“Ele achou que devia fazer isso”
Não podemos esquecer: 6 de agosto de 1945. Há 75 anos, para pôr fim a uma longa e violenta guerra, o Presidente Harry Truman autorizou os ataques nucleares que provocaram a morte instantânea de 150 mil pessoas: 80.000 em Hiroshima e 70.000 em Nagasaki, além de tantas outras que morreram depois. Em alguns minutos, a cidade de 400 anos virou pó. Guerra é guerra, mas essas armas de destruição em massa foram jogadas sobre a população civil. Esse tenebroso evento ficou registrado nos anais da barbárie humana como o choque entre dois egos imensos: o imperador japonês e o presidente americano.
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Anos depois, perguntado se se arrependia de alguma coisa na vida, Truman disse: “Sim, devia ter me casado antes dos 30 anos.” Só isso? A crueldade ganhou ainda requintes de humor, quando as bombas ganharam nomes carinhosos – Little man e Fat man. Hoje, o evento que foi aclamado no país como um ato de heroísmo ganha uma visão diferente: o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki foi a mãe de todos os crimes de guerra.
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Declaração da UNESCO, “Nunca esqueçam as vítimas, nunca esqueçam a história. Nos 75 anos do lançamento das bombas atômicas em Hiroshima, vamos lembrar e reafirmar nosso compromisso com a paz”. Mas onde anda a paz, que não a vemos? As guerras e perseguições políticas, sociais e religiosas são mais sinistras que um certo vírus que anda nos afligindo ultimamente. E as ameaças de um ataque ou um acidente nuclear – um erro na fabricação e manuseio das bombas nucleares – continuam sendo uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças.
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Mas quem pode atirar a primeira pedra? Aceitamos e incentivamos a escravidão humana, uma guerra unilateral na exploração do povo africano, tratados como animais de carga sem quaisquer direitos. A vida humana manipulada de acordo com os interesses econômicos das minorias dominantes. Como se tal despropósito não fosse bastante cruel, ainda nos dias de hoje deparamos com discriminação, preconceitos, racismo. A história humana é feita de belos capítulos, mas neles se inserem períodos de tremenda degradação, como a que ocorreu agora no Líbano, por descuido, desleixo ou incompetência dos que são eleitos para cuidar do povo. Como a que aconteceu em Brumadinho, tão perto de nós.
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Que lições aprendemos com o passado? Parece que poucas, pois o mundo gira e tudo se repete, com os requintes de perversidade, ignorância e frieza sempre escalando. Desnecessário citar exemplos, basta assistir ao noticiário, seja local, nacional ou internacional. Kumar Pushpendra: Nunca houve uma guerra boa ou uma paz ruim, John F. Kennedy: Paz é um processo diário, semanal, mensal, mudando opiniões gradualmente, devagar derrubando velhas barreiras, quietamente construindo novas estruturas.
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O que eles falaram – Platão: Somente os mortos viram o fim da guerra. Herbert Hoover: Os homens mais velhos declaram as guerras, mas são os jovens que devem lutar e morrer. Jean-Paul Sartre: O rico inventa as guerras, mas é o pobre que morre. Deu no Washington Post: Ainda hoje não sabemos o exato número dos que morreram nas duas cidades japonesas – as estimativas variam de 110 mil a 210 mil. A radiação provocada fez adoecer e provavelmente encurtou a vida de muitos outros.
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O mundo ocidental culpou a teimosia do imperador Hirohito, que embora avisado do lançamento das bombas se não se rendesse, mandou os japoneses resistirem ‘até o fim’. No entanto, entretanto: “É estranho que Truman, que não tinha sede de sangue – não era um Hitler, não tinha prazer em matar pessoas – usou as bombas mesmo sabendo que os japoneses estavam derrotados e tentando render-se. Elas não eram militarmente necessárias,” disse o diretor do Instituto de Estudos Nucleares da American University, em Washington. O neto de Truman: Ele sentiu que devia fazer isso. Mas foi mesmo necessário?