo em desuso com desmatamento do entorno e consequente desaparecimento de animais, além das mudanças da vida moderna, são ressignificados por meio do esporte.
No evento, além dos Tupinikim, estiveram presentes povos guarani que habitam também em Aracruz e os convidados pataxós vindos de Minas Gerais. “Nós somos comunidades tradicionais ilhadas em nossas terras, o que é retrato do que a sociedade colonialista fez. Queremos também abrir o diálogo e dizer para o governo que os povos tradicionais existem e temos necessidades diferenciadas no que diz respeito aos nossos esportes. Nosso desejo e nossa vontade é que o governo estabeleça políticas públicas de fato, reconhecendo os jogos, para que aconteçam com mais frequência”, afirmou.
O evento também buscou refletir sobre a atual conjuntura do país, especialmente no que se refere aos direitos das comunidades tradicionais em ameaça com projetos como Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 e a revisão do marco temporal.
Na última sexta-feira (23), foi feita a grande abertura dos Jogos com apresentações dos povos Tupinikim, Guarani e Pataxó e uma exposição e feira de artesanato na cabana central da comunidade. No sábado (24) foram realizadas as provas em diversas modalidades e os visitantes também puderam participar de algumas delas no modo não competitivo. Durante a noite foram feitos desfiles em que os jovens mostraram as pinturas e indumentárias de cada etnia presente. Na manhã de domingo (25), aconteceu o campeonato de natação no Rio Piraquê-Açu, que banha várias aldeias indígenas no município.
Danças e cantos também estiveram presentes na celebração, cada um com sua própria língua dentro do processo de retomada linguística dos Pataxó, de revitalização do tupi antigo pelos Tupinikim e na reafirmação e fortalecimento da língua materna Guarani. As pinturas também mostraram as formas de expressar de cada um destes povos.
O projeto foi desenvolvido em parceria da Associação Indígena de Caieiras Velhas com grupos e coletivos de dança e cultura das comunidades indígenas e apoio de entidades públicas e privadas. Os preparativos começaram meses antes, com a realização de uma série de oficinas nas aldeias com o objetivo de reforçar a confecção de materiais tradicionais e os treinamentos para as práticas esportivas.