Medida busca reverter danos atrelados à plataforma de indenização da Renova, como valores baixos e quitação geral
O Ministério Público Federal (MPF) interpôs recurso diante de decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que indeferiu pedido liminar para impedir prejuízos aos atingidos do município de Baixo Guandu, noroeste do Estado, pelo rompimento da barragem de Fundão, em novembro de 2015, o maior crime ambiental do país, provocado pelas mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton.
O recurso acontece no âmbito de uma ação impetrada no TRF-1 que denuncia uma pseudo comissão de atingidos de Baixo Guandu que vem, desde fevereiro de 2020, atuando de forma irregular junto ao juiz substituto da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte/MG, Mário de Paula Franco Junior, favorecendo a abertura de um caminho danoso para o conjunto dos atingidos pelo crime.
A atuação da comissão apócrifa e do juiz confrontam diretamente as determinações do Termo de Ajustamento de Conduta da Governança (TAC-Gov) homologado pelo mesmo Mário de Paula, há três anos, de forma a estabelecer o protagonismo dos atingidos no processo de reparação e compensação pelos danos advindos do rompimento da barragem.
Na ação, o MPF pede que o TRF-1 declare a nulidade de todos os atos processuais praticados nos autos (1016742-66.2020.4.01.3800) pelo juiz substituto, preservando, porém, a continuidade do pagamento de indenizações aos atingidos do município de Baixo Guandu, poupando ainda mais danos às pessoas que foram equivocadamente induzidas a aceitar as ações conduzidas pela comissão e pelo citado juízo.
Ainda em outubro de 2020, o MPF peticionou ao juízo da 12ª Vara – juntamente com os ministérios públicos estaduais do Espírito Santo e Minas Gerais (MPES e MPMG) e com as Defensorias Públicas da União e dos dois estados (DPU, DPES e DPMG) – que as indenizações por ele aprovadas para pagamento aos atingidos dos municípios de Baixo Guandu e em Naque/MG (cidade onde uma comissão apócrifa semelhante também atua) sejam estendidas para todos os atingidos da Bacia do Rio Doce nos dois estados, na condição de adiantamento do valor total das indenizações a serem pagas no futuro, e sem a condição de quitação geral de direitos.
Doze irregularidades
A primeira sentença do TRF, emitida em fevereiro deste ano, foi contrária ao órgão ministerial, que agora recorre da decisão. No recurso, o MPF volta a reafirmar a nulidade de atos processuais das decisões da primeira instância, referendadas pelo Tribunal, apontando doze razões para a reforma das decisões.
Entre os questionamentos estão: a exclusão do MPF das ações para atuar em defesa dos atingidos; o sigilo ilegal; a legitimidade e a representatividade de supostas comissões que atuam em defesa dos atingidos; o valor indenizatório pactuado; o condicionamento da liquidação do dano por meio de plataforma online; a obrigação de outorga de poderes a advogado; e a limitação temporal, até 31 de outubro de 2020, para os atingidos demonstrarem o direito à indenização à Fundação Renova.
A reconsideração das decisões solicitadas pelo MPF visa preservar direitos dos atingidos nos municípios, considerando que, no termo de compromisso assinado tanto pela Fundação Renova quanto pelas empresas poluidoras, foi assumida a obrigação de reparar integralmente os danos resultantes do rompimento da barragem de Fundão, não havendo perecimento quanto aos direitos e pretensões das pessoas atingidas.
Valor das indenizações
No que se refere ao valor indenizatório pactuado, a despeito de buscar-se celeridade e economicidade processual, para o MPF houve a fixação de valores aleatórios e injustificados, sem qualquer fundamento técnico, em detrimento da necessidade da elaboração de diagnósticos socioambiental e socioeconômico, a fim de mapear e avaliar os diferentes danos decorrentes do desastre.
“Portanto, ainda que se considere R$ 70 mil como suficientes para a compensação dos danos causados a uma família, esse valor não possui nenhuma justificativa técnica. Não cabe a um membro do MPF, nem do Judiciário, considerar um valor como suficiente quando levam em conta um parâmetro que advém do livre pensamento desses atores, e não de critérios técnicos”, pondera o procurador regional da República Felício Pontes Jr.
Prejuízos aos atingidos
Sobre a plataforma online para pagamento das indenizações, o MPF volta a reafirmar os prejuízos aos atingidos: o condicionamento da liquidação do dano por meio da plataforma; obrigação de outorga de poderes a advogado; a limitação temporal (até 31.10.2020) para os atingidos demonstrarem o direito à indenização junto à Fundação Renova.
Na petição ao TRF1, o órgão ministerial também manifesta-se de forma contrária às decisões que impuseram assinatura de termo de desistência/renúncia de eventuais pretensões indenizatórias formuladas em ações ajuizadas em países estrangeiros em consequência ao rompimento da barragem de Fundão.
Por fim, também questiona a delimitação de documentos hábeis à comprovação da titularidade ao direito, exigindo que os atingidos tenham documentação de cinco anos anteriores ao fato da tragédia da barragem do Fundão. É contestada ainda a falta de parâmetro técnico para definir os atingidos que fariam jus à indenização. Para o Ministério Público, a relação de vínculo e dependência com o Rio Doce deveria decorrer de estudo técnico específico.