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‘Projeto legaliza o fura-fila e prejudica Programa Nacional de Imunização’

Contarato é contra proposta aprovada na Câmara que possibilita a compra de vacinas contra a Covid-19 por empresas

O Senado recebeu, nessa quinta-feira (8), o Projeto de Lei 948/2021, que possibilita a compra de vacinas contra a Covid-19 por empresas privadas para que apliquem em seus funcionários, desde que a mesma quantidade adquirida seja doada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo o senador Fabiano Contarato (Rede), seu posicionamento diante da proposta é contrário, uma vez que, “a imunização de todos deve ser feita conforme os critérios de prioridade definidos pelas autoridades de saúde, e não de acordo com a capacidade aquisitiva”.

Contarato ressalta que “nenhum país do mundo autoriza a compra de vacinas por empresas, nem mesmo os laboratórios negociam com entes privados, justamente em função da grande demanda e escassez de oferta”. O senador acredita, ainda, que, na prática, o projeto “legaliza o fura-fila e prejudica o Programa Nacional de Imunização”.

Os demais senadores da bancada capixaba, Marcos do Val (Podemos) e Rose de Freitas (MDB), também foram procurados por Século Diário, mas até o fechamento desta matéria não se posicionaram sobre o assunto. 

O projeto, do deputado Hildo Rocha (MDB-MA), prevê que, além dos empregados das empresas, podem ser vacinados trabalhadores que prestem serviços a elas, inclusive estagiários, autônomos e empregados de empresas de trabalho temporário ou de terceirizadas. A aquisição das vacinas poderá ser feita pelas pessoas jurídicas de direito privado, individualmente ou em consórcio. Quanto às pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, como associações ou sindicatos, a permissão vale para seus associados ou cooperados.
Assim como o senador Fabiano Contarato, a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel, acredita que o projeto de lei é uma forma de “furar a fila”. De acordo com ela, a ordem de prioridade estabelecida para as imunizações tem sentido, pois imuniza primeiramente quem está mais suscetível à doença, como idosos e pessoas com comorbidades, além de minimizar os impactos da pandemia nos serviços de saúde.
A epidemiologista também destaca que a iniciativa é inconstitucional, uma vez que a saúde é um direito de todos. Além disso, afirma, as fabricantes já disseram que venderão as vacinas somente para os governos. “É desastroso ter um presidente e um Congresso que conduzem de forma medíocre a maior crise sanitária de todos os tempos. Esse tipo de proposta não está sendo debatida em nenhum lugar do mundo, nem nos países mais liberais. O governo tem que comprar e colocar à disposição”, defende.

Na votação na Câmara dos Deputados, em meio à bancada capixaba, a proposta teve posicionamento contrário somente dos deputados Helder Salomão (PT) e Ted Conti (PSB). Já Felipe Rigoni (PSB), Soraya Manato (PSL), Norma Ayub (DEM), Neucimar Fraga (PSD), Da Vitória (Cidadania), Amaro Neto (Republicanos), Lauriete (PSC) e Evair de Melo (PP) votaram a favor. 

Autorização

Além de poder comprar vacinas contra a Covid-19 que tenham registro sanitário definitivo concedido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), as empresas e associações poderão adquirir aquelas com autorização temporária para uso emergencial ou autorização excepcional e temporária para importação e distribuição.

Podem ser compradas também vacinas sem registro ou autorização da Anvisa, contanto que tenham esse aval de qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Será permitido ainda contratar estabelecimentos de saúde que tenham autorização para importar vacinas.

A Anvisa já aprovou cinco vacinas, sendo duas para uso emergencial (Janssen e Coronavac) e as demais já com registro definitivo (AstraZeneca e Pfizer). A AstraZeneca é contada duas vezes, pois considera as doses importadas da Índia e aquelas produzidas no País. Entre as vacinas previstas no cronograma do Ministério da Saúde, duas ainda não têm autorização para uso no Brasil: Covaxin (Índia) e Sputnik V (Rússia).

Multa

A empresa ou entidade que descumprir as regras estará sujeita à multa equivalente a dez vezes o valor gasto na aquisição das vacinas, sem prejuízo das sanções administrativas e penais. Já a aplicação da vacina deverá ocorrer em qualquer estabelecimento ou serviço de saúde que possua sala para aplicação de injetáveis autorizada pelo serviço local de vigilância sanitária.
Resistência no Senado
Aprovado na Câmara por 317 votos a favor e 120 contrários, ainda não há data prevista para a votação no Senado e o PL encontra resistência. O líder do MDB, Eduardo Braga (AM), avalia que o projeto pode estimular um “vale tudo na corrida pela vacina”.
“A iniciativa privada deve, sim, se somar aos esforços para a aquisição de vacinas. Mas o objetivo tem que ser o fortalecimento do Programa Nacional de Imunização, até que todos que fazem parte dos grupos prioritários sejam vacinados. Não dá para furar fila ou instituir um ‘vale tudo’ na corrida pela vacina, onde quem sai ganhando é quem tem dinheiro. O projeto apresentado pelo nosso presidente, senador Rodrigo Pacheco [DEM-MG], foi bem claro nesse sentido. Já foi aprovado e já virou lei. Vamos cumpri-la”, escreveu Braga no Twitter.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH), senador Humberto Costa (PT-PE), classifica o PL 948/2021 como “um projeto equivocado e excludente”. Médico e ex-ministro da Saúde, Costa afirma que o texto aprovado pelos deputados “prevê vacinação para quem tem dinheiro”.
“É algo inaceitável, é a institucionalização de um apartheid social. Num país onde morrem milhares de pessoas por Covid todos os dias, a Câmara tomou uma decisão extremamente grave, equivocada e excludente. O critério principal para vacinação no país passa a ser o da capacidade financeira de cada um. Quem pode pagar, se vacina. Quem não pode pagar, vai esperar o calendário do SUS. Vamos lutar no Senado para derrotar essa medida abominável”, afirmou o senador.
Anvisa e Fiocruz são contra
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) são contra o projeto que permite compras de vacinas por empresas. Durante reunião da Comissão Temporária da Covid-19 (CTCovid-19), a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, defendeu o respeito às prioridades definidas pelo Ministério da Saúde para a campanha de vacinação. A opinião é compartilhada pelo diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres. Ele chamou a atenção para a escassez de oferta de vacinas no mundo.
“A oferta das vacinas hoje é extremamente reduzida, e o SUS é um grande comprador e um grande vacinador. Então, se o SUS compra, se o SUS vacina, haveria realmente a necessidade ou haveria um advento positivo de que outros atores que não o SUS assim o fizessem? Diante de uma oferta ampla, eu penso que até haveria algo positivo, mas a oferta é tudo menos ampla: é uma oferta restrita, é uma oferta de monta restrita”, afirmou.

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