O desfecho do embate entre Moro e Bolsonaro é uma incógnita, mas, de toda forma, os dois já têm lugar garantido no lixo da história
Rompeu-se a corda, como era esperado desde o golpe de 2016. De um lado, um carreirista com raro senso de oportunismo, do outro um político medíocre acostumado a usufruir dos recursos e privilégios do poder público em sucessivos mandatos inúteis e infrutíferos para a nação, mas altamente prósperos para a família.
O ex-juiz Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro ocupam os espaços da cena maior da tragédia nacional, com atitudes de bom-mocismo, mas escorregam a todo momento porque não conseguem maquiar a marca da maldade que cada um carrega. Ambos cometeram crimes, passíveis de punição, cuja aplicação, infelizmente, fica na dependência não do rigor da lei, como deveria ocorrer, mas na sustentação política de cada um.
Moro sai na frente, entronizado pela mídia na condição de herói da Lava Jato e como candidato em 2022. Surfa nessa imagem falsa que acoberta vazamentos de processos, condenação sem provas, como a do ex-presidente Lula, acertos para receber pensão complementar ao salário de ministro da Justiça, silêncio sobre as milícias e supostos crimes da família presidencial, entre outras tramoias resultantes dos círculos onde transitam os tipos mais deletérios da política nacional.
Bolsonaro se esparrama na lama da velha política que disse combater e consegue, ainda hoje, enganar a muitos. Cai o combate à corrupção, porque é falso, e ele busca alinhamento com o chamado Centrão, na Câmara Federal. É o que sobra de abrigo: partidos que sobrevivem no joguete de interesses pessoais ou de grupos. Republicanos, PTB, PP, Solidariedade, Podemos, Pros e Avante são alguns desse grupo. Na área do governo, deve indicar para substituir Moro no Ministério da Justiça um cidadão de sua cozinha, Jorge de Oliveira, e para a Polícia Federal, Alexandre Ramgem, amigo de seus filhos. Tudo em casa, mais fácil para controlar.
Nesse contexto sombrio, Dr. Simão Bacamarte é o nome que me vem à mente quando assisto às coletivas de imprensa de ambos e às carreatas da extrema direita que ainda os sustentam a invadir ruas e avenidas de cidades brasileiras. Uma loucura que traduz a tragédia brasileira, orquestrada com a cumplicidade de forças externas poderosas.
Como não lembrar, nesses eventos, o personagem do conto/novela O Alienista, de Machado de Assis, seu manicômio Casa Verde, onde ele internava todos que diagnosticava, equivocadamente, como loucos? E o seu aliado “Canjica”, codinome do barbeiro Porfírio, em sua ânsia de poder, para subir na política, que depois muda de lado, estabelecendo tremenda confusão. Machado de Assis construiu, em 1882, um cenário real do que aconteceria no Brasil, 138 anos depois.
Bom seria se o Simão Bacamarte que ocupa a Presidência da República procedesse do mesmo modo e apresentasse sua renúncia e desse o fora, desmascarando, ao mesmo tempo, seu ex-ministro, uma espécie de “Canjica” que o colocou no cargo maior da nação, ao tirar do páreo, injustamente, o adversário mais forte. Mas não se trata de ficção, a cena é real e assusta. O desfecho ainda é uma incógnita, mas, de toda forma, os dois já têm lugar garantido no lixo da história