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​Sarau da Barão completa cinco anos de existência

Frequência mensal e participação aberta são marcas do projeto que perdura no tempo e se reinventa durante a pandemia

A Rua Barão de Monjardim carrega um ecossistema próprio. Embora localizada no Centro de Vitória, está afastada do burburinho da Rua Sete e ao lado de um parque natural, a Gruta da Onça. Com muitos artistas e produtores morando no entorno, possui um número de espaços culturais significativos para uma rua só. Foi ali que surgiu o Sarau da Barão, que agora completa cinco anos de existência, um feito considerável em tempos tão turbulentos para as artes.

Mais ainda diante da necessidade de celebrar aniversário em plena pandemia, agora adaptado à internet. Será na quinta-feira (2), a partir das 19h no Instagram @coisasderuth, com participação confirmada de nove atrações de música e poesia além do “palco aberto”, permitindo que qualquer participante possa dar sua contribuição artística nos intervalos.

Mas claro, tudo começou com um encontro presencial. Numa paródia de Cálice, música de Chico Buarque, o artista Criolo cantou: “Os saraus tiveram que invadir os botecos/ Pois biblioteca não era lugar de poesia/ Biblioteca tinha que ter silêncio/ E uma gente que se acha assim muito sabida”.

E foi esse o lugar que começou o Sarau da Barão: na calçada do tradicional Bar Gruta da Onça, comandado pelo simpático Geraldinho, um ponto de encontro dos moradores. Ruth Léa Souza Rangel, moradora da rua, foi quem deu o primeiro passo. Na verdade a ação inicial era a inauguração de outro projeto, o Ponto do Livro-Vix, com uma caixa para doações e retirada de livros, que ainda existe no local.

Registro da primeira edição do Sarau da Barão, em 2015. Foto: Divulgação

A ideia foi então fazer um sarau para marcar a inauguração do Ponto do Livro. Compareceram umas 15 pessoas, incluindo clientes do bar que estavam ali sem saber do evento. “A noite foi tão linda, ficamos tão felizes com o resultado, que naquele dia mesmo resolvemos que o Sarau iria acontecer todo mês, no caso, toda primeira quinta feira de cada mês. E o nome pegou: Sarau da Barão”, conta Ruth.

Desde então, o Sarau mantém suas atividades regulares e já realizou 95 edições. Ganhou corpo dentro da cena literária e artística capixaba, atraindo não só os moradores locais, mas também pessoas da região metropolitana e até visita de escritores de outros estados que conheceram o projeto pela internet ou por indicação de amigos.

Na verdade, a coordenação cuida de organizar o espaço escolhido para o evento e trazer alguns convidados. O resto acontece de forma espontânea, sem precisar de inscrições, cada um pode estar como ouvinte ou contribuir quando desejar. “A cada edição é colocado um varal com poemas, com o objetivo de estimular a participação: quem vem e não trouxe um texto ou também quem é cliente do bar e descobriu o Sarau da Barão naquela noite e sentiu vontade de participar, os textos no varal servem de apoio”, explica a idealizadora.

Também ganhou um caráter itinerante, embora com foco no entorno da Rua Barão de Monjardim com extensão para alguns lugares do Centro. Além do Bar Gruta da Onça, a Casa Porto, Casa da Barão, Chafariz da Capixaba, calçada da Banca da Cultura, Praça Getúlio Vargas, loja Thelema e na biblioteca do Sesc Glória, onde mostraram que podem ocupar todos espaços que queiram receber a arte.

Algumas edições são especiais. Entre elas as de aniversário e também as que homenageiam artistas que permeiam o universo do Sarau da Barão, como na música Vinícius de Moraes, Chico Buarque, Belchior, Elis Regina, Raul Seixas e o capixaba Sandrera. Os varais de poesia também por vezes homenageiam poetas locais e nacionais como Suely Bispo, Benício Pereira, Conceição Evaristo, Mel Duarte, Drummond, Isabella Mariano, Augusto dos Anjos, Machado de Assis, e produção de frequentadores do Sarau como Angela Dionizio e Mileide Dias. Também foram realizadas edições do Sarau da Barão Infantil, dedicado às crianças.

A democratização da arte e incentivo à cultura são os objetivos do surgimento do Sarau da Barão e do Ponto do Livro-Vix. “Assim, acreditamos que incentivamos a formação do público leitor e também apreciador da literatura. Consideramos um fator importante na formação do público a regularidade do Sarau do Barão que, deste de sua primeira edição, acontece na primeira quinta-feira de cada mês, independente das edições especiais”, lembra Ruth Léa, que se recorda de algumas poucas edições que tiveram que ser canceladas por conta da previsão de chuva.

Ela também avalia que a forma espontânea de funcionamento e participação e a acessibilidade do local são fatores que tornam o espaço e o momento do sarau agradável, deixando as pessoas à vontade para participar, seja como público ou artista, duas coisas que se misturam no evento.

A formação de público é um orgulho para o projeto. Dois casos marcantes são de jovens poetas que fizeram sua primeira leitura em público de seus textos autorais durante edições do Sarau da Barão, como é o caso de Victor Inácio e Rafael Cuzzione, em 2017 e 2019, respectivamente.

Embora considere que todas edições são especiais, Ruth Léa lembra alguns momentos marcantes: quando no aniversário de um ano, Inácia Freitas recitou o texto A Receiteira, de Milson Henriques. As noites em homenagem a Vinícius de Moraes, o evento realizado no Chafariz da Capixaba, o aniversário de três anos com Sandrera, as aguardadas performance do ator Ronald Alves. Algumas ousadias como o Sarau Especial Gonzaguinha, iniciado numa manhã de domingo na Thelema, mas que se estenderia até o começo da noite.

Claro que com tantos encontros presenciais marcantes e comunitários, a pandemia foi um baque. Mas quando absorvido também trouxe outras possibilidades de ampliar os encontros ao realizar edições online. “Nessas três edições realizadas, em abril, maio e junho, tivemos participação de pessoas de Fortaleza, Florianópolis e Rio Grande do Sul. E tem sido uma alegria e um alento ver as pessoas, que normalmente encontrávamos na calçada, também frequentando o Sarau online”.

Ruth avalia que os cinco anos serão comemorados de forma diferente, mas com uma sensação de que o projeto vem cumprindo seu papel de contribuir para o acesso à arte. “E com possibilidade do cidadão tornar-se crítico e, por isso mesmo, sujeito e agente de sua história”, completa.

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