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ES é o segundo estado com mais domicílios em ‘aglomerados subnormais’

Nas periferias, as pessoas infectadas têm mais sintomas de Covid-19, mas buscam menos atendimento em saúde

Fernando Frazão/Agência Brasil

O Espírito Santo é o segundo estado com maior proporção de domicílios localizados em ocupações irregulares, conhecidas como favelas ou ‘”glomerados subnormais”, conforme denominação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 26,1% dos domicílios nessa situação, segundo estimativa feita para 2020 pelo Instituto, estando apenas o Amazonas à nossa frente, com 34,59%. 

Com base nesse levantamento, foi feito um estudo pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) e Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), para investigar o comportamento da pandemia de Covid-19 entre dois grandes tipos de ocupação urbana.

Os resultados desse inquérito, já enviados para publicação, mostram que a prevalência de Covid-19 é similar entre moradores de aglomerados subnormais e de demais regiões das cidades, porém as pessoas testadas positivas no primeiro grupo apresentaram mais sintomas e procuraram menos os serviços de saúde.

Foram visitados 1.444 domicílios na Grande Vitória, sendo 714 em aglomerados subnormais e 733 em não-subnormais. Nos primeiros, 12% das pessoas entrevistadas testaram positivos e no segundo grupo, 10%. “Não houve diferença estatística significante”, observa a epidemiologista e professora da Ufes, Ethel Maciel.

Já a maior presença de sintomas e a menor proporção de atendidos por serviços de saúde nessa população “indica que pode haver dificuldade de acesso”, o que merece melhor investigação.

Essas duas características também apontam que a letalidade, o número de mortos pela doença em relação ao número de positivos, pode ser bem diferente entre esses dois grupos populacionais. “A hipótese de uma maior letalidade nos aglomerados subnormais precisa ser investigada”, acentua a cientista.

Outros dados confirmaram que nesses setores das cidades há um maior percentual de pessoas pardas e de analfabetos, há mais casas com um número de moradores maior que quatro pessoas, há mais usuários com viagens diárias longas de transporte coletivo e um número maior de casas com no máximo três cômodos. Foi verificado também que 2% desses domicílios não possuem água tratada.

Senso de comunidade preservado

A arquiteta e urbanista Latussa Laranja, diretora de Estudos e Pesquisas do IJSN, ressalta que o jargão de “subnormalidade” do IBGE se aplica a comunidades onde há ausência de regularização fundiária dos terrenos onde as casas são construídas – sendo ou terrenos públicos ou de pertencentes a outro proprietário – e inadequação de um ou mais dos serviços públicos essenciais, como saneamento básico (abastecimento de água, tratamento de esgoto e coleta de lixo) e fornecimento de energia elétrica.

Outra característica importante é a ocupação fora dos padrões vigentes, com vias de circulação mais estreitas e irregulares e sem calçadas, além da ocupação em áreas das cidades não permitidas segundo a legislação ambiental.

Esse perfil, enfatiza, “está ligado a fatores que tratam das formas de urbanização do Brasil” e têm, no Espírito Santo, a erradicação do café na década de 1960 e o consequente êxodo rural como um dos eventos marcantes na história.

Latussa concorda com a necessidade de haver uma intervenção do Estado para a correção dessas desigualdades. Na Constituição federal, essa responsabilidade é compartilhada por estados e municípios, havendo, para estes últimos, um grande instrumento de equalização que é o Plano Diretor Municipal (PDM).

“Há um ponto pacífico: as desigualdades da distribuição de renda estão plasmadas no ambiente urbano no Brasil”, afirma a diretora, para quem toda e qualquer política pública que reduza a desigualdade de renda e de acesso aos serviços públicos essenciais atua para reduzir o contingente de domicílios em aglomerados subnormais.

O desejo de regularização fundiária e de acesso aos serviços existe intensamente entre os moradores desses territórios, salienta Latussa, mas desde que essas melhorias não reduzam os laços comunitários que os caracterizam. “É comum o forte senso de comunidade e as sólidas redes sociais”, pontua.

Mais do que o dobro

No Censo de 2010 do IBGE, os domicílios em aglomerados subnormais era de 11%, bem abaixo dos 26,1% estimados para 2020. Apesar dos números apontarem que o percentual mais do que dobrou nos últimos dez anos, Latussa enfatiza que é preciso esclarecer quanto dessa diferença de percentuais reflete um crescimento real desse tipo de ocupação e quanto é fruto de metodologias diferentes aplicadas pelo IBGE. O primeiro dado é de um censo demográfico, ressalta, e o segundo, uma estimativa voltada a ajudar no planejamento do censo de 2020 – que será realizado em 2021 – e a subsidiar os estados e municípios na elaboração de políticas públicas voltadas à gestão da pandemia de Covid-19.

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