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Um grito de socorro aos que não têm voz

Mais do que os números absolutos de indiciamentos que pede à Justiça – quatro pessoas – o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Maus Tratos aos Animais no Espírito Santo é um grito qualificado de socorro que rompe o silêncio letal característico do cotidiano desses seres vivos invisibilizados em nossa sociedade “civilizada”.

A violência contra os animais– de estimação, abandonados ou selvagens – acontece cotidianamente nos mais diversos ambientes, de condomínios de luxo a bairros populares, passando pelas zonas rurais ou mesmo reservas florestais.

A legislação existe, mas é considerada pouco rigorosa pelos cuidadores de animais, e, ainda assim, pouco implementada. A Lei de Crimes Ambientais (9.605/1998) fala em detenção de três meses a um ano, mas o Código Civil permite troca da prisão por multa ou prestação de serviço para as penas inferiores a quatro anos de detenção. Resultado, não há registros de prisão para maus tratos, mesmo quando o animal vem a óbito.

A ausência de uma cultura de vigilância e denúncia favorece ainda mais a impunidade. As denúncias, muitas vezes carecem de informações relevantes, dificultando as investigações por parte da Polícia Civil, tão sucateada, carente de efetivo policial e estrutura técnica.

A falta de apoio – financeiro, material e humano – às entidades que cuidam de animais abandonados, aos abrigos voluntários e às pessoas que se dedicam aos animais maltratados em suas próprias casas, é outro vazio que torna o trabalho de cuidado e proteção ainda mais vulnerável.

Criada em maio de 2016, a CPI dos Maus Tratos preencheu, então, nesses dois anos de atuação, parte dessa lacuna, absorvendo número considerável de denúncias – mais de 300, no total. Foram 34 reuniões na Assembleia Legislativa, diligências e audiências nas cidades de Linhares, Cachoeiro de Itapemirim, Guarapari e Itapemirim, onde foram ouvidas 59 pessoas, entre testemunhas, investigados e convidados.

Os quatro indiciamentos solicitados ao Ministério Público Estadual e à Delegacia de Crimes Ambientais foram contra Nicole Presotti Corteletti e Letícia Medeiros de Oliveira, responsáveis pelo Canil Blue Point, localizado no bairro Retiro do Congo, em Vila Velha; Maria Marcia Liverani, presidente da ONG Animais Carente, em Cachoeiro de Itapemirim, incursa, além do crime de maus-tratos, em prática de estelionato (artigo 171 do Código Penal); e o policial militar da reserva Nelson Fagundes, denunciado pela morte de um gato, ocorrida em junho de 2017, no bairro Goiabeiras, em Vitória.

Além desses casos, outros crimes constam no relatório final, incluindo o espancamento do cachorro Ambrósio, em Cachoeiro de Itapemirim, que comoveu o Estado na época; e a morte por espancamento e envenenamento de gatos na Mata da Praia, em Vitória, no condomínio Aldeia Igarape, na Serra e no município de Itapemirim; o abandono de cães no campus de Goiabeiras da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e na Ilha da Pólvora; a venda ilegal de animais silvestres pelo site OLX; e o atropelamento de animais selvagens na BR-101 Norte – este último, um problema histórico que já foi denunciado ao Ministério Público Federal e órgãos ambientais, sem ainda uma solução definitiva, apesar de farto material científico indicando as medidas que devem ser adotadas.

A CPI teve a presidência de Janete de Sá (PMN), contando também com a vice-presidência de Doutor Hércules (MDB) e a relatoria de Gildevan Fernandes (PTB), além dos membros efetivos Amaro Neto (PRB) e Marcos Bruno (Rede) e suplência de Erick Musso (PRB), Luzia Toledo (MDB) e Raquel Lessa (Pros).

Janete afirma que em 2019, no que depender dela, a CPI terá prosseguimento, pois “infelizmente esses crimes nunca acabam”. Que assim seja, e que essa voz se amplifique.

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