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O que são ATHIS e como elas melhoram a qualidade de vida nas favelas

Por meio de associação, arquitetos capixabas têm promovido mudanças estruturais em habitações de interesse social

Criada em 2017, a associação Onze8 já realizou reformas que mudaram a realidade de quatro residências nos bairros do Jaburu e São Benedito, que fazem parte do Território do Bem, em Vitória. Parece pouco (e ainda é), mas os resultados visibilizam para uma questão que vem crescendo a partir do campo da arquitetura e urbanismo e que pode ajudar a melhorar as condições de vida nas favelas e comunidades periféricas. A Onze8 é a primeira entidade no Espírito Santo a trabalhar especificamente com a Assessoria Técnica para Habitação de Interesse Social (ATHIS).

A proposta é relativamente simples na ideia geral: que nas comunidades mais empobrecidas, as pessoas possam ter acesso a profissionais da arquitetura e outras áreas para melhorar a estrutura de suas residências, combatendo assim possíveis causas de problemas de saúde – no caso da pandemia a situação ficou ainda mais evidenciada -, contribuindo para melhoria na qualidade de vida como um todo e até a autoestima dos moradores. Mas não se trata apenas de obras, e sim de um exercício que exige metodologias participativas, uma observação atenta do entorno, uma escuta ativa dos moradores das residências e, se possível, outras políticas para além da habitação que ajudem a solucionar questões das famílias no âmbito comunitário.


Direita

Esquerda


A escolha das famílias a serem atendidas pelas ATHIS no Território do Bem vem sendo feita pela associação junto a gentes comunitários, que ajudam a escolher as residências a receberem apoio, tendo entre os critérios famílias atendidas pelo Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), dando preferência a famílias numerosas e que tenham mulheres como chefe do lar, além de avaliar questões como a viabilidade das reformas de acordo com os recursos disponíveis e a propriedade da residência. A mão de obra contratada é preferencialmente local, com trabalho acompanhado por arquitetos. Enquanto duram as obras, as famílias são realocadas para uma residência de aluguel.

Embora ainda sejam poucas as iniciativas realizadas, as casas reformadas pela Onze8 pelo projeto Saúde Habitacional, com apoio do Ateliê de Ideias e do Instituto Unimed, servem de exemplo dessa transformação possível e replicável. O foco das primeiras intervenções foi nas chamadas “áreas molhadas” das casas, que envolvem os locais onde correm água, como banheiro, cozinha e área de serviço, que podem impactar mais fortemente na questão da saúde. Obras que vão desde a ligação à infraestrutura de esgotamento sanitário a obras para melhorar o conforto ambiental, iluminação, ventilação natural, isolamento térmico e acústico, entre outras questões. Nas últimas casas atendidas pelo projeto, as obras mudaram as condições das casas de forma ainda mais ampla, incluindo seu aspecto externo, dando a elas um visual novo.

Além das moradias já feitas, outras duas casas recebem assistência da Onze8, com apoio da Associação Espírito-Santense do Ministério Público e do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Espírito Santo (CAU-ES).

O desafio, porém, é conseguir ampliar ainda mais esse tipo de atividade, seja com apoio público ou privado, já que o número de famílias em déficit habitacional ainda é muito grande e se refere não só a pessoas que não possuem casa, mas também a residências em situação precária, coabitação familiar, quando muitas pessoas dividem o mesmo teto com espaço insuficiente, ou o ônus pelo aluguel excessivo, quando as famílias destinam mais de 30% da renda familiar para pagar o aluguel. Além disso, há as condições de inadequação habitacional, que podem envolver problemas de infraestrutura, como falta de abastecimento de água, coleta de lixo, esgotamento sanitário ou energia elétrica, ausência de banheiro interno, piso ou cobertura inadequados e cômodo servindo de dormitório. 

Além das obras que vem sendo feitas, a Onze8 e outras entidades ligadas à questão da arquitetura e urbanismo promovem debates e estudos para que as ATHIS avancem tanto na prática como na teoria e no embasamento para novos projetos e políticas públicas.

ATHIS como políticas públicas?

Conforme o Século Diário levantou, nas últimas eleições, só em Vitória, seis candidatos apresentaram propostas de políticas públicas para ATHIS, citando ou não a sigla, incluindo o prefeito eleito, Lorenzo Pazolini (Republicanos). “A questão só vai ser resolvida se for encarada mesmo como política pública, com investimento das administrações”, analisa Ivan Rocha, integrante da Onze8. Embora reconheça que Vitória tenha realizado atividades do tipo, durante os quase 16 anos em que teve Sérgio Sá (PSB) como secretário de Obras, ele aponta a necessidade tanto de ampliar esse tipo de atividade como de pensar metodologias realmente participativas de diálogo com as comunidades.

No Território do Bem, o movimento comunitário tem sido aliado fundamental no processo de realização das ATHIS, fornecendo inclusive uma série de dados e estudos realizados que ajudam a entender as questões estruturais e também socioculturais que permeiam os bairros do território. “Muitas vezes a família precisa de muito mais do que obras na casa. Precisa do Estado como um todo, de serviços diversos”, avalia Ivan. No tecido social do Território do Bem, diante dos diálogos com o projeto, a proposta foi também avaliar como direcionar outras questões que afetam as famílias a partir dos serviços públicos e comunitários existentes.

Do outro lado da questão, Ivan acredita que o acesso das classes populares ao ensino superior também tem provocado maior interesse pelas ATHIS dentro do campo da arquitetura, podendo futuramente inclusive consolidar esse novo campo no mercado de trabalho, com foco nas habitações de interesse social. “Quando outras pessoas que não da nossa elites estão podendo estudar e querendo trabalhar na sua região geográfica com arquitetura e urbanismo, pensam como aplicar isso na vida real. Cerca de 80% das pessoas não são atendidas pelo mercado da arquitetura, que está voltado para apenas uma parte das cidades, no caso de Vitória, na Poligonal voltada para o mar”, afirma.

Para o integrante do Onze8, é preciso acabar com o preconceito com os territórios periféricos, sem deixar de reconhecer que neles há também construtores e que a autoconstrução é uma realidade muito comum, mas que com apoio técnico e trabalho coletivo pode ser mais eficiente para evitar alguns problemas recorrentes nas comunidades, que vão impactar direta ou indiretamente a sociedade como um todo.

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