Até o momento, 17 pessoas foram presas na Operação Lídima, deflagrada nesta segunda-feira (3) com o objetivo desarticular uma organização criminosa atuante no setor de combustíveis e colher provas das atividades ilícitas dos integrantes, voltadas à fabricação clandestina, à distribuição ilegal e à comercialização de combustível adulterado, bem como de fraudes de ordem fiscal. As investigações começaram há aproximadamente dois anos.
De acordo com as investigações, um dos ilícitos praticados pelo grupo era a adulteração de gasolina e álcool com a utilização de solvente e água. As apurações também apontam a participação de usinas e postos no esquema. As fraudes têm envolvimento de pessoas no Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo, de acordo com os levantamentos feitos até agora. O prejuízo total aos cofres públicos está sendo levantado pela Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz-ES). que faz diligências fiscalizatórias em todos os estabelecimentos envolvidos.
No Espírito Santo, 14 pessoas foram presas, incluindo empresários e funcionários. Em São Paulo, três pessoas foram presas. Os nomes são mantidos sob sigilo, segundo o Ministério Público do Estado (MPES), para não prejudicar a continuidade das investigações. “Em breve vocês terão esses nomes. O que posso afirmar é que os donos de postos que foram presos pelo MPES, temos certeza absoluta, sabiam da fraude e se beneficiavam dela”, destacou o coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) -Central do MPES, o promotor de Justiça Bruno Simões Noya de Oliveira.
Apesar da afirmação, de acordo com o Portal G1-ES/Gazeta On Line, um deles é o empresário Adriano Scopel, já preso por fraudes na importação de veículos de luxo e também acusado de agredir, em julho deste ano, sua esposa. Outro seria Francisco Calazani, dono de uma distribuidora de combustíveis.
As investigações, realizadas em parceria entre o Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e à Corrupção (Nuroc) e o Gaeco, permitiram levantar provas da prática de crime de sonegação contra o consumidor, contra as relações de consumo e formação de um cartel para a revenda e a distribuição de combustível. Além da prática de lavagem de dinheiro e crime de organização criminosa.
“O monitoramento indicou adulteração, venda de combustível de baixa qualidade, sonegação de forma intensa e um cartel dominando o mercado, prejudicando até o comércio de álcool. Esses sonegadores atravessavam a distribuição trazendo álcool que seria utilizado para outros fins e que tem uma tributação menor, para os postos de combustíveis. Isso permitia o aumento do lucro e um preço mais em conta na bomba, afetando a concorrência no mercado. A sonegação é milionária, mas não se tem valores ainda. Esse levantamento está sendo feito pela Sefaz. Inevitavelmente, serviços públicos, como educação e saúde, são prejudicados, uma vez que esse dinheiro deixa de entrar nos cofres do Estado para ser reaplicado para a sociedade”, explicou o coordenador do Gaeco.
“Se o álcool sai de uma usina para uma empresa de fachada, como nós constatamos, e vai para um posto de gasolina, 40% desse preço não é tributado pelo Estado. E esse dinheiro do álcool deixa de ser aplicado em escola, no posto de saúde, nas estradas das comunidades. Isso não chega nas mãos dos gestores públicos, porque esses empresários criminosos acabam desviando”, completou o delegado-chefe coordenador do Nuroc, Rafael Ramos.
Além dos mandados de prisão, foram cumpridos 45 mandados de busca e apreensão no Espírito Santo e em São Paulo, expedidos pela 5ª Vara Criminal de Serra, além da efetivação do bloqueio de bens e ativos produto dos crimes investigados – previstos nos artigos 2º da Lei nº 12.850/13 (organização criminosa), art. 7º da Lei nº 8.137/91 (crime contra as relações de consumo), art. 299 do CP (falsidade ideológica), art. 1º da Lei nº 9.613/98 (lavagem de dinheiro) e art. 1º, I, da Lei nº 8.176/91 (crime contra a ordem econômica) pela afronta a diversas resoluções da ANP.
Investigação
A investigação durou praticamente dois anos. O trabalho começou após uma solicitação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que indicava a presença excessiva de metanol em álcool combustível e gasolina em estabelecimentos do Espírito Santo. Foi realizada uma “fotografia” do momento, escolhendo um número de postos de combustíveis onde havia denúncias de cometimento de crimes, entre eles aquisição de carga roubada e não pagamento de tributos. Esses estabelecimentos ainda mantinham problemas frequentes, como produtos de má qualidade, dentre eles adulterados. A investigação provou tal ilicitude. A chegada de uma grande carga de nafta ao Espírito Santo também serviu para agilizar as investigações e descobrir as práticas fraudulentas.
“Existem investidores em São Paulo que financiam a adulteração de combustível no Estado. Durante o monitoramento chegamos a detectar veículos falhando e inclusive consumidores com o carro com adesivo estampado para não comprar em determinado posto, por conta da adulteração”, relatou o coordenador do Gaeco.
A Operação Lídima foi coordenada pelo Nuroc e o Gaeco, do Ministério Público do Estado, com o apoio do Núcleo de Inteligência da Assessoria Militar do MPES (NI-AMMP), da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), das Polícias Civis dos Estados de São Paulo e Espírito Santo, bem como da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz-ES) e da Receita Federal do Brasil.
Contou com a participação de quatro delegados capixabas, cinco promotores de Justiça do Gaeco, 84 policiais civis capixabas, oito peritos oficiais criminais, 23 policiais militares da Assessoria Militar do MPES, 16 policiais militares com viaturas caracterizadas das unidades da PM (4º, 6º e 7º BPM e da 12ª Companhia Independente), oito fiscais da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), 28 auditores da Sefaz-ES e sete profissionais da Receita Federal, além de equipes da Polícia Civil do Estado de São Paulo.
Como funcionava a fraude:
Adulteração de combustível
A gasolina era misturada pelos fraudadores a partir da junção de etanol, nafta e outros corantes. O movimento se configurava como ilegal, uma que vez empresas não cadastradas para a prática realizavam essa mistura. Com isso, era criado um combustível fora dos padrões oficiais, podendo ser de má qualidade.
Evasão fiscal
A investigação apontou que empresas de fachada relacionadas à área química e outras eram utilizadas como destino final das notas fiscais ideologicamente falsas. Uma empresa química era destinatária de álcool anidro (sem água), cuja finalidade seria para confecção de tintas e vernizes. Mas na realidade, esse etanol se destinava para confecção de gasolina ou, no caso de etanol hidratado, para ser utilizado diretamente em veículos.
A evasão fiscal acontecia porque o álcool para confecção de tintas e vernizes é classificado para “outros fins”, tendo uma queda da sua base de cálculo do imposto, havendo, então, uma redução do valor do tributo a ser pago pelo empresário.
Como as empresas eram de fachada, não era possível para o Estado conseguir cobrar tributos como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).