A presidente do Tribunal Regional do Trabalho no Estado (TRT-ES), Ana Paula Tauceda Branco, marcou audiência pública para o próximo dia 26, às 9h, com o Órgão Gestor de Mão de Obra Portuária Avulsa (OGMO). Embora convocada sob o pomposo nome de “Órgão Gestor de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Espírito Santo: realidade portuária, crise econômica e desafios trabalhistas”, o objetivo é discutir o bloqueio das contas bancárias do OGMO no valor de R$ 109 milhões, gerados por descumprimento de intervalos para descanso dos trabalhadores, acidentes de trabalho, diferenças de salários e ressarcimento de imposto de renda, como explicou a advogada da entidade, Flávia Fardim, em entrevista nessa terça-feira (3) ao jornal A Tribuna.
Mas, apesar da importância do assunto, os autores das ações, trabalhadores do OGMO e seus advogados não vão poder participar da audiência. Também ficaram de fora os tomadores de serviço, uma vez que o OGMO é apenas um intermediador de mão de obra.
Foram convocados, por sua vez, seis sindicatos de classe, a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), uma federação de classe, a Associação dos Magistrados Trabalhistas, o Ministério Público do Trabalho, a Associação dos Advogados Trabalhistas, o Sindicato dos Advogados e a Ordem dos Advogados – Seccional Capixaba (OAB-ES), todos com direito a palavra. Segundo o site do TRT, também poderão participar como ouvintes as 40 primeiras pessoas que se inscreverem e todos os magistrados e servidores que o desejarem. O representante do OGMO poderá falar 10 minutos, e, a seguir, somente os convidados poderão falar por cinco minutos cada.
“Esperava-se que aqueles que tomam os serviços, os verdadeiros ‘patrões’, fossem convidados. Afinal, o próprio OGMO pretende lhes repassar a dívida. Meus clientes e os advogados envolvidos não foram convidados pelo TRT para a audiência pública. Será uma audiência sem patrão e trabalhador”, explica o advogado que representa vários trabalhadores portuários envolvidos no litígio, Esdras Pires.
Segundo ele, há uma questão inusitada: a maior parte dos processos trabalhistas possui como réus os próprios sindicatos de classe, por violação às decisões da Justiça do Trabalho, que anulou convenção coletiva que suprimiu intervalos para descanso dos trabalhadores, em ação movida pelo Ministério Público do Trabalho.
“O OGMO vai falar primeiro, depois falarão os seis sindicatos que respondem processos junto com o OGMO, são réus, e, por tal motivo, não representam os trabalhadores nessa questão. Há conflito de interesses entre meus clientes e os sindicatos. Vão falar, ainda, representantes de classes e da Justiça, mas os trabalhadores não terão direito a palavra, nem seus advogados, e sequer vão poder assistir a esta audiência, devido à limitação do número de ouvintes. Não fomos convidados”, enfatiza o advogado.
Processos
Segundo informações processuais públicas, o OGMO sofreu, nos últimos cinco anos, 653 processos, e vinha requerendo que, antes de suas contas serem penhoradas, a Justiça bloqueasse a conta dos tomadores de serviço. Ou seja, das empresas que contrataram os trabalhadores por seu intermédio. Também realizou, no dia 15 de abril de 2019, uma assembleia geral com as empresas, para buscar o rateio da dívida trabalhista.
A documentação dá conta que o maior tomador de serviços do OGMO, envolvido nas ações trabalhistas, é o Portocel, seguido pelo Terminal de Produtos Siderúrgicos, operado pela ArcellorMittal, Usiminas e Gerdau.
Tramita na Justiça do Trabalho, também, uma ação movida pelo Ministério Público do Trabalho contra os sindicatos e tomadores de serviço, pelo motivo de terem escalado trabalhadores sem intermediação do OGMO. Essa prática atualmente está proibida, por decisão do TRT. O que demonstra que os sindicatos se aliam aos tomadores de serviço, quando o assunto é escalação de mão de obra.
Trabalhadores portuários ouvidos pelo Século Diário, que não quiseram se identificar com medo de represálias, acusam o OGMO de orquestrar com os sindicatos a audiência, para as partes tentarem se passar por vítimas junto aos Juízes do Trabalho, de uma situação que eles próprios criaram.
“Quem manda no OGMO é o sindicato dos operadores portuários, o mesmo que firmou convenções ilegais com os sindicatos de trabalhadores, que geraram essas dívidas. Somente após dezenas de condenações, resolveram respeitar os intervalos de descanso ordenados pela Justiça, cessando as práticas ilegais. Essa audiência é um 'lobby' dos devedores junto à Justiça do Trabalho, mas confiamos na sabedoria dos seus juízes”.
“Querem fazer acordo de verdade? Chamem os tomadores e os prestadores de serviço, e abram as negociações”, provocou um dos credores.