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Ressignificando o papel e fotografando resíduos

Artista plástica Liana González explora a reutilização do papel como plataforma para obras de arte e fotografa a poesia das ruas

Divulgação

O papel é um dos produtos que melhor simbolizam o mundo contemporâneo: fruto de um processo de transformação da natureza pela indústria, canal de expressão para os humanos e ao mesmo tempo produto descartável. É para as sobras, os descartes, que a artista visual Liana González lança seu olhar para ressignificar o que viraria lixo.

“Interrompo esse destino, reutilizo esse papel como o encontro, com todas as informações e memórias entranhadas, paraliso em uma nova forma – a que se apresenta no momento em que, função cumprida, perde sua importância, sua elegância, para ser um amontoado qualquer, sem valor simbólico”, escreve a artista, que nasceu em Colatina e se graduou em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Estado (Ufes).

“Para onde me levará o papel?”, é uma pergunta que a artista se faz. Cartazes de filmes de cinema e anúncios publicitários são alguma das plataformas que ela reutiliza, aproveitando elementos já impressos e ressignificando a partir de sua pintura. Fotos, letras, desenhos, cores, tudo pode ter um novo significado. A propaganda, “o papel inútil, que todos descartam sem nem sequer ler”, fruto da reprodutibilidade e do capitalismo consumista, ganha um teor artístico e personalizado. Um novo projeto, ainda inédito, Liana está produzindo totens de papel, “porque papel tenho em abundância”, diz. Outras obras estão sendo feitas a partir da técnica do papel machê, massa feita a partir de papel picado.

É com um mesmo olhar sobre o descartado, o esquecido, que ‘Liana González realiza também um trabalho fotográfico. Menos como fotógrafa rigorosa na técnica e mais como artista que registra a poesia visual do cotidiano, a partir do olhar e sensibilidade apurados. “São olhares pela cidade. O que eu encontro de inusitado nas ruas, um entulho, um coração partido sofrendo no meio da rua calçada de pedras portuguesas”, diz, fazendo referência a uma de suas obras, que estreou na última sexta-feira (5) na exposição Gráfica 2020, da galeria carioca Zagut, que pode ser visitada pela internet, de forma adaptada aos tempos de pandemia.

O registro feito por celular pelas ruas de Jardim da Penha, bairro de Vitória, inspirou inclusive um poema da escritora Mara Coradello. Uma planta morta, caída, pisoteada, erótica, em forma de coração ou de vagina, numa metáfora visível apenas aos olhares mais atentos às coisas “desimportantes” das cidades.

A tônica da exposição, feita a partir da junção de artistas para os tempos de pandemia, é o tema “pontos e linhas”. “O coração é o ponto e as pedrinhas portuguesas formam as linhas, como um mosaico”, diz. Sou uma artista plástica que encontra algo poético na rua, me interesso demais pelo que encontro na rua”, explica Liana. “Tenho várias fotos com imagens que remetem a corações. É uma forma que existe em profusão, mas a gente não nota”.

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