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Madalena do Jucu 30 anos depois de Martinho da Vila

Era novembro de 1989, mês da Consciência Negra, quando Martinho da Vila fez o pré-lançamento do disco O Canto das Lavadeiras no Kizomba – Encontro de Arte Negra em evento na Fazenda Camping, na Barra do Jucu, em Vila Velha. A obra, que faz parte de uma longa pesquisa e imersão de Martinho nas manifestações de cultura popular afrobrasileiras, seria lançada oficialmente depois para todo Brasil, com uma surpresa. Numa reviravolta de última hora, Dancei, um maxixe que seria música de trabalho, foi substituído por Madalana do Jucu, uma versão em samba que utiliza versos e batida do congo capixaba, que aliás seria o ritmo com maior presença no disco, contando também com o pot-pourri Congos do Espírito Santo.

Trinta anos depois, a capixaba Déborah Sathler, nora de Martinho, apresenta o livro 30 anos da gravação de Madalena do Jucu: perspectivas históricas e novos apontamentos. Jornalista e mestra em Humanidades, Culturas e Artes, ela foi a campo conversar com antigos e jovens personagens do congo nas bandas de Vitória Amores da Lua (Santa Marta) e Panela de Barro (Goiabeiras) e de Vila Velha Mestre Honório e Tambores de Jacarenema, ambas da Barra do Jucu.

Déborah Sathler e integrantes da banda Tambores de Jacarenema. Foto: Zanete Dadalto

A obra apresenta um contexto histórico do fins dos anos 80 e também reconstituiu detalhes das passagens de Martinho da Vila pelo Espírito Santo e sua relação com o congo capixaba, que a autora entende que envolve questões musicais, étnicas e espirituais. Mas também traz o debate para os tempos de hoje. Pesquisadora na linha da História Oral com foco em questões de gênero e etnia, ela entrevistou 18 pessoas atuantes nas bandas e nos contextos culturais da época, repercutindo também a impressão que eles têm sobre a repercussão que a versão samba de Madalena teve para o congo local. 

A gravação de Martinho, que se tornara o grande sucesso do álbum e um dos maiores de sua carreira, acaba levando o congo para o cenário musical nacional, o que também contribui para valorização da manifestação no Espírito Santo, sendo que nas últimas décadas o número de bandas em atividade se multiplicou. Como bom partideiro, Martinho repetiu o refrão e também improvisou nos versos. O trabalho musical foi comandado pelo maestro Rildo Hora, que gravou a musicalidade do congo e buscou fazer referência e reverência numa versão de samba, assim como nas demais canções do disco que homenageiam outro ritmos afrobrasileiros e regionais.

Um dos capítulos do livro trata justamente desse diálogo rítmico entre o congo e o samba, para o qual Déborah contou com a assessoria do marido, o cantor, compositor e percussionista Tunico da Vila, filho de Martinho, que por ironias da vida e do amor, acabou vindo residir no Espírito Santo de Madalena. “Congo e samba têm o mesmo número de compassos, têm referências étnicas, similaridades de cultura”, explica a jornalista e produtora cultural, que estudou também as origens dos dois ritmos que se nutrem da afrobrasilidade como culturas híbridas, que dialogam permanentemente com o meio e o contexto em que estão.

Tonico da Vila e Criolo com integrantes do grupo Amores da Lua. Foto: Zanete Dadalto

É justamente nessa colocação do congo em seu contexto social e no contemporâneo que Déborah Sathler constrói o último capítulo do livro. Quando foi a campo não imaginava o que poderia encontrar. E uma das coisas que chamou atenção nos relatos, foi a presença de diversas manifestações de intolerância religiosa sofrida pelos congueiros em diversas regiões, um dos desafios a serem superados.

Mas o capítulo final vai trazer também ideias e propostas colhidas do participantes do congo e com outros nomes importantes da cultura como Viviane Mosé e o próprio Martinho da Vila. Propostas que podem servir como base para novas articulações, parcerias e construções de políticas públicas que possam valorizar mais o congo, cultura popular genuinamente capixaba.

Nesta quinta-feira (21), edições impressas do livros serão entregues no Auditório da Secretaria Estadual de Educação (Sedu), em Santa Lúcia, Vitória, como parte do projeto de distribuição que vai doar 1,3 mil exemplares para alunos das escolas estaduais, municipais e federais, buscando estimular a leitura e contribuir para o ensino da história e cultura afrobrasileira nas escolas, previsto a nível nacional pela Lei 10.639.

30 anos da gravação de Madalena do Jucu: perspectivas históricas e novos apontamentos foi produzido e impresso com apoio do Fundo Estadual de Cultura (Funcultura), ligado à Secretaria de Estado da Cultura (Secult), e vai ser lançado oficialmente para o público em geral no dia 7 de dezembro, às 15h, no Estúdio Bravo, em Jardim da Penha, Vitória.

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