A Paróquia Santa Rita de Cássia, na Praia do Canto, em Vitória, divulgou nota na manhã desta terça-feira (25) em resposta a uma publicação “não verdadeira” feita no dia anterior pelo senador Marcos Do Val (Podemos). Ressalta que, ao contrário do que foi afirmado pelo parlamentar em suas redes sociais, o arcebispo da Arquidiocese de Vitória, Dom Frei Dario Campos, não proibiu a distribuição “do kit dos medicamentos para Covid-19” doados pelo senador.
Nessa segunda-feira (24), Marcos Do Val publicou uma foto de Dom Dario simulando uma capa de jornal com a manchete “Arcebispo de Vitória assina carta dos bispos contra governo Bolsonaro”, em uma clara oposição ao fato de o sacerdote ter sido um dos 152 bispos que assinaram a “Carta ao Povo de Deus“, com críticas ao Governo Bolsonaro, do qual o senador é aliado.
No post, Marcos Do Val acusa Dom Dario de politizar um “tratamento médico que salva vidas” e questiona “o que levou Dom Dario Campos, arcebispo de Vitória, a proibir a distribuição gratuita dos 2.000 kits de medicamentos que doei para tratamento precoce da Covid-19?”. O parlamentar questiona, ainda, “a troco de que o nosso arcebispo tomaria uma atitude dessas? Inclinações políticas devem interferir no tratamento médico de pacientes?”. E acrescenta: “Dom Dario está retirando o direito dos mais carentes ao tratamento indicado por profissionais de saúde capacitados”.
Entretanto, segundo a nota divulgada pela Paróquia Santa Rita de Cássia, o que aconteceu é que houve aglomeração de pessoas no ambulatório da igreja em busca dos remédios e a paróquia “decidiu por prudência encaminhar os medicamentos aos médicos, para melhor poderem fazer a distribuição segundo seus critérios profissionais”.
Apesar de a Paróquia não mencionar quais são os medicamentos, Marcos do Val divulgou em suas redes, nesse sábado (23), que doou 2.000 kits de hidroxicloroquina e azitromicina, que, de acordo com ele, estavam sendo entregues “mediante apresentação de receita, eletrônica ou física, a todos que não têm condições de comprar ou não encontram as referidas medicações nas farmácias para a compra”.
Projeto Igreja Samaritana
A Paróquia afirma, ainda, em comunicado feito no sábado, mesmo dia em que Marcos do Val divulgou a doação, que a partir da Campanha da Fraternidade 2020 foi implantado o “Projeto Igreja Samaritana”, com o objetivo de arrecadar cestas de alimentos e medicamentos, “auxiliando assim as pessoas carentes, especialmente no contexto da pandemia do novo coronavírus”.
Mas, informa, “não tem controle de quem são os doadores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas”, e destaca que nenhum medicamento é entregue sem prescrição médica e que “a intenção ou o modo como algum doador utiliza o seu gesto de doar, parte de sua responsabilidade em sua consciência”.
Segundo a Paróquia, até então foram doados 5 mil medicamentos. Quanto aos alimentos e outros itens, as doações possibilitaram a entrega de 1.367 cestas básicas, 2.870 marmitex, 100 unidades de fraldas geriátricas e 210 cobertores, beneficiando, por exemplo, a Pastoral do Povo de Rua.
Milhões em medicamentos
Em seis de julho, Marcos Do Val divulgou em suas redes sociais que destinou R$ 11 milhões para a compra de azitromicina, ivermectina e hidroxicloroquina para tratamento de Covid-19 no Espírito Santo. “Com esse valor, serão adquiridos 200 mil kits de cada medicamento para distribuição em todo o Estado”, diz a publicação, em que divulga também que R$ 1 milhão foi destinado para “pesquisa científica sobre o uso dos medicamentos na primeira fase da doença”.
A epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel, afirma que embora o parlamentar possa ter tentado contribuir para o combate à Covid-19, seria melhor que os R$ 11 milhões fossem destinados para pesquisas, e não para a compra dos medicamentos, uma vez que, segundo ela, sociedades científicas já comprovaram que os remédios doados pelo senador e nenhum outro medicamento têm eficácia no combate à Covid-19.
Ethel salienta que, na possibilidade de comprar medicamentos com dinheiro público, o melhor a ser feito seria investir naqueles que reduzem risco de gravidade, como os de hipertensão e diabetes, que podem minimizar os impactos da doença para quem tem comorbidades. “O Brasil é o único país que insiste em um medicamento que não tem comprovação científica. É imprudente que em pleno século XXI, quando se tem mais acesso à informação, inclusive às publicações científicas, os medicamentos tenham uso político”, ressalta.
Ela aponta, ainda, que afirmar que azitromicina, ivermectina e hidroxicloroquina têm eficácia para tratamento de Covid-9 faz com que as pessoas acreditem que estão protegidas, sendo que não estão, o que faz com que relaxem na prevenção, deixando de fazer isolamento social.
Fake news contra opositores do governo
O senador Marcos Do Val tem protagonizado casos de fake news contra pessoas que se opõem ao Governo Bolsonaro, como em 27 de abril, quando fez postagens difamatórias contra o ex-deputado federal Jean Wyllys, vinculando-o a Adélio Bispo, apontado como responsável pelo atentado a Bolsonaro durante as eleições presidenciais de 2018. Na postagem, o parlamentar anunciou que iria convocar Wyllys para prestar esclarecimentos.
Em seis de agosto, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ordenou ao senador que
retire do ar as postagens difamatórias. Segundo informou a coluna de Ancelmo Gois em
O Globo, a decisão da juíza Marcia Santos Capanema, do 5º Juizado Especial Cível, ordenou a retirada das postagens em até 48 horas. “Mais uma vitória contra caluniadores e difamadores: dessa vez contra um dos piores deles”, disparou Jean no Twitter. O ex-deputado entrou com ações judiciais no TJ-RJ contra uma série de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e seus filhos Carlos e Eduardo.
A informação divulgada por Do Val se baseava em um depoimento de Luciano de Sá, o Mergulhador, que teria escutado um elogio de Bispo a Wyllys durante uma conversa informal. “Jean Wyllys seria o mandante da tentativa de assassinato do presidente Jair Bolsonaro?”, insinua o subtítulo do post de Marcos Do Val. Na época, o ex-deputado, que renunciou ao mandato após ameaças e foi viver no exterior, anunciou que havia acionado os advogados para processar jornalistas e parlamentares que estavam difundindo as informações falsas.