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Empresas negam risco elevado de contaminações dentro do transporte coletivo

Estudo da associação nacional no setor utiliza metodologia falha, alerta epidemiologista Ethel Maciel

Ceturb-ES

A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) nega a associação entre o uso de transporte coletivo e o aumento de casos de Covid-19. A defesa tem como base a Análise da Evolução das Viagens de Passageiros por Ônibus e dos Casos Confirmados da Covid-19, cujos resultados foram divulgados nessa quarta-feira (16). 

O estudo considerou 15 sistemas, que atendem a 171 municípios, incluindo o Transcol, da região metropolitana capixaba, que são responsáveis pela realização de mais de 325 milhões de viagens de passageiros por mês, ou 13 milhões de deslocamentos diários de pessoas, correspondendo a 32,5% do total de viagens de passageiros realizadas em todos os 2.901 municípios atendidos por sistemas organizados de transporte público por ônibus. 


O levantamento foi feito durante 17 semanas epidemiológicas, da 14ª à 30ª, entre 29 de março e 25 de julho de 2020. A análise foi realizada comparando-se os casos confirmados de Covid-19 observados sete dias após a demanda transportada, considerando que, em caso de contaminação do passageiro durante a viagem, este seria o prazo médio entre a eventual infecção e a detecção da contaminação por testes.

Segundo a NTU, a análise não estabeleceu associação entre o número de passageiros transportados por ônibus e o aumento do número de casos. Em algumas cidades, inclusive, “o aumento da demanda por transporte coincidiu com a redução do número de casos confirmados, enquanto em outras a redução do número de passageiros do transporte coletivo aconteceu simultaneamente com o aumento da incidência de casos”, afirma a entidade, ressaltando Teresina, no estado nordestino do Piauí, onde mesmo com uma greve dos rodoviários e paralisação total da frota de ônibus, houve crescimento dos casos confirmados da doença no período e, na posterior normalização dos serviços, houve redução da incidência da Covid-19.

A pós-doutora em Epidemiologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel, no entanto, explica que a metodologia utilizada no estudo não permite concluir que o transporte coletivo está dissociado do aumento das contaminações pelo SARS-CoV-2 (novo coronavírus) nas capitais brasileiras. “Certamente, não é possível afirmar isso. Tem muitos vieses, que em epidemiologia chamamos de erros, que estão influenciando esse resultado”, afirma. 
A ausência de experimento é a principal falha da pesquisa. “Foi observacional, só descreveram os fatos” , destaca a especialista. “Teria que ter sido feito um experimento pra estabelecer uma relação de causalidade. É preciso muita cautela com essas afirmações provenientes de observações”, adverte.

Entre os experimentos necessários, estão a testagem em massa, o acompanhamento das pessoas, a avaliação sobre o tempo de permanência nos ônibus, as linhas utilizadas e a frequência de viagens. “Tudo isso é relevante para que a gente possa tirar uma conclusão. E essa metodologia de estudo não é capaz portanto de fazer relações causais pretendidas”.

Ao contrário, explica a epidemiologista, o estudo analisou apenas as pessoas que procuraram os serviços de saúde e, entre aquelas que procuraram os serviços, as que estavam no critério pra realização do exame. Isso é um número muito pequeno”

A pesquisa da NTU, com suas falhas, contraria os resultados alcançados com os inquéritos epidemiológicos realizados no Espírito Santo e diversos outros estados. No caso capixaba, os dados mostram claramente o maior percentual de exames positivos entre as pessoas que utilizam transporte público na região da Grande Vitória, havendo, entre elas, 40% de assintomáticos, ou seja, pessoas que estão contaminadas e transmitindo o vírus sem saber. “Se nós não tivéssemos feito esse inquérito, essas pessoas nunca saberiam que eram positivas. Então, só por essa avaliação, a gente pode dizer que esses resultados da NTU possuem vieses importantes que estão distorcendo esse resultado”, explana.

Em um ponto, no entanto, o discurso dos empresários se alinha com as recomendações científicas: as medidas de precaução que devem ser tomadas para reduzir os riscos de contaminação dentro dos ônibus urbanos. O presidente-executivo da NTU, Otávio Cunha, ressaltou que “se motoristas, cobradores e passageiros usarem máscara dentro do ônibus e nos pontos de parada, se as pessoas evitarem conversar e se os veículos trafegarem sempre com janelas abertas, o risco será baixo”. 
A Nota Técnica da entidade também afirma que é preciso realizar o controle de pessoas assintomáticas; a gestão da demanda pelos coletivos, com escalonamento das atividades laborais; a promoção de iniciativas de distanciamento social e higienização; além de campanhas informativas e de conscientização.
No Espírito Santo, estão em curso campanhas para uso de máscaras, inclusive com distribuição de um milhão de peças para os usuários do Transcol; e a utilização de sinais sonoros para alertar sobre aglomerações dentro dos terminais, onde foram instalados totens de álcool em gel e reforço de pias e saboneteiras. O escalonamento de atividades laborais, contudo, foi suspenso, os ônibus estão cada dia mais lotados e até mesmo o retorno dos coletivos com ar-condicionado chegou a ser acordado entre o governo do Estado e o Ministério Público Estadual. (MPES).

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