A defesa do ex-presidente da Assembleia Legislativa, José Carlos Gratz, apela aos tribunais superiores – Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF) – para paralisar o processo que determinou sua prisão nesta semana. O argumento utilizado é que, com provas ilícitas, a ação pode ser enquadrada no caso do filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), o senador Flávio Bolsonaro (mesmo partido), que teve investigação contra ele encerrada com base nesse entendimento.
Na última segunda-feira (21), o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) determinou o cumprimento antecipado – segunda instância – da pena de Gratz, condenado em ação por supostos desvios de recursos no início dos anos 2000, escândalo que ficou conhecido como “esquema das associações”. Também foram expedidos mandados de prisão de outros sete réus, entre eles, o ex-diretor geral da Assembleia André Nogueira e o ex-deputado Almir Braga Rosa, conhecido como Almir Pernambuco, condenados na mesma ação, além de parentes de Nogueira.
Segundo um dos advogados de Gratz, trecho da própria decisão do TJES expressa que, a partir das quebras de sigilo da Editora Lineart – que teria sido usada para lavagem de dinheiro – a Receita Federal foi buscar e apreender documentos junto à Assembleia Legislativa, o que mostra o laço direto entre as provas ilícitas e os documentos apreendidos. “Esse tema vai ser analisado agora pelo ministro Marco Aurélio, do STF, não para anular a prova, mas para dizer se o processo vai parar igual ao do Flávio Bolsonaro”.
E continua: “Esse recurso que aborda as provas ilícitas e todos os questionamentos contraditórios do Tribunal, só será analisado pelo Superior Tribunal de Justiça em Brasília a partir do próximo ano. Em média, esses recursos demoram até dois anos para serem analisados. Agora a discussão é sobre a soltura dos réus e essa questão para pedir a suspensão da tramitação do processo tão como no caso do Flávio Bolsonaro”.
No caso Lineart, o TJES mandou prender um grupo condenado por corrupção e lavagem de dinheiro por desvio de dinheiro da Assembleia, mas as provas se basearam em informações da Receita Federal enviadas sem autorização judicial. Recentemente, o ministro Dias Toffoli acatou pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que reclamava de investigação contra ele alimentada por dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Histórico
Os presos nesta semana foram condenados em ação penal (nº 0008910-43.2003.8.08.0024) na sentença proferida no ano de 2011 pela juíza Cláudia Vieira de Oliveira Araújo, à época na 5ª Vara Criminal de Vitória, que entendeu que a Editora Lineart teria sido utilizada para lavagem de dinheiro da Assembleia, favorecendo os réus da ação.
O Tribunal de Justiça considerou que, no processo, foram provados crimes contra a administração pública, ordenação de despesa não autorizada por lei, peculato e lavagem de dinheiro, praticados entre os anos de 1999 a 2002. Na decisão, a juíza ressaltou que o total de recursos públicos desviados e destino comprovado, entre 1999 e 2002, foram de R$ 10,62 milhões.
Embora todos os réus tenham recorrido ao STJ e ao STF, o Tribunal de Justiça decidiu mandar expedir os mandados de prisão, alegando que o Supremo permite o cumprimento provisório das penas, após a decisão de segunda instância.
Nas denúncias iniciais, o Ministério Público do Estado (MPES) narra a utilização de “laranjas”, que sacavam o dinheiro e entregavam aos supostos beneficiários. Entretanto, a defesa dos acusados contesta as acusações com a justificativa de que os recursos seriam, na verdade, subvenções sociais – isto é, verbas destinadas pelo Legislativo para o apoio a entidades, eventos, veículos de comunicação e até para associações de classe do Judiciário – exatamente estes últimos não chegaram a ser denunciados na Justiça.
Precedentes do STJ
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça já tinha dado provimento ao recurso em habeas corpus (RHC 41931) interposto pela defesa do ex-diretor-geral da Assembleia, André Luiz Cruz Nogueira, acolhendo a alegação da defesa de que quebra do sigilo bancário só poderia ser feita de duas formas: por ordem judicial ou através de uma Comissão Parlamentar Inquérito (CPI).
O STJ, no precedente, considerou que a abertura das informações sobre a editora e os beneficiários de transferências com a Lineart teria sido feito de forma unilateral pela Receita Federal. A decisão do STJ, entretanto, não foi aceita pelo Tribunal de Justiça para fins do processo 0008910-43.2003.8.08.0024, o que ocasionou a expedição dos mandados de prisão.