Apesar do déficit habitacional existente no Espírito Santo, o governo lançou na última semana o edital para venda do Edifício Valia, localizado no Centro de Vitória. Com 10 andares que totalizam 1.600 metros quadrados construídos, em um terreno de 220 metros quadrados, o edifício vai a leilão por um lance mínimo de apenas R$ 930 mil. Quem oferecer o maior valor leva. A sessão pública para abertura dos envelopes acontece no dia 25 de novembro, às 10h, na Secretaria de Gestão e Recursos (Seger), localizada no mesmo bairro.
O edital deixa em aberto o uso a ser feito pelo comprador, podendo ser para moradia, comércio, serviço. “A venda de imóveis públicos que estão subutilizados ou desocupados reduzem gastos com a manutenção desses espaços”, justificou a secretária Lenise Loureiro, apontando que a medida também contribui para ocupação e movimento no bairro em que está situado.
Clara Miranda, professora de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Estado (Ufes) e integrante do grupo BR Cidades, apontou uma evidente contradição na decisão do governo, já que o mesmo já manifestou intenção de elaborar um plano habitacional via Secretaria de Saneamento, Habitação e Desenvolvimento Urbano (Sedurb) e Instituto Jones do Santos Neves (IJSN), que em agosto deste ano realizaram um seminário sobre o tema com presença do governador Renato Casagrande (PSB).
“Uma das premissas de uma política de habitação social ou de interesse social é constituir um estoque de imóveis, terrenos…está preconizado na Política Nacional de Habitação de 2005”, atentou a professora pelas redes sociais. “Essa atitude do governo do Estado de vender o seu patrimônio por quase nada é totalmente contraditória com sua intenção inicial: conceber um plano habitacional”.
Uma pesquisa publicada pelo Instituto Jones em 2017 mostra que o déficit habitacional no Espírito Santo é predominantemente urbano e em sua maioria na Região Metropolitana da Grande Vitória, sendo que quatro municípios metropolitanos ocupam os primeiros postos em maior número de pessoas em situação de déficit habitacional, que considera situações como habitações precárias, co-habitação forçada, alta densidade e ônus excessivo com o aluguel, que afetam especialmente as populações de baixa renda. Daí a necessidade de construção de políticas habitacionais para atender essa população, considerando também os espaços mais centrais das cidades e não apenas os locais periféricos e ausentes de serviços públicos.
Segundo os dados, quatro municípios da Grande Vitória lideram o ranking de mais cidadão afetados pelos problemas de moradia. Na inglória liderança aparece a Serra: 34,9 mil pessoas em situação de déficit habitacional. Em seguida Vila Velha (24,9 mil), Vitória (19,3 mil) e Cariacica (18,7 mil). Apenas os quatro municípios somados representam quase 43% do total no Estado. Em termos de domicílios, o Espírito Santo necessitaria de mais de 100 mil novas unidades habitacionais, o que equivale a quase 8% do que existe hoje.
O direito à moradia é considerado um direito social, reconhecido na Constituição brasileira, que também considera que toda propriedade deve cumprir uma função social. Nos últimos anos, o Centro de Vitória vem sendo o polo principal de discussão da questão a partir da presença de movimentos sociais de luta por moradia que realizaram ocupações em prédios ociosos e da articulação de algumas organizações e entidades comunitárias, jurídicas e acadêmicas, sendo que a associação de moradores do bairro já mapeou mais de 100 imóveis ociosos na região.
Pessoas físicas ou jurídicas podem participar do edital de venda do Edifício Valia, que está disponível no menu Licitações do Portal de Compras do governo. O prédio está localizado na Rua Duque de Caxias, número 105, e já foi ocupado pela Secretaria de Justiça e pela Polícia Civil, encontrando-se atualmente sem uso.