No Dia da Consciência Negra, nesta quarta-feira (20), o governador Renato Casagrande anunciou que enviará à Assembleia Legislativa um projeto de lei que reservará 20% das vagas em concursos públicos da administração estadual para negros. Casagrande fez o anúncio por meio de sua conta no Twitter e apresentou, nesta tarde, o teor da matéria a militantes do Movimento Negro capixaba.
A proposta, como aponta o governo, pleiteia diversas medidas voltadas para o atendimento aos direitos da população negra no Estado, em consonância com as disposições da Lei Federal nº 12.990, de 2014, que também estabelece a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para administração pública federal, além de refletir o posicionamento firmado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em relação à constitucionalidade das políticas afirmativas por meio da instituição de cotas raciais.
“É fundamental enfrentarmos a violência contra os negros, enfrentarmos a falta de oportunidades, a falta de educação e de políticas inclusivas. O negro enfrenta a desigualdade tanto no valor de remuneração quanto nas oportunidades. Queremos rapidez nessas políticas e queremos contar com a participação de todos. Nós temos um país racista e, nos últimos meses, o sentimento reacionário saiu do armário. Parabéns a toda população negra do nosso País e do nosso Estado”, destacou o governador.
A reserva de cotas é demanda antiga de entidades da área no Estado e motivo de comemoração, mas a coordenação da entidade Círculo Palmarino relembra, em nota, que um PL que tratava da reserva de 20% das vagas para negros em concursos na esfera estadual para negros já havia sido enviado pelo ex-governador Paulo Hartung à Assembleia no final de sua gestão, por obrigação judicial, mas foi retirado de pauta no início desta legislatura pelo atual governo.
“O Movimento Negro teve que recorrer ao Poder Judiciário, através de uma ação civil pública, ingressada em 2010, que foi concluída com um acordo judicial no qual o Executivo assumia a responsabilidade de encaminhar o projeto de lei. Entretanto, mesmo com o envio do PL logo após a assinatura do acordo em dezembro de 2018 pelo então governador Paulo Hartung, ao assumir o comando do Palácio Anchieta em janeiro do ano seguinte, Renato Casagrande retirou o projeto da Assembleia e só agora o reencaminha, aparentemente sem justificativa plausível pela demora”, aponta a nota.
O Movimento afirma, ainda, que “assim como foi a conquista das cotas raciais na Ufes [Universidade Federal do Estado], que só vieram após muita luta e uma negação por longos anos daquela instituição em admitir a desigualdade no acesso fundada no racismo, finalmente o governo do Estado anuncia o reenvio do projeto de lei estabelecendo as cotas raciais em concursos públicos da administração direta e indireta, na data que celebramos o Dia da Consciência Negra”.
Para a entidade, “isso revela o quanto as instituições resistem em admitir o racismo como gerador de desigualdades e, consequentemente, se negam a adotar medidas para enfrentá-las, mesmo diante de diversas pesquisas que revelam verdadeiros abismos entre negros e brancos em inúmeras áreas, como por exemplo, no acesso ao trabalho. Novamente para ter um dos seus direitos em vigor, é necessário um longo percurso e muita pressão para que as instituições os reconheçam e busquem efetivá-los”.
O Movimento Negro espera que o reenvio do projeto seja um novo marco na relação do Governo do Estado com as demandas das pessoas negras, que representam a maioria da população capixaba. “Daqui pra frente, exigimos que outras ações afirmativas sejam implementadas com maior brevidade para que possamos cada vez mais tornar o Espírito Santo um lugar que a cor da nossa pele e demais características fenotípicas não sejam barreiras para o acesso a direitos”, reivindica.
No início de setembro deste ano, o Movimento Negro capixaba reivindicou do governador Renato Casagrande o cumprimento de promessas relacionadas a políticas de combate ao racismo e de valorização da cultura negra. Assinada pelo coordenador do Círculo Palmarino-ES, Lula Rocha, a carta aberta explicava que, no âmbito da educação para as relações étnico-raciais, o governo até então não havia apresentado uma política efetiva para o enfrentamento ao racismo em diversas áreas, como educação e segurança pública”.
No Espírito Santo, o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) reserva, desde outubro passado, 20% das vagas de estágio para negros.
Comissão Permanente
O Governo do Estado também lançou, nesta quarta-feira (20), no Palácio Anchieta, a Comissão Permanente de Estudos Afro-Brasileiros (Ceafro) que “irá avançar na construção de uma escola sem racismo, com mais igualdade e equidade em toda a Rede Estadual”.
Vinculada à Gerência de Educação no Campo Indígena e Quilombola, da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), a Ceafro tem como objetivo promover estudos e viabilizar ações em consonância com as Leis Federais 10.639/2003 e 11.645/2008, que tratam do tema educação das relações étnico-raciais e ensino de história e cultura afro-brasileira, africana e indígena.
Caberá à Ceafro atribuições como participar do processo de discussão curricular e de formação continuada de profissionais da educação da Rede Pública Estadual, relacionadas à temática racial; orientar os educadores quanto às práticas curriculares que atendam aos dispositivos da legislação específica sobre a educação das relações étnico-raciais; assessorar a elaboração de documentos curriculares, com o objetivo de assegurar a inserção das temáticas étnico-raciais; manter permanente diálogo com instituições de ensino e pesquisa, sociedade civil organizada e participar de fóruns, conselhos e comissões de estudo, tendo como meta a implementação de ações concernentes aos dispositivos legais mencionados, bem como estimular a produção de materiais didáticos que subsidiem a implementação das temáticas étnico-raciais.
A Portaria Nº 114-R, que institui a Comissão Permanente de Estudos Afro-brasileiros (Ceafro) com atuação na Gerência de Educação no Campo, Indígena e Quilombola (Geiq) foi publicada nesta quarta-feira (20), no Diário Oficial do Estado.