Desde que a Prefeitura Municipal de Vitória (PMV) retirou os ecopostos de coleta seletiva de lixo em Maria Ortiz, os arquitetos Gabriel Lavisnky e Yolanda Faustini tomaram uma iniciativa curiosa e questionadora: passaram a guardar o lixo seco na varanda de casa à espera da retomada do serviço. Depois de três meses, Gabriel postou uma foto nas redes sociais com o lixo juntado cobrando: “E aí Prefeitura de Vitória, o que faremos com esses três meses de lixo seco reciclável?”
O casal, que criou o grupo Oficina de Lixo, toma diversas medidas para evitar a geração de resíduos, como reaproveitamento de sacolas plásticas, papel de pão e folhas de papel. Mesmo assim, desde setembro, juntou cerca de 180 litros de lixo seco em estado normal, não esmagado, mas devidamente higienizado e sem ter onde depositar para uma destinação adequada. O lixo úmido, ou seja, resíduos orgânicos, eles reciclam por meio do processo natural de compostagem, em que é transformado em adubo.
Foto: Leonardo Sá
A alegação da prefeitura, via Secretaria Central de Serviços, é que o dispositivo utilizado para separação e coleta de resíduos que estava instalado em Maria Ortiz foi retirado por solicitação e acordo com as lideranças comunitárias. “A retirada do ecoposto se deu após diversas tentativas de conscientização quanto à forma correta de utilização dos dispositivos, uma vez que os moradores estavam descartando resíduos úmidos no equipamentos, como resto de alimentos, lixo de banheiro, papel, absorventes, animais mortos, entre outros resíduos”, informou a Central de Serviços. A gerência afirmou que está negociando junto à comunidade para identificar novos postos e recomendou que enquanto o equipamento não é instalado, o descarte seja feito na praça de Goiabeiras, bairro vizinho.
Gabriel considera a iniciativa da prefeitura como fraca. Reconhece como positivo o fato da municipalidade ter respondido às suas mensagem, embora considere as respostas insatisfatórias. De alguma maneira, a prefeitura aponta a comunidade como agente que dificulta o funcionamento por Pontos de Entrega Voluntária (PEV ou ecopostos). “No entanto, não há nos postos, nenhum indicativo de como utilizar o ecoposto, nem tampouco o mais óbvio: qual tipo de resíduo pode e qual não pode ser depositado nele”, reclama Gabriel. Por telefone ele diz que suas sugestões foram bem vistas mas sem qualquer comprometimento formal.
“Ao perguntarmos aos nossos vizinhos sobre coleta seletiva, a resposta em geral é não saberem como funciona. Ou seja, essas diversas medidas de conscientização que a prefeitura alega, é possível identificá-las como insuficientes”
Para Gabriel Lavinsky, é importante fortalecer uma economia circular, em que todos resíduos possam ser reaproveitados, o que demanda que haja uma destinação adequada. “A coleta seletiva é importante porque é o mínimo para que possamos efetivar uma economia correta. Todos esses resíduos foram feitos para serem reciclados, isso é o normal. No entanto, em muitos lugares isso não é feito de forma adequada”.
No entendimento dele, a região metropolitana de Vitória se coloca como modelo, pois além da coleta seletiva tem um sistema de aterro sanitário que considera adequado e de grande escala.”No entanto, não existe de fato uma vigilância adequada para entender a eficiência das prefeituras em realizar a coleta seletiva nos bairros, cabendo muitas vezes à própria população interessada (que representa uma parcela muito pequena do todo) se mobilizar e exigir que os regimentos das leis de gestão de resíduos sólidos, que abarcam a necessidade das prefeituras de realizar a coleta seletiva, sejam cumpridos”.
Outro aspecto importante é que a coleta seletiva favorece um setor importante que são os catadores de lixo e associações de centrais de reciclagem. “Eles prestam um serviço importante de limpeza de resíduos urbanos, merecendo portanto ser devidamente recompensados, e ter apoio da prefeitura, uma vez que realizam um serviço público”, afirma o arquiteto.
Sobre a “coleção” de lixo por três meses, chegou ao fim com final feliz. Diante de uma viagem longa que farão, eles deixaram a residência alugada em Maria Ortiz e fizeram mudança para a casa da mãe de Yolanda, na Praia do Canto, para onde levaram, junto a outros pertences, o lixo juntado desde setembro. O novo bairro é um dos que ocorre o modelo de coleta seletiva porta a porta, que Gabriel considera ideal. Nele, um caminhão vem buscar o lixo reciclável em dias específicos. “Esta é tida como a forma mais ideal de coleta seletiva, pois não corre o risco de acumular sujeira e atrair pragas em espaços públicos como ocorre com os pontos de entrega voluntária. Também, aproxima os moradores dos funcionários que captam esse lixo, o que pode ajudar no entendimento de quais lixos devem ser entregues, em que dias, e formas de diferenciar sacolas com lixos recicláveis, de forma a facilitar a coleta seletiva”.
Sobre a retomada da coleta seletiva em Maria Ortiz, a prefeitura justificou que está “avaliando junto a lideranças comunitárias um novo local para instalar o PEV, tendo em vista que considera que o anterior se tornou um ponto viciado de lixo”. Mas não foi informada uma data prevista para o mesmo.