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Repasses de R$ 1,1 milhão não chegam a hospital estadual por inadimplência de OS

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) aplicou a sanção administrativa de “Advertência” à Organização Social (OS) Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar Pró-Saúde, contratada para administrar o Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE – antigo São Lucas), no Forte São João, em Vitória. O motivo seriam repasses de dinheiro público no total de R$ 1,1 milhão – feitos à OS de junho de 2018 a abril deste ano – que foram bloqueados pela Justiça por dívidas que a Pró-Saúde acumula em outros estados com fornecedores e ex-funcionários. Publicada no Diário Oficial do último dia 3, a sanção administrativa é resultado também do descumprimento de duas notificações anteriores.

O ato é assinado pelo subsecretário de Estado de Assistência em Saúde, Fabiano Ribeiro dos Santos, e a OS tem cinco dias após o recebimento para apresentar recurso à decisão.   

Outras duas notificações, ainda sem aplicação de penalidade, já haviam sido enviadas pela Sesa à Pró-Saúde este ano. A primeira em 14 de maio (Notificação 025/2019) e citava que a Organização Social já havia sido alertada a sanar as pendências em ofício enviado em março de 2019. A outra foi enviada no dia 6 de junho, ambas também assinadas pelo subsecretário.

Mais de R$ 1 milhão bloqueados

No último caso, na notificação de 6 de junho (029/2019), foi pedido que a Pró-Saúde apresentasse, em cinco dias úteis, documentação comprobatória do retorno dos saldos bloqueados, conforme uma relação de 16 depósitos feitos pela Sesa. Com datas variando de 22 de junho de 2018 a 15 de abril de 2019, os valores repassados pelo Estado à Pró-Saúde e bloqueados somam R$ 919,7 mil. O subsecretário Fabiano Ribeiro dos Santos pediu ainda que a Organização Social apresentasse documentação comprobatória do retorno do saldo bloqueado  de R$ 194 mil, disponibilizado para a aquisição de três máquinas de osmose reversa portátil, conforme estabelecido contratualmente. Todos os valores somados chegam a pouco mais de R$ 1,1 milhão, repassados pela Sesa e que não chegaram ao Hospital Estadual de Urgência e Emergência. 

Num documento interno, também de 6 de junho deste ano, Juliana Medeiros da Silva, do Núcleo Especial Econômico-Financeiro das Organizações Sociais, e Madga Cristina Lamborguini, gerente de contratação das Organizações Sociais, ambos setores da Subsecretaria de Estado da Assistência em Saúde da Sesa, alertavam o subsecretário da pasta sobre as irregularidades envolvendo a Pró-Saúde e recomendado atitudes que foram tomadas no mesmo dia. Entre as orientações, que a Pró-Saúde providenciasse o saneamento das pendências para a devida regularização dos repasses mensais, conforme estabelecido contratualmente. A Sesa ameaça ainda comunicar o caso, se comprovada a irregularidade, ao Tribunal de Contas do Estado (TCE).

No momento, servidores do HEUE relatam que setores e alas da unidade estão sendo isolados, pois alguns dos pacientes estão infectados com uma superbactéria ainda não identificada. 

Histórico de irregularidades

Não é de hoje que entidades do movimento social e órgãos públicos de fiscalização, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas, questionam a atuação de organizações sociais, empresas teoricamente sem fins lucrativos que vêm assumindo a gestão de diversos hospitais públicos Brasil afora. Nem sempre o discurso de modernizar e dar mais eficiência à gestão das unidades é o que se vê na prática. Em ao menos sete estados onde também administra hospitais públicos, há processos contra a Pró-Saúde, como, além do Espírito Santo, no Rio de Janeiro, Paraná, São Paulo, Tocantins, Pará e Goiás. 

A organização, ligada à Igreja Católica, é investigada por má gestão, falta de prestação de contas do que arrecada e investe, desvio de medicamentos, superfaturamento de serviços e por descumprir contratos de gestão, firmados com governos estaduais e municipais. Também responde a dois mil protestos que somam cerca de R$ 20 milhões em dívidas. A lista de ações judiciais inclui reclamações trabalhistas por contratações irregulares, atraso nos salários e falta de pagamento de horas extras dos médicos e servidores da saúde. 

Em fevereiro deste ano, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral confessou à Justiça Federal um esquema com a Pró-Saúde citando, inclusive, o possível envolvimento do arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta. A investigação da força-tarefa da Lava Jato contra o esquema de Cabral levou 21 pessoas à prisão, incluindo o ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes (em setembro de 2018) e os empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita. Iskin foi acusado de ter influência tanto sobre o orçamento e a liberação de recursos pela Secretaria de Saúde quanto sobre as contratações pela Pró-Saúde. Por isso, indicava empresas e fornecia a documentação necessária para a contratação. Segundo ele, 10% do valor dos contratos eram divididos em propinas. 

 

Histórico

 

As OSs começaram a assumir os hospitais do Espírito Santo em 2009, sem que o projeto passasse pelo controle social do Conselho Estadual de Saúde, quando o Hospital Central de Vitória foi entregue à Associação Congregação de Santa Catarina, primeira Organização Social a atuar no Estado. Até outubro de 2017, outras três unidades foram terceirizadas, também sem consulta ao órgão: Jones dos Santos Neves (Serra), São Lucas  – hoje Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE/Vitória) – e o Hospital Infantil de Vila Velha (Himaba). 

 

Na gestão do ex-governador Paulo Hartung, havia projeto de uma terceirização por atacado para outros seis hospitais estaduais, incluindo unidades do interior: Dr. Alceu Melgaço Filho, em Barra de São Francisco (edital já aberto); Roberto Arnizaut Silvares, em São Mateus; Silvio Avidos, em Colatina; Antônio Bezerra de Faria, em Vila Velha; Dório Silva, na Serra; e Infantil de Vitória. O plano foi interrompido pelo atual secretário de Estado da Saúde, Nésio Fernandes, que quer implantar uma fundação estatal para gerir os hospitais. 

Em  2018, o Sindicato dos Servidores da Saúde (Sindsaúde) protocolou uma série de denúncias que envolviam outras OSs que atuam no Estado, sobretudo o não cumprimento dos serviços estabelecidos nos contratos de gestão e precarização das relações de trabalho. Os documentos foram entregues em três órgãos: Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPES) e Tribunal de Contas (TCE). 

Ainda em 2018, o Ministério Público de Contas (MPC-ES) emitiu parecer em que orientava pela suspensão de todos os contratos de aquisição de material hospitalar celebrados entre a Associação Evangélica Beneficente Espírito-Santense (AEBES), Organização Social gestora do Hospital Estadual Jayme Santos Neves, e o grupo empresarial familiar Pegurin Libório. Havia suspeitas de monopólio nas contratações feitas pela OS, que privilegiava sempre o mesmo grupo familiar na compra de material hospitalar. 

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