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Novos tempos, nova regras

Família moderna trabalha unida, todo mundo de home office: onde o tempo não conta nem acaba

O texto deve ser enviado antes das dez, ou o money não será depositado na conta. Na outra ponta da mesa, o filho 01 tem que criar e imprimir 100 cartões de visita até às 11, quando a freguesa vem buscar. Ou não aceita mais. Esparramado no sofá e grudado no laptop, o filho 02 tem que completar o registro, ou a empresa cancela o contrato. Grudado no fogão, o marido frita os pastéis para a festa de aniversário do vizinho do quinto andar. Se os convidados saírem antes, o dono da festa come sozinho e não paga.

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Família moderna trabalha unida, todo mundo de home office, onde o tempo não conta e não acaba. Todos comendo na frente da tela, de copo na mão. Ou vice-versa. Põe a televisão por trás do monitor – um olho no Excel e o outro no seriado. A casa tinha 4 laptops, agora precisa de 8 – 01 para o trabalho, onde o empregador controla as entradas; 02 para assuntos pessoais: entre uma demanda e outra sempre se dá um jeitinho. Novos tempos, novas regras: uma hora de almoço, duas idas ao xixisódromo, 15 minutos de lanche. Bônus: atender dois telefonemas particulares.

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Mesmo com tantas restrições e controle remoto, o empregador não paga nem fornece: conta de luz e água, água, cafezinho, copo descartável, papel higiênico, detergente, sabonete, faxineira, saco de lixo, papel, fita adesiva, caneta, lápis, clips, cola, tinta da impressora. Enfim, se o lar doce lar agora virou escritório, tudo isso é responsabilidade do empregador, como ocorre no trabalho in loco. Imagina-se a economia que a empresa está fazendo se ninguém mais é presencial.

E o salário, oh!

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Agora existe um programa monitorando o tempo em frente da tela: um ZOOM invertido, que permite ao empregador me ver o tempo todo. O patrão ou patroa, gerente ou lá quem seja, também no conforto de sua sala de estar, vigia meus passos como se eu fosse um político delatado, usando tornozeleira eletrônica para monitorar meus passos. Ir e vir já não é um direito de todos, garantido pela Carta Magna. Ei, você, é a quinta vez que some da tela. Fui ao banheiro. Cinco vezes? Só tem direito a duas. Tempo descontado. É isso, nem piriri a gente pode ter mais.

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Com a volta ao velho normal se aproximando – dizem os crédulos – já não sabemos como nos adaptar ao velho cubículo, onde não podemos ficar de pijama e temos que pentear o cabelo. Admirável mundo novo: a cada meia hora o pelotão de patrulhamento da empresa pede autorização para ‘entrar’ na sua tela. Pedir é modo de dizer, porque de qualquer maneira você está encrencado: se não autorizar, será despedido; se autorizar, será despedido: aquelas fotos da Musa do Confinamento em sumaríssimo bikini pegaram mal.

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