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Profissionais da saúde protocolam pedido de impeachment de Jair Bolsonaro

Epidemiologista e professora da Ufes, Ethel Maciel, assina o documento, que aponta crimes de responsabilidade

“Se você tomar vacina e virar jacaré, é um problema de você, pô”, “Não sou coveiro, tá?” e “E daí?” são algumas das frases ditas por Jair Bolsonaro (sem partido) no contexto da pandemia da Covid-19 e que abrem o documento de pedido de impeachment do presidente. Protocolado nessa sexta-feira (5) na Câmara dos Deputados, o pedido é de autoria de profissionais da saúde diretamente envolvidos em pesquisas de combate à pandemia, entre eles, a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel.

Outros nomes que constam na denúncia são os do ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão; e o sanitarista e fundador da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Gonzalo Vecina Neto. “O processo se concentra nas denúncias, nos crimes de responsabilidade. Elencamos as provas de tudo que aconteceu durante esse período, com o presidente atuando contra o controle da pandemia”, ressalta Ethel.

Os autores do pedido esclarecem que os crimes de responsabilidade denunciados limitam-se aos fatos ocorridos entre 24 de março de 2020 e o último dia 20 de janeiro. “Esta denúncia não abrange, portanto, seus crimes de responsabilidade cometidos após esta data, nem seus crimes de responsabilidade anteriores a esta data que não sejam relacionados à pandemia de Covid-19”, explicam.
Crimes de responsabilidade, conforme consta no pedido de impeachment, “são atos do presidente da República que, de tão graves, ameaçam a integridade da Constituição e a sobrevivência das instituições democráticas. Constituem infrações políticas que, nos termos do artigo 85 da Constituição de 1988, autorizam, mediante concordância de dois terços da Câmara dos Deputados e condenação por igual fração do Senado Federal, a interrupção do mandato do Presidente que os praticou”.
No documento é destacado que Jair Bolsonaro “abusou dos poderes constitucionais e políticos inerentes a seu cargo para, em prejuízo da saúde da população brasileira, obter vantagens políticas para si em meio à pandemia de Covid-19. Com isso, prejudicou de maneira patente a saúde dos brasileiros, minou relações federativas indispensáveis em uma emergência sanitária e achincalhou de modo indelével a dignidade e a honra do cargo de presidente da República, por sua reiterada quebra de decoro”.
Entre as atitudes do presidente elencadas na denúncia está o fato de que, em virtude de sua orientação, o Ministério da Saúde deixou de tomar ações necessárias em prol da população brasileira, que seriam dirigidas por consensos epidemiológicos e científicos. Isso aconteceu, segundo o documento, para atender aos interesses políticos pessoais de Jair Bolsonaro, que, inclusive, “usou da autoridade, prestígio e visibilidade inerentes à Presidência da República para disseminar desinformação, exortar o descumprimento de medidas sanitárias e disseminar a ilusão de ‘tratamentos precoces’, levando seu povo a arriscar sua saúde diante de um vírus letal”.
Também é destacado que o presidente negou a gravidade da pandemia de Covid-19 e aderiu a um negacionismo científico “incompatível com a respeitável tradição sanitarista do Brasil”. Essas condutas foram “intencionais e calculadas para seu benefício político pessoal, e prejuízo de seus adversários políticos, tendo como vítima colateral a saúde do povo brasileiro”, afirma o pedido. Assim, conforme apontam os profissionais da saúde, o presidente atentou contra o direito fundamental à vida e à saúde pública e individual, além de ter atuado contra a probidade administrativa, ao agir de forma incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo que exerce, ferindo, portanto, a Constituição.
Outros prejuízos causados pelas ações de Bolsonaro, relatados no documento, são em relação à reputação sanitária e política do país, além dos interesses humanos e econômicos do povo brasileiro. “Os esforços de outras instituições, notadamente o Congresso Nacional, o Poder Judiciário e os Executivos estaduais e municipais, têm sido incapazes de suprir a ausência de liderança política e epidemiológica que o governo federal deveria assumir, bem como de coibir os crimes de responsabilidade que reiteradamente foram praticados pelo Sr. Jair Messias Bolsonaro”.
No que diz respeito à reputação sanitária do país, os autores da denúncia recordam que o Brasil é berço de sanitaristas mundialmente renomados, como Oswaldo Cruz e Adolpho Lutz, sendo exemplo de execução de políticas de saúde pública. Entretanto, com a atuação de Bolsonaro, que chega “ao cúmulo de promover descrença em vacinas para nosso povo que, de boa-fé, acredita na palavra do presidente da República, o Brasil tem se destacado negativamente no combate à pandemia”.
Manaus: auge da violação do direito à saúde
A situação da pandemia em Manaus, no Amazonas, foi classificada no documento como o auge da violação do direito à saúde, “com cenas tão desoladoras quanto revoltantes para nós, brasileiros”. É destacado que, apesar de o governo federal ter sido alertado do que estava acontecendo, a população ficou sem oxigênio nos hospitais. Diante dessa realidade, os autores da denúncia recordam que às vésperas do esgotamento de oxigênio os voos da Força Aérea Brasileira (FAB) que abasteciam a cidade com cilindros deixaram de acontecer, causando o colapso.
Recordam, ainda, que enquanto doentes “asfixiavam em agonia nos hospitais manauras e em suas casas, o Sr. Jair Messias Bolsonaro usou seu perfil em rede social para propagar o sabidamente enganoso ‘tratamento precoce’, que além de ser incapaz de enfrentar o problema da falta de oxigênio, ainda ilude seus seguidores de boa-fé e arrisca o aumento de contágios e o colapso hospitalar”.
Disseminação ilusória do tratamento precoce
No documento salienta-se ainda que, entre as maiores práticas de desinformação do presidente, está a do tratamento precoce contra a Covid-19, “cuja ineficácia é a cada dia reafirmada por profissionais da área médica e científica em todo o mundo, sendo esse um dos pilares das crises que teve com Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, ministros da Saúde anteriores ao atual, Eduardo Pazuello.
O pedido de impeachment recorda que, em maio, um dia antes de Teich pedir exoneração, o presidente afirmou em coletiva de imprensa que iria determinar que o Ministério da Saúde mudasse o protocolo para uso da cloroquina. “Baseado em literatura isolada e cientificamente questionável, ignorando alertas dos cientistas e a cautela demonstrada por outras tantas nações, e passando por cima da estrutura técnica do SUS, o Ministério da Saúde (que a essa altura já estava sem ministro, ante a demissão do Sr. Nelson Teich), publicou as Orientações do Ministério da Saúde para manuseio medicamentoso precoce de pacientes com diagnóstico da Covid-19”, reforça o documento. 

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