A ideia do selo Subtrópico surgiu a partir da necessidade de Gil Mello produzir musicalmente as várias bandas que participava em 2014, quando conheceu Heitor Righetti, que trabalhava com audiovisual num festival. “Tínhamos os mesmos problemas ao mesmo tempo. Resolvemos ter problemas juntos ao invés de separados” brinca Gil.
Não só os problemas mas também os talentos e experiências se uniram, Gil trazendo a formação técnica em produção musical e Heitor com a experiência em mídias e também na produção de eventos.
Assim surgiu o Subtrópico, que acaba de completar quatro anos de existência e já produziu total ou parcialmente bandas locais como Moreati, Mean Mustards, My Magical Glowing Lens, Doidivanes, Bela e Flor e Mudo. Além disso, o grupo tem sido fundamental para abrir espaço para as bandas autorais no Estado, que encontram dificuldades de encontrar locais onde possam apresentar seu trabalho.
Nestes anos, estimam que promoveram mais de 300 shows, sobretudo de artistas e bandas do Espírito Santo, mas também de outros estados e até grupos estrangeiros. Assim, tiveram que ir para além de suas formações profissionais e aprender de administração, finanças e outro conhecimentos necessários. Um passo fundamental para consolidar esse trabalho foi ter um lugar próprio para receber os shows, o que na verdade surgiu da necessidade inicial de moradia.
Encontraram uma casa no Centro de Vitória, onde compartilharam as contas e começaram a produzir musicalmente. Pensavam em usar o espaço para outros tipos de atividades mas o pontapé inicial caiu no colo quando receberam o show da banda gaúcha Apanhador Só, conhecida nacionalmente, que realizou uma turnê pelo Brasil tocando em shows intimistas na sala de estar dos fãs. Foi aí que feitos links e conexões, a banda chegou até a casa deles, que por sua fachada logo começou a ser chamada de Casa Verde
Foram dois dias de casa, ou melhor, de sala cheia e a expectativa de que poderia sim dar certo. “Quando a gente criou o selo não tinha dinheiro, não tinha como investir. Os eventos eram uma forma de captar, cobria várias coisas, mas também serve como um trabalho de base, de formação de público, pois não existia um local para esse tipo de música nem um público para ir se multiplicando e continuar consumindo isso”.
Os primeiros shows que realizaram antes da casa própria na verdade haviam acontecido em outras locais já estabelecidos na área de entretenimento que não tinham foco na produção local ou autoral. “Não conseguíamos fazer com que as bandas, a casa e a produção se entendessem em termos de rendimento financeiro. Geralmente a casa ganhava muito, a banda pouco e a gente às vezes nada”, diz Heitor.
Foi assim que começaram a juntar os equipamentos de som que tinham, guardar algum recurso para comprar os que faltavam e não precisar mais alugar nada para realizar shows. Com o equipamento e o local próprios, ficou mais fácil chegar a um rendimento satisfatório junto às bandas. Os sócios afirmam que o principal critério da casa não é o aspecto financeiro, mas o artístico. Depois de deixarem a Casa Verde, seguiram o trabalho em outra local do Centro de Vitória, chamado de Casa Subtrópico, onde também ocorrem eventualmente oficinas e outras atividades.
Com capacidade para 120 pessoas, a média de público tem sido entre 70 e 80 visitantes, com uma renovação que consideram muito significativa. “Sempre aparece gente nova”, diz Gil. O ambiente é intimista e o som alternativo, formando uma atmosfera diferenciada na cena local, em eventos que começam no fim da tarde e terminam antes da madrugada.
Ali, o artista é o centro das atrações. Grupos de diferentes estilos passam pela casa, mas sempre trazendo um som fresco. “Nunca foi um lugar de música capixaba apenas. Mas de mostrar a música que se produz agora. No Espírito Santo, no Brasil, no Mundo. Trazemos bandas de sons distintos mas que se conversam porque são contemporâneas”, explica Gil. Para Heitor, o trabalho com a música autoral é visto como natural dada a personalidade extremamente inquieta e criativa. “Num sentido mercadológico, não importa quem toca, importa o que se toca, não importa o compositor”, diz Gil criticando a indústria cultural.
O mesmo cuidado dos shows, eles dizem que procuram dar nas gravações. Fazer um preço acessível, com produção de qualidade e tratamento personalizado, buscando ter sensibilidade para o que a banda busca. “Tentamos achar um lugar comum, que não seja caro, não seja de graça, e não precise ter um taxímetro contando e cobrando cada minuto que passa no estúdio”, manifesta Gil
Ambos produtores enxergam um momento interessante no cenário local, nacional e mundial. “Nos últimos cinco anos no Brasil nunca apareceu tanto artista incrível um atrás do outro, sem parar. No Espírito Santo é o mesmo, em seus respectivos nichos, temos artistas em quase todos festivais do Brasil. Mas às vezes é mais fácil o artista sair daqui pra tocar em outro estado e fazer três shows seguidos do que conseguir fazer três shows em Vitória”, observa Gil, que considera que a capital e o Estado poderiam ter muito mais espaços abertos ao som autoral.
Heitor percebe que há uma boa sinergia entre os artistas da cena independente capixaba atual. “Todo mundo está envolvido, se enxerga de forma integral, não tem uma competição, todos se admiram. O modo comportamental dos músicos e de quem está envolvido com música mudou muito também”.