Advogado da família da vítima questiona que decisão tenha apontado “entrega espontânea à Polícia” de Tiago Vianna (foto)
Quarenta dias depois de ter assassinado o professor de capoeira Cuarassy Pedro Medeiros Del Nery, 39 anos, em 18 de dezembro de 2020, na vila de Itaúnas, em Conceição das Barra, norte do Estado, Tiago Passos Viana ganhou a liberdade por decisão do juiz Diego Franco de Santanna, da comarca do município. Em ato assinado nessa terça-feira (26), o magistrado baseou a medida no excesso de prazo previsto para a conclusão do inquérito policial, acolhendo argumento formulado pela defesa de Tiago, além de não considerar o período de onze dias em que ele deixou de se apresentar a Polícia após a decisão judicial que determinou sua prisão.
Apesar de Tiago Passos Viana, conhecido como Aranha, ter confessado o crime, dando inclusive detalhes no dia de sua prisão, em 29 de dezembro, o juiz afirma que o “ordenamento Jurídico brasileiro prevê, no artigo 312 do CPP, que a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”.
Para o advogado Israel Jorio, que representa a família de Cuarassy, há dois aspectos a se considerar sobre a soltura. “Primeiro, se o fato investigado for classificado como homicídio qualificado, torna-se crime hediondo, e o prazo para a prisão cautelar, na modalidade temporária, passa a ser de 30 dias, prorrogável por mais 30”. Ele acrescenta: “E há espaço para essa consideração, na medida em que é possível que o suspeito, que foi armado ao local em que estava a vítima, a tenha, de modo intencional e premeditado, provocado com o específico fim de simular uma reação e uma falsa legítima defesa. Estaria presente a ‘dissimulação’ e o homicídio se tornaria qualificado”.
Sobre o segundo aspecto, o advogado questiona o fato de que o investigado “tenha espontaneamente se entregado, tendo em vista que foi amplamente difundida a informação de que havia mandado de prisão expedido em seu desfavor. Pode-se considerar que o investigado estava na verdade foragido há dias, e que após o cerco mantido pela polícia se estreitar muito, não viu alternativa senão permitir-se conduzir. Conforme essa segunda visão, subsiste o requisito da prisão preventiva que se refere à garantia da aplicação da lei penal”.
Israel Jorio comenta o excesso de prazo para a conclusão do inquérito e enfatiza que não se pode relacioná-lo “diretamente a nenhum delegado ou servidor envolvido no caso, pois bem sabemos em que condições os policiais civis de muitas comarcas do interior trabalham, acumulando funções. Mas isso não nos impede de reconhecer que o Estado tem que prover estrutura e deve ter uma atuação mais pronta e eficiente em casos graves assim, para evitar que esse tipo de situação aconteça”.
No entendimento do magistrado, porém, segundo o artigo 10 do Código de Processo Penal, com o acusado preso “em razão de prisão em flagrante ou preventiva, o prazo para término do inquérito é de dez dias a contar da data de prisão”. Ressalta que “se existem elementos para prender preventivamente (prova da existência de crime e indícios suficientes de autoria), deve haver, por certo, elementos suficientes para conclusão do IP [Inquérito Policial] e apresentação da denúncia”.
Ao relaxar a prisão preventiva, o juiz estabeleceu medidas cautelares. Deste modo, o réu Tiago Passos Viana terá que comparecer mensalmente, até o quinto dia útil, perante este juízo, para informar e justificar suas atividades; comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento; e não mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar o lugar onde será encontrado”.
O crime
Tiago Passos Viana disparou pelo menos três tiros na vítima. E, mesmo após o tiro fatal, teria prosseguido com disparos. Um vídeo gravado no local do crime contesta a versão de legítima defesa apresentada pelo assassino confesso à Polícia. As imagens mostram a vítima sendo alvo de provocações do criminoso, ao que respondia, repetidamente: “Vai embora, não quero te ver, você arruma confusão e fala que vai matar os outros”. Depois de iniciada uma briga, Tiago entra num estabelecimento e imediatamente os disparos são efetivados.
Apesar de ter confessado o crime à Polícia Civil e ainda ter se evadido do local e dispensado a arma, sua prisão só foi efetivada 11 dias depois, em Linhares. Esta ocorreu por determinação do delegado de Conceição da Barra, Alisson Pequeno, para que a equipe de investigadores seguisse para a cidade para dar cumprimento ao mandado de prisão n° 0001100-48.2020.8.08.0015, expedido um dia depois do crime pelo juiz Samuel Miranda Gonçalves Soares. As informações do setor de inteligência mostravam que o procurado estava no município.
A equipe seguiu para alguns endereços para dar cumprimento à ordem judicial, até que, durante os levantamentos no município, o advogado fez contato com um dos policiais da equipe, afirmando que seu cliente se apresentaria aos policiais. A prisão ocorreu na avenida Carlos Lindemberg, Centro de Linhares, onde se localiza o escritório do advogado. Tiago estava preso no presídio de São Mateus.