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Governo lança ferramenta SOS Marias para mulheres vítimas de violência

Aplicativo 190 ES foi apresentado no Palácio Anchieta. Fórum de Mulheres reclama de falta de diálogo e possíveis limitações

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) lançou, nesta segunda-feira (8), Dia Internacional da Mulher, o SOS Marias, ferramenta disponibilizada no aplicativo 190 ES, que possibilitará às mulheres em situação de violência doméstica e familiar acionar a Polícia Militar (PM) sem a necessidade de atendimento pelo call center do Centro Integrado Operacional de Defesa Social (Ciodes). A integrante do Fórum de Mulheres do Espírito Santo (Fomes), Edna Martins, ressalta que todo instrumento de enfrentamento à violência é fundamental, mas é preciso democratizar o debate sobre as medidas.

Ao acionar o botão SOS Marias, os campos relativos à localização da solicitante, como município, bairro, logradouro e número do logradouro, serão preenchidos automaticamente através da localização do aparelho celular por GPS. Posteriormente, a vítima deve clicar no botão de solicitação da viatura, sendo gerada uma ocorrência diretamente para a tela do computador Despachador de Recursos Operacionais da Polícia Militar, que atua dentro do Ciodes.

Com isso, automaticamente, o oficial responsável pelo envio da radiopatrulha fica ciente de que se trata de uma ocorrência de violência doméstica e providencia o despacho do recurso mais próximo, no menor tempo possível. O aplicativo permite ainda que o solicitante preencha, desde que tenha condições de digitar, o campo “demais informações”, possibilitando que a equipe policial tome conhecimento de fatos e características que possam auxiliar no atendimento da ocorrência.


Durante o lançamento do SOS Marias, no Palácio Anchieta, a gerente de Proteção à Mulher da Sesp, Michele Meira Costa, explicou que a novidade não é restrita às mulheres, uma vez que homens, como vizinhos e filhos das vítimas, também podem acionar a polícia para socorrê-las. Disse, ainda, que não é necessário ter medida protetiva para pedir o socorro e que a Carteira de Identidade (RG) cadastrada tem que ser do Espírito Santo. “Caso o RG seja capixaba, haverá validação no banco de dados. Com isso, tentamos evitar a questão do trote”, afirma.

Michele Meira Costa apresentou o aplicativo. Foto: Secom

Edna Martins questiona o que ela acredita ser uma limitação,  pois o Espírito Santo é povoado também por pessoas de outros estados, principalmente Bahia e Minas Gerais. “É algo restritivo. Se tivessem feito um debate para a elaboração, o processo coletivo de discussão poderia ter colaborado para evitar esse problema”, aponta.

A iniciativa se torna inacessível para muitas vítimas de violência também, segundo Edna, pelo fato de funcionar dentro do aplicativo 190, já que seria importante um aplicativo autônomo, pois da forma como está sendo operacionalizada a ferramenta, muitas mulheres que têm dificuldade com tecnologia não conseguirão recorrer a ela.

Estiveram presentes no lançamento do SOS Marias o o governador Renato Casagrande (PSB); a vice-governadora Jaqueline Moraes (PSB); o secretário estadual de Segurança Pública (Sesp), Alexandre Ramalho; o delegado-geral da Polícia Civil, Darcy Arruda; e a deputada estadual Raquel Lessa (Pros).

Cultura de Violência
O governador afirmou que o Espírito Santo tem um percurso longo a percorrer no que diz respeito ao combate à violência contra a mulher. “O capixaba tem enraizada uma cultura de violência, de justiça com as próprias mãos, um machismo intenso que dever ser enfrentado por meio da educação, mas também da punição”, disse. Para ele, existe, ainda, uma “violência gratuita, desnecessária, que pode e deve ser evitada com a mudança da cultura”. E acrescenta: “não é fácil mudar, pois se fosse fácil, já teríamos mudado”.
Foto: Secom

Ele chamou atenção para o fato de que, na pandemia, as mulheres estão sofrendo mais do que os homens e de que o “politicamente correto”, o “aprendizado de respeito às pessoas”, está sendo deixado de lado, fazendo com que muitas pessoas costumeiramente humilhem as mulheres.

