“O Supremo está sendo convocado e os olhos da população, das organizações, da academia, dos cientistas estarão voltados para o que irá decidir”, afirmou o senador Fabiano Contarato (Rede), na manhã desta quinta-feira (22), ao liderar o ajuizamento de dois pedidos no Supremo Tribunal Federal (STF). O primeiro é de impeachment do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. O segundo, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), em desfavor de Salles e do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL).
“E olha que eu não estou falando nem da ministra da Agricultura, que só esse ano já chega a 300 autorizações de agrotóxicos. Eu não estou nem falando no ministro de Infraestrutura ou de minas e energia que cogitam a possibilidade de extração de minério em terra indígena e de extração de petróleo na foz do rio Amazonas”, anunciou Contarato.
Acompanhado de dois colegas do partido que também assinaram os documentos, o senador Randolfe Rodrigues (AP) e a deputada federal Joenia Wapichana (RR), Contarato enfatizou que a medida extremada de pedir o impeachment de um ministro de Estado é inédita no STF e é resultado de uma série de medidas inconstitucionais que o gestor do MMA vem promovendo nos últimos oito meses.
“Só eu já ajuizei oito ações em desfavor do Ministério do Meio Ambiente. Seja arguição de descumprimento de preceito fundamental [ADPF], seja ação popular, seja mandado de segurança, porque está havendo um verdadeiro desmonte na área ambiental”, disse.
A fundamentação para o pedido de impeachment destaca quatro pontos: descumprir o dever funcional relativo à Política Nacional do Meio Ambiente e à garantia constitucional do meio ambiente ecologicamente equilibrado (Art. 225); atuar de forma incompatível com o decoro, honra e dignidade da função ao perseguir agentes públicos em razão do mero cumprimento da função; expedir ordens contrárias à Constituição Federal, ao promover alterações da estrutura do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), reduzindo de 100 para 23 o número de conselheiros; não tornar efetiva a responsabilidade do seu subordinado, Sr. Eduardo Bim, ao permitir a exploração de áreas de proteção na bacia de Abrolhos.
Apesar de inédito no Brasil, há precedente para a proposta, no país vizinho da Colômbia, onde, em 2018, “a Suprema Corte, numa ação idêntica, ação direta de inconstitucionalidade, condenou o governo colombiano a preservar a combater o desmatamento”, citou Contarato.
Condenações e assédio moral
No documento, Contarato e seus colegas listam diversos exemplos das posturas denunciadas, como a extinção da secretaria de mudanças climáticas e do plano de combate ao desmatamento; nomeações de servidores sem qualificação técnica para ocupar cargos de chefia em unidades de conservação; perseguição e assédio moral contra a servidores que se mostram contrários à suas determinações; corte de 24% no orçamento do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama); e mesmo declarações públicas, como a que foi feita no programa Roda Viva, da TV Cultura, onde o ministro do Meio Ambiente afirmou que as mudanças climáticas são um “problema acadêmico”, “para daqui a 500 anos”.
“As estatísticas de todas as fontes – governamentais e não governamentais – indicam retrocessos significativos nos indicadores ambientais no período sob a gestão do atual Ministro de Meio Ambiente. Os estudos também indicam não se tratar de efeitos climáticos normais ou naturais. Ao contrário, todas as conclusões são no sentido de que a degradação do meio ambiente é derivada da ação ou da omissão humana”, argumentam os parlamentares.
O pedido de impeachment também cita outras ações ajuizadas contra Salles, como o pedido feito pelo procurador Geral do Tribunal de Contas da União (TCU) e aceito pelo Plenário da Corte, que, em maio, instaurou processo administrativo de investigação, para verificar se política ambiental do ministro descumpre os princípios administrativos consagrados pela Constituição Federal.
No Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Salles foi condenado por improbidade administrativa, por ter alterado indevidamente o Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental Várzea do Rio Tietê. “Na sentença, o juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública da capital aponta que, além de combinar as alterações nos mapas sem consultar os demais integrantes do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), Salles perseguiu funcionários públicos que não quiseram cometer ou acobertar as irregularidades”, relata o documento.
Bolsonaro
Já no pedido de ADO contra Salles e Bolsonaro, o foco é a atuação dos dois gestores especificamente na região Amazônica. São citados dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e da ONG Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), que no último dia 16, divulgou que o aumento do desmatamento na Amazônia foi de 15% em 12 meses, tendo sido, em julho de 2019, 66% maior que o mesmo mês de 2018.
Um dos perigos desse aumento desenfreado do desmatamento, sublinha a ADO, é o chamado “ponto de inflexão” ou “ponto de ruptura”, no qual não seria possível recuperar a vegetação, que seria transformada em uma savana.
“Os pesquisadores apontam que tal ponto será atingido se 20% a 25% da extensão original da floresta for desmatado, sendo que atualmente a perda está em torno de 16% a 17%. Isso também importaria em alteração climática severa da região”, alertam os parlamentares.
A ação, com pedido de medida cautelar, requer que “seja declarada a omissão inconstitucional do presidente da República e do ministro do Meio Ambiente para determinar a adoção de providências de índole administrativa no sentido de combater o desmatamento na Amazônia”.
E pede que seja determinada a execução integral do orçamento dos órgãos ambientais; a contratação de pessoal para as atividades de fiscalização ambiental na Amazônia; e a apresentação de plano de contingência para reduzir o desmatamento aos níveis encontrados em 2011, ou menores, e seu efetivo cumprimento em período razoável, sob pena de responsabilidade pessoal do ministro e do presidente da República.