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Sem sinal da Renova, universidades preparam saída de monitoramento ambiental

Prazo dado pela Justiça para que a Renova mantenha contrato e garanta continuidade do trabalho vence dia 28

Leonardo Sá

Vence em duas semanas, no próximo dia 28, o prazo de quatro meses estabelecido pela Justiça Federal para que a Fundação Renova mantenha o acordo de cooperação técnica com a Fundação Espírito-Santense de Tecnologia, da Universidade Federal do Espírito Santo (Fest/Ufes), referente à execução do Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática (PMBA) pela Rede Rio Doce Mar (RRDM), composta por 27 universidades e outras instituições de pesquisa públicas.

Sem resposta sobre a proposta feita pela RRDM de manter o contrato até o final da próxima estação seca (outubro/novembro de 2021), para que a transição para um futuro novo executor seja mais segura, a Rede e a Fest/Ufes preparam a desmobilização das equipes, que somam cerca de 500 pesquisadores, muitos dos mais renomados do país, além de equipamentos, imóveis e contratos com fornecedores de diversos serviços.

“Nós estamos preparados para qualquer decisão. Se o juiz acatar os argumentos da Renova e encerrar no final de fevereiro, estamos prontos pra desmobilizar e encerrar o projeto. Se a Justiça entender que deve continuar até o final do ano, estamos prontos”, afirma Eustáquio de Castro, professor do Departamento de Química da Ufes, onde coordena o LabPetro e dirige o Centro de Ciências Exatas (CCE), e um dos membros da coordenação-geral da RRDM.

Pouco antes, a Câmara Técnica de Biodiversidade (CTBio) também já havia se manifestado contrariamente à rescisão, devido à qualidade dos trabalhos prestados pela Rede de universidades, e pela independência técnica e política que as instituições sustentam.
O segundo relatório anual, por exemplo, apresentado dias antes do anúncio da decisão de rescisão, havia iniciado o estabelecimento de nexo causal entre o rompimento da Barragem de Fundão, em novembro de 2015, e os impactos verificados na biodiversidade aquática do território monitorado: toda a calha capixaba do Rio Doce, bem como o litoral compreendido entre o Parque Nacional de Abrolhos, no sul da Bahia, e o norte do Rio de Janeiro, incluindo o estuário do Rio Doce e toda a costa do Espírito Santo.
Instância máxima da governança das ações de reparação e compensação dos danos advindos do crime da Samarco/Vale-BHP contra a bacia hidrográfica do Rio Doce, o CIF, bem como sua câmara técnica específica para o assunto do contrato, a CTBio, entenderam que é preciso manter o trabalho que vem sendo realizado desde 2018 pela RRDM, que utiliza, inclusive, dados pretéritos ao crime, pois muitos pesquisadores contratados pela Fest/Ufes já vinham realizando estudos e coletas na região, por meio de seus projetos rotineiros de pesquisa.
Igualmente conscientes disso, os gestores da RRDM advertem que, se a Renova decidir contratar um novo executor de forma abrupta, pode ter problemas com os contratos. “Eu lido com contratos com Petrobras, Vale, empresas internacionais. Há contratos negociados por até dois anos! Nós estamos colocando à disposição da Renova a nossa competência e o nosso tempo. Não é por ela, mas por todo o sistema CIF, os atingidos e a sociedade”, expõe o professor Eustáquio.

O coordenador geral da Rede ressalta que, mesmo diante da vasta experiência sua e de outros pesquisadores com projetos e empresas grandes, o trabalho da RRDM para a execução do PMBA chama atenção pela magnitude e complexidade.

“Tivemos que montar um modelo específico de gestão para ter sucesso na empreitada”, conta. O escopo do projeto, destaca, é muito grande, envolvendo várias áreas de conhecimento – Oceanografia, Química, Engenharias, Biologia, Direito. Há também o escritório de projetos, que cuida da gestão, da parte financeira, da prestação de contas, contratação de pessoal, compras e aquisições, importações de equipamentos e presta relatórios de gestão mensais e trimestrais. E o setor de relações interinstitucionais, onde a RRDM conversa com reitores e representantes das universidades e com gestores de governos, órgãos ambientais e a própria Renova.

“Disponibilizamos nossa inteligência, nossa vontade, nossa capacidade de trabalho, nossa infraestrutura. Não só a Ufes, mas todas as 27 instituições”, afirma Eustáquio, citando as principais universidades do país, como as federais do Rio de Janeiro (UFRJ), Minas Gerais (UFMG), Viçosa (UFV), Ouro Preto (UFOP), além da Universidade de São Paulo (USP).

A rescisão pela Renova, conta Eustáquio, “trouxe complicações na gestão do projeto, além da insegurança nas pessoas – pais, mães de família, assalariados, que podem ser demitidos de uma hora pra outra”. Havia contratos, descreve o coordenador, com empresas de veículos, de barcos, de saúde e outros. “Tivemos que começar um processo de rescisão e, de repente, continuar por mais quatro meses. Tecnicamente, isso dificulta a operação. Mas, apesar dos tumultos, vamos fazer as entregas [dos relatórios e banco de dados]. Absorvemos os impactos”, diz.
O que move as equipes, ressalta, é o interesse público. “A gente está aqui para atender aos interesses da sociedade, ao interesse público. Não somos empresa, não visamos lucro. Foi demandado pra gente, a universidade atendeu a esse chamado e fizemos da melhor forma, não tivemos um relatório reprovado até hoje. E agora estamos nos oferecendo para fazer essa transição. Nós não brigamos pelo contrato. Temos muitas outras demandas da sociedade pra atender”, expõe. “Temos pesquisadores e instituições de renome aqui. A Renova vai acabar e nós vamos continuar”, pondera.

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