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Destino do Radium Hotel provoca polêmica em Guarapari

Depois do chamado para uma consulta pública realizada no final de novembro, diversos grupos políticos sociais e culturais de Guarapari vêm questionando o direcionamento que parece ser pretendido para edifício do Hotel Radium no apagar das luzes do governo Paulo Hartung. O chamamento foi feito a partir de demanda da Câmara de Dirigentes Lojistas e Sindicatos dos Lojistas do Comércio do município e Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes).

O Radium Hotel é tombado desde 1998 como patrimônio histórico e cultural pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC) e reivindicado há muitos anos para ser um espaço cultural por artistas, produtores culturais e outros moradores da cidade. Atualmente o prédio que pertence ao governo do Estado está concedido à prefeitura e vinha sendo gerido pela Associação de Moradores do Centro de Guarapari (Amocentro), embora não mais utilizado por falta de apoio do poder público, conforme alega Neto Themistocles, integrante da entidade.

Se a audiência convocada pela Secretaria Estadual de Turismo (Setur) supostamente seria para discutir a utilização do edifício, soou como um “jogo de cartas marcadas” para muitos participantes. “O que percebemos na reunião é que tanto o governo municipal quanto o estadual têm um rumo já tomado no que concerne ao uso que querem dar ao Radium, e o processo de 'Chamamento Público' não obteve a devida transparência e democracia necessária, já que ao abrir pouco espaço para o debate e trazendo uma palestra específica sobre 'Turismo de Saúde.' deixaram claro que aquele espaço era apenas um momento para ouvirmos as suas ideias sobre o Radium, deixando pouco espaço para aqueles que há tantos anos lutam e constroem propostas”, disse Bruno de Deus, integrante do coletivo cultural Sinestesia.

O evento consistiu numa palestra da presidente da Associação Brasileira de Turismo de Saúde (Abratus), Julia Lima, que falou sobre os benefícios, maravilhas e milhões de reais gerados pelo turismo de saúde. Ou seja, a consulta começou um tanto enviesada. Desde o primeiro semestre, a prefeitura já havia declarado que pretende conceder o local para a iniciativa privada construir um spa, o que foi devidamente registrado por meios de comunicação de Guarapari.

Contestado publicamente, o Secretário Estadual de Turismo, Paulo Renato, saiu pela tangente: “Estamos aqui para dar sugestões, mas quem decide é a sociedade guapariense”, registrou o Folha Online. O prefeito Edson Magalhães (PSDB) não disfarçou a intenção. “Juntos com o Governo do Estado e a sociedade guarapariense nós encontraremos o melhor caminho de forma democrática para que a gente realmente possa ter aqui um polo turístico, principalmente focado na saúde e nas areias monazíticas, definindo um melhor destino para o Radium Hotel”.

A ideia não agrada nada setores da sociedade que vem lutando há bastante tempo para que o espaço possa servir de fato à sociedade. “Nossa proposta está fundamentada naquilo que pensamos ser um uso sociocultural específico para um patrimônio tombado pelo Conselho Estadual de Cultura, além de também dar um retorno à sociedade no tocante à questão econômica e turística, atentando pras demandas locais”, explicou Bruno. A proposta que vem sendo amadurecida seria de utilizar o espaço como Centro de Referência da Cultura associado a uma Escola de Turismo, Hotelaria e Gastronomia.

O arquiteto César Iván Pinheiro, que é vice-presidente da ONG Religare e um dos elaboradores da proposta, questiona que como patrimônio cultural o espaço deveria ser destinado para ações culturais, podendo por meio delas também posicionar e beneficiar o setor de turismo.

Neto Themistocles, da Amocentro, considera viável ter um spa no primeiro andar e um centro cultural no segundo, como proposto em maio pela prefeitura, de modo a garantir a sustentabilidade financeira do espaço. “Estamos na luta para que o espaço continue sendo patrimônio da cidade. No que depender de nós. não será transferido para a iniciativa privada”, alegou. 

Por sua localização privilegiada e valor histórico, o local é considerado como o metro quadrado mais caro de Guarapari. O vereador Marcos Grijó (PDT) aponta que pode haver interesses relacionados com a especulação imobiliária por trás de todo processo. O espaço em jogo inclui não só a construção do Radium Hotel, mas um grande espaço do entorno, incluindo o local onde acontece uma feira.

O deputado estadual Euclério Sampaio (DC), chegou a afirmar da tribuna da Assembleia que o governador Paulo Hartung (sem partido) estaria querendo favorecer empresários aliados e passar o hotel ainda este ano para a Federação do Comércio do Espírito Santo (Fecomércio) ou para o grupo MedSênior.

Mas de fato, após o chamamento, foi aberto um período até 28 de dezembro para os interessados apresentarem propostas de solução para o uso do Radium Hotel. “O foco será nas propostas de ocupação de empreendimentos que tenham o turismo como atividade econômica”, diz o edital da Setur publicado no Diário Oficial.

Estas propostas serviriam de base para a realização de uma minuta de edital por meio de um grupo de trabalho a ser nomeado pelo próximo governo estadual. Segundo a Setur, as informações foram encaminhadas à equipe de transição. “Me parece que foi mais uma audiência para cumprimento de tabela do atual governo do que algo para gerar um resultado. Acho que precisamos escutar mais a sociedade. É um patrimônio que está ali e que precisa ser bem usado, para isso temos que entender os anseios da sociedade, o que não vai acontecer agora no apagar das luzes do atual governo”, criticou Gedson, ex-vereador ligado ao futuro governador Renato Casagrande (PSB).

César Iván Pinheiro não vê seriedade na iniciativa da prefeitura e o governo estadual entende que a condução do processo tem sido de feito de forma unilateral. “A prefeitura teve vários anos para criar uma gestão responsável do Radium através de um conselho, mas não tiveram interesse. Agora sinalizam que querem devolver o prédio mas antes criar uma espécie de concessão que não deixaram muito clara como seria”, afirmou. Ele ressaltou que ainda não há diretrizes do Conselho Estadual de Cultura sobre a proposta de ocupação e reforma. O CEC afirma que se manifestará por meio de um parecer técnico que será emitido pela Câmara de Patrimônio Arquitetônico, Bens Móveis e Acervos.

O vereador Grijó entende que é necessário um processo amplo de discussão que não pode ser realizado no final de governo de forma apressada. “O Radium Hotel é patrimônio cultural, seu destino precisa ser discutido por um bom período. Sobre o turismo, em muitos lugares do mundo ele se dá justamente por conta da história e cultura dos locais”, alega.

No apagar das luzes, de fato, o cenário está povoado de incertezas.

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