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Criação de bloco único de saneamento protege Cesan e SAAEs, avalia Sindaema

Proposta do governo do Estado está em consulta pública até dia 15 e blinda setor de privatização predatória

Pressionado pelo novo Marco Legal do Saneamento Básico brasileiro – Lei nº 14.026/2020 –, o governo do Estado encontrou uma boa solução ao criar o bloco único de saneamento do Espírito Santo, para proteger o setor contra a privatização predatória favorecida pela nova legislação federal.

A avaliