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Em 2020, pandemia escancarou déficit de moradia

Apesar do clamor ao isolamento, descaso com a população em situação de rua, moradias precárias e despejos seguiram sendo realidade

O primeiro lema nos momentos de início da pandemia do novo coronavírus no Brasil foi “fica em casa”. Porém, logo alguns questionaram: que casa? O reflexo da desigualdade social brasileira ficou escancarada. Muitos cidadãos sequer possuem residência e outras a compartilham com várias pessoas ou não possuem acesso às condições ideais de higiene e saneamento.

Por isso, a pandemia evidenciou os problemas estruturais nas cidades e explicitou que moradia digna também é questão de saúde pública. Um documentário realizado durante a pandemia explicitou as dificuldades enfrentadas nas periferias diante da necessidade de isolamento social.

Mas os movimentos sociais não viram muitos avanços no panorama da habitação em 2020. As políticas para a população em situação de rua só andaram após inúmeras denúncias e pressões a nível estadual e nos municípios por parte de movimentos e órgãos de justiça, e na maioria das vezes não incluíram o acesso à moradia e sim a permanência nas ruas com algum tipo de assistência. O que, sim, pode-se observar durante a pandemia, foi a realidade de pessoas que conseguiram sair da situação de rua devido ao recebimento do auxílio emergencial federal, investindo os recursos para alugar um local para morar. No entanto, o auxílio acaba junto com o ano de 2020 e, para alguns, voltará a incerteza sobre se no fim do mês haverá condição de arcar com o valor do aluguel.

Em Vila Velha, uma boa notícia é que depois de dois anos morando num edifício do Centro de Referência em Assistência Social (CRAS), 49 famílias receberam posse de terrenos no bairro Jabaeté, depois de serem despejadas das casas em que residiam em terreno ocupado. A conquista, porém, foi parcial, pois as famílias, dotadas de poucos recursos econômicos, não receberam residências de fato, mas apenas os terrenos para construí-las por conta própria.

Em Vitória, o Edifício Santa Cecília, no Parque Moscoso, abandonado por anos pela prefeitura, iniciou as obras para conversão em moradia popular com 35 apartamentos para famílias de baixa renda. Isso aconteceu após o prédio ser ocupado por famílias que lutam por moradia há anos, que saíram após decisão judicial obrigar a municipalidade a oferecer a elas algum destino, que no caso foi o aluguel social, renovado após manifestações durante a pandemia. Querem solução permanente de moradia.

Antes, essas e outras famílias ocuparam o antigo edifício do IAPI, na Praça Costa Pereira, pleno Centro de Vitória, que em 2018 foi destinado para reforma e adequação para moradias pelo programa Minha Casa Minha Vida. Mas as obras não andaram por falta de recursos federais e o local termina 2020 totalmente inabitável.

Além disso, em plena pandemia, houve a reintegração de posse por parte da Prefeitura Municipal de Vitória (PMV) da Casa Resistência Urbana, que servia de residência e espaço de encontros e reuniões de lideranças de movimentos de luta pela moradia. Outro local ocupado, a ocupação Moa do Katendê, realizou durante o ano uma campanha para reforma do espaço para dar melhores condições às famílias sem-teto que ocupam o local.

Aliás, a Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social (ATHIS) foi uma questão que ganhou espaço em 2020. O tema apareceu em alguns dos planos de governo dos candidatos à prefeitura capital, inclusive no do vencedor do pleito em Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos). Por meio das ATHIS, moradias populares podem ter apoio técnico para construção e reforma das habitações, considerando questões que melhorem as condições de vida, inclusive as sanitárias, por meio de maior ventilação e outros ajustes. O programa Saúde Habitacional, realizado nos bairros do Território do Bem, por meio das ONGs Ateliê de Ideias e Onze 8, são um exemplo na Capital, mas ainda faltam políticas públicas do tipo nos municípios capixabas.

Outro modelo de proposta para habitação popular foi o da WikiHouse, uma casa pré-moldada de baixo custo e materiais leves que pode ser implementada como alternativa a moradias precárias. Um projeto feito por um grupo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) conseguiu arrecadar fundos para implantar uma casa do tipo para um morador que teve sua residência condenada pela Defesa Civil. A expectativa é que a construção comece em janeiro de 2021.

Outro fato importante foi o início da Campanha Despejo Zero, que teve seu lançamento no Espírito Santo realizado em outubro, em defesa do fim dos despejos durante a pandemia e depois dela. O primeiro levantamento da campanha mostrou que no Estado ao menos 500 famílias se encontram ameaçadas de serem despejadas no campo e na cidade, na maioria das vezes sem que seja apresentada outra alternativa para sua moradia. 

O panorama indica que 2021 terá que ser também de muita luta.

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