Alexandre Ramalho destacou que o SOS Marias está a serviço da redução nos dados de violência contra a mulher, “que nos assustam e envergonham diante de uma sociedade machista que insiste em oprimir as mulheres por questões que poderiam ser resolvidas por meio do diálogo”.

O delegado geral da Polícia Civil, José Darcy Arruda, apresentou números de 2020 no que diz respeito à violência contra a mulher. De acordo com ele, desde primeiro de janeiro, foram realizados 397 autos de prisão em flagrante; 1,1 mil inquéritos policiais, 1,8 mil medidas protetivas, 33 mandados de busca e apreensão, 88 mandados de prisão preventiva e 481 pessoas foram presas.

A vice-governadora defendeu que o SOS Marias é uma ferramenta “que trata das mulheres silenciadas”. “Quando a violência sangra nas páginas dos jornais e na tela da TV, ela já está acontecendo no seio da família”, disse.

‘Linguagens reforçam o sistema patriarcal’

Alexandre Ramalho encerrou sua fala com a letra da música “Esse cara sou eu”, de Roberto Carlos. O trecho lido pelo secretário diz: “o cara que pega você pelo braço, esbarra em quem for que interrompa seus passos, está do seu lado pro que der e vier, o herói esperado por toda mulher”. Edna Martins questiona, destacando que a linguagem reforça o sistema patriarcal. “Nada contra a música, a concepção poética, mas nenhum homem pode pegar a mulher pelo braço, isso é sentimento de posse. O tempo de dizer que as mulheres precisam de herói já passou. Em pleno século XXI, depois de avanços da luta das mulheres para efetivação de políticas públicas, é péssimo ter gestores que reverberam essas concepções”, desabafa.
Foto: Secom

Já Arruda afirmou que, em uma relação a dois, é preciso haver comunicação, compreensão e concessão. “Se não houver verbalização clara entre o casal, não é possível. Se não houver compreensão sobre as características e naturezas de cada um, não é possível. Se não houver concessão, o relacionamento fica muito rígido”, defendeu. Ele também mencionou o texto bíblico do milagre das bodas de Caná, no qual é narrada a história de que, em uma festa de casamento, Jesus transformou água em vinho, pois essa bebida tinha acabado.

Foto: Secom

O delegado-geral afirmou que “vinho significa alegria, se tivermos Jesus, se tivermos orientação de Deus em nosso casamento, certamente as coisas serão diferentes”. E acrescentou: “sempre falamos isso, proclamamos isso. Esperamos que as pessoas sejam mais conscientes da importância da mulher, de ter a companhia ao seu lado, de tratar com carinho, de tratar com amor”, defendeu. Para Edna, o delegado-geral desrespeitou o princípio constitucional da laicidade do Estado. “O princípio da política pública é de que ela deve ser laica. Ele colocou o olhar religioso dele em relação à política pública”, disse.

Participação na política

A deputada estadual Raquel Lessa destacou que a luta contra a violência à mulher deve ser constante e apontou o enfraquecimento da participação feminina na política capixaba, ao recordar que na última legislatura havia cinco deputadas na Assembleia Legislativa e, na atual, apenas três. Lembrou também que existe somente uma prefeita em todo o Estado, que é na cidade de São Domingos do Norte.


Atos denunciam violência contra a mulher
Ato no Centro. Foto: Divulgação

Dois atos realizados nessa segunda-feira (8) pela organização do Oito de Março no Espírito Santo denunciaram os elevados índices de violência contra a mulher no Estado. Em Vitória, as mulheres se concentraram, à tarde, na Casa Porto, no Centro. De lá, caminharam até a Sesp e depois se dirigiram ao Palácio Anchieta. Em Cariacica, às 5h, o Fórum de Mulheres de Cariacica fincou cerca de 40 cruzes nas proximidades da Segunda Ponte, para denunciar a violência contra a mulher, a situação das mulheres em meio à crise sanitária e “as cruzes que elas carregam em seu cotidiano”. Em ambos os atos, as manifestantes reivindicaram também “Fora Bolsonaro! Fora, Mourão!”, vacina para todos e manutenção do Auxílio Emergencial.

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