Foi tímido, quase inaudível, o grito de protesto diante do anúncio de que o Centro Cultural Carmélia Maria de Souza está para ser transformado em um depósito de café. O sentimento de perda, manifestado apenas por reduzido grupo de artistas, produtores culturais e agentes públicos, traduz o nível de importância dispensado à arte e à cultura na construção de políticas públicas visando maior integração social, privilegiando a cidadania.
O abandono a que está relegado o Centro Cultural Carmélia Maria de Souza confirma que a cultura, por meio de manifestações artísticas, é vista, na maioria das vezes, como mercadoria supérflua, plenamente dispensável. Nesse contexto, é jogada junto às ações de lazer e diversão, que podem ser deixadas para depois.
Essa é exatamente o que mostra a situação atual, gerada no decorrer de anos de abandono, desde quando o vistoso galpão foi cedido ao governo do Estado e à Prefeitura de Vitória pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU). Desde 2013, o espaço não é usado pela prefeitura, que pretendia transformá-lo em centro cultural, restrito, no entanto, ao Carnaval.
Os agentes públicos parecem desconhecer que a cultura está presente em todos os aspectos da vida social e suas manifestações intrinsecamente ligadas ao exercício da cidadania, necessitando que seja facilitado o acesso ao público, como forma de ampliar direitos, inclusive, e principalmente, em áreas mais afastadas, habitada por camadas de média e baixa renda.
O protesto foi tímido, insuficiente para barrar o processo do governo federal em seu programa de privatizações, que alcança os armazéns do Instituto Brasileiro do Café (IBC), em Jardim da Penha, o que motivou a transformação do Centro Cultural Carmélia Maria de Souza em depósito, escolhido por estar abandonado, prestes a desabar.
O poder público passa indiferente à história. O Carmélia virou coisa sem valor e a partir da gestão Paulo Hartung, o governo passou a investir em outras ações culturais, incluindo o inacabado Cais das Artes, que já consumiu mais de R$ 130 milhões e está com as obras paralisadas. Faltou vontade política no sentido de formalizar mecanismos legais, a fim de garantir ao Estado a posse do Carmélia, mediante o compromisso de mantê-lo em funcionamento.
O abandono do espaço não encontra justificativa aceitável, nem da parte do governo do Estado, muito menos da Prefeitura de Vitória, que aceita transformá-lo em espaço restrito ao Carnaval. É hora de juntar forças, visando mudar os planos do governo federal, que não está nem um pouco preocupado com a arte e cultura. Esses gestores sabem que nessas manifestações há o estímulo ao sentimento crítico, ao contraditório, que abominam.
Caso isso não seja mais possível, fica mais um exemplo de descaso para com um setor tão importante da vida nacional. A cidadania lamenta.