Internação como primeira opção, distanciamento dos laços sociais e afetivos do paciente e doutrinação religiosa. Nesse tripé, que caracteriza o trabalho feito nas comunidades terapêuticas, estão os principais pontos criticados pelos movimentos sociais ligados ao tratamento de pessoas com dependência química, que questionam, inclusive, a eficácia do método adotado por essas instituições.
Segundo o professor de Educação Física, militante da Luta Antimanicomial, do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), do Fórum Metropolitano Sobre Drogas e integrante do Grupo de Trabalho e Prevenção ao Suicídio, André Ferreira, as comunidades terapêuticas funcionam como um abrigo para pessoas com dependência química e não há uma fiscalização rigorosa de seus trabalhos.
De acordo com André, o Governo do Estado destina para elas verba que vêm do Governo Federal, da Política de Combate às Drogas, custeando vagas de internação. No último dia 18, inclusive, a Secretaria Estadual de Direitos Humanos, realizou oficinas de qualificação para as comunidades terapêuticas (CTs) conveniadas ao Governo do Estado, parceria que também é questionada pelos militantes da Luta Antimanicomial.
Essa verba, argumenta André, deveria ser voltada para o tratamento da dependência química a ser realizado por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), que é mais eficaz. Ele explica que por meio do SUS o tratamento começa pela atenção primária, com profissionais da área da saúde. Se não resolver, a pessoa é encaminhada para a Rede de Atendimento Psicossocial, por meio do CAPS. A internação, afirma, é o último recurso, porém, de acordo com André, virou prioridade por meio das comunidades terapêuticas.
“É comprovado que a internação fragiliza os laços sociais, distancia a pessoa da família. Muitas comunidades quebram totalmente os laços afetivos, inclusive, enviando a pessoa com dependência química para outro estado. As comunidades criam uma situação ilusória, distancia a pessoa daquelas que podem oferecer drogas a ela, distanciam totalmente do ambiente do uso e quando a pessoa volta para esse ambiente não sabe lidar com a vida, com os convites que vai receber para usar a droga”, explica André.
André salienta que as comunidades terapêuticas normalmente são coordenadas por grupos evangélicos e os internos costumam se dedicar ao trabalho laboral e práticas religiosas, não havendo, de fato, um tratamento terapêutico para lidar com a droga. “No SUS, por meio do Capes, tem psicólogo, psiquiatra, vai ter grupos para auxiliar sobre como lidar com a droga, conversar sobre como está a experiência no ambiente de uso”, diz. E critica a utilização da dependência química como forma de praticar proselitismo religioso. “São pessoas fragilizadas pela dependência. Faz-se um tratamento baseado na religião, relacionam a droga com a ausência de Deus”, afirma.
Casos de agressão
Segundo o militante do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) e integrante do Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra (CDDH-Serra), Gilmar Ferreira, em muitas das comunidades terapêuticas já foram flagradas práticas de violências, segregação e tortura. Em 2018, o Governo Federal destinou R$ 90 milhões para as comunidades terapêuticas, repasse que passou para R$ 155 milhões no Governo Bolsonaro.
“O estado precisa afirmar o seu caráter laico. Os serviços de prevenção e tratamento para dependência do álcool e outras drogas devem estar disponíveis a todos na rede pública de saúde com equipamentos e profissionais capacitados, a exemplo dos Centro de Prevenção e Tratamento de Toxicômanos (CPTT’s) e dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)”.