O Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e à Corrupção (Nuroc) da Secretaria de Estado da Segurança Pública e o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) divulgaram as identidades de dois foragidos, todos com mandados de prisão preventiva em aberto. Eles são procurados por conta da Operação Lídima, deflagrada na última segunda-feira (3), e que revelou um esquema de adulteração de combustíveis como ramificações no Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo.
Até o momento, 17 pessoas foram presas; incluindo empresários – como Adriano Scopel e Francisco Calazani – e funcionários, sendo 14 no Estado e três em São Paulo. Os nomes, segundo os responsáveis pela operação, continuarão sendo mantidos sob sigilo para não prejudicar as investigações.
Os foragidos são Carlos Alberto Barbosa de Souza, de 51 anos, e Wellington Jorge Baldi Moreira, de 40 anos. Carlos Alberto tem mandado de prisão em aberto pela acusação de ser um dos gerentes que comandava o esquema de adulteração de combustíveis no Espírito Santo. Wellington, por sua vez, é proprietário de uma empresa do tipo Transportador-Revendedor-Retalhista (TRR) envolvida no esquema.
Conforme divulgado pela força-tarefa da Operação Lídima, o TRR, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), é a empresa autorizada a adquirir em grande quantidade combustível a granel, óleo lubrificante acabado e graxa envasados para depois vender a retalhos. O TRR também é responsável pelo armazenamento, transporte, controle de qualidade e assistência técnica ao consumidor quando da comercialização de combustíveis. No entanto, a investigação aponta que a empresa do tipo TRR estava fazendo a comercialização para o consumidor final, burlando a fiscalização e cometendo o crime de evasão fiscal. Além disso, estava comprando combustível de empresas não autorizadas.
Além dos mandados de prisão, foram cumpridos 45 mandados de busca e apreensão nos Estados do Espírito Santo e de São Paulo, expedidos pela 5ª Vara Criminal de Serra, além da efetivação do bloqueio de bens e ativos produto dos crimes investigados – previstos nos artigos 2º da Lei nº 12.850/13 (organização criminosa), art. 7º da Lei nº 8.137/91 (crime contra as relações de consumo), art. 299 do CP (falsidade ideológica), art. 1º da Lei nº 9.613/98 (lavagem de dinheiro) e art. 1º, I, da Lei nº 8.176/91 (crime contra a ordem econômica) pela afronta a diversas resoluções da ANP.
A operação
A operação tem como objetivo desarticular uma organização criminosa atuante no setor de combustíveis e colher provas das atividades ilícitas dos integrantes, voltadas à fabricação clandestina, à distribuição ilegal e à comercialização de combustível adulterado, bem como de fraudes de ordem fiscal.
As investigações começaram há aproximadamente dois anos. Um dos ilícitos praticados pelo grupo seria a adulteração de gasolina e álcool com a utilização de solvente e água. As apurações também apontam a participação de usinas e postos no esquema. A auditoria e o prejuízo total aos cofres públicos estão sendo levantados pela Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz/ES), que faz diligências fiscalizatórias em todos os estabelecimentos envolvidos.
“O monitoramento indicou adulteração, venda de combustível de baixa qualidade, sonegação de forma intensa e um cartel dominando o mercado, prejudicando até o comércio de álcool. Esses sonegadores atravessavam a distribuição trazendo álcool, que seria utilizado para outros fins e que tem uma tributação menor para os postos de combustíveis. Isso permitia o aumento do lucro e um preço mais em conta na bomba, afetando a concorrência no mercado. A sonegação é milionária, mas não se tem valores ainda. Inevitavelmente, serviços públicos, como educação e saúde, são prejudicados, uma vez que esse dinheiro deixa de entrar nos cofres do Estado para ser reaplicado para a sociedade”, explicou o coordenador do Gaeco, o promotor de Justiça Bruno Simões Noya de Oliveira.
“Se o álcool sai de uma usina para uma empresa de fachada, como nós constatamos, e vai para um posto de gasolina, 40% desse preço não é tributado pelo Estado. E esse dinheiro do álcool deixa de ser aplicado em escola, no posto de saúde, nas estradas das comunidades. Isso não chega nas mãos dos gestores públicos, porque esses empresários criminosos acabam desviando”, completou o gerente do Nuroc, delegado Raphael Ramos.
Investigação
As investigações, realizadas em parceria entre o Nuroc e o Gaeco, permitiram levantar provas da prática de crime de sonegação contra o consumidor, contra as relações de consumo e formação de um cartel para a revenda e a distribuição de combustível. Além da prática de lavagem de dinheiro e crime de organização criminosa. O trabalho começou após uma solicitação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que indicava a presença excessiva de metanol em álcool combustível e gasolina em estabelecimentos do Espírito Santo. Foi realizada uma “fotografia” do momento, escolhendo um número de postos de combustíveis onde havia denúncias de cometimento de crimes, entre eles aquisição de carga roubada e não pagamento de tributos.
Esses estabelecimentos ainda mantinham problemas frequentes, como produtos de má qualidade, dentre eles adulterados. A investigação provou tal ilicitude. A chegada de uma grande carga de nafta ao Espírito Santo também serviu para agilizar as investigações e descobrir as práticas fraudulentas.
Como funcionava a fraude:
Adulteração de combustível
A gasolina era misturada pelos fraudadores a partir da junção de etanol, nafta e outros corantes. O movimento se configurava como ilegal, uma que vez empresas não cadastradas para a prática realizavam essa mistura. Com isso, era criado um combustível fora dos padrões oficiais, podendo ser de má qualidade.
Evasão fiscal
A investigação apontou que empresas de fachada relacionadas à área química e outras eram utilizadas como destino final das notas fiscais ideologicamente falsas. Uma empresa química era destinatária de álcool anidro (sem água), cuja finalidade seria para confecção de tintas e vernizes. Mas na realidade, esse etanol se destinava para confecção de gasolina ou, no caso de etanol hidratado, para ser utilizado diretamente em veículos.
A evasão fiscal acontecia porque o álcool para confecção de tintas e vernizes é classificado para “outros fins”, tendo uma queda da sua base de cálculo do imposto, havendo, então, uma redução do valor do tributo a ser pago pelo empresário. Como as empresas eram de fachada, não era possível para o Estado conseguir cobrar tributos como o ICMS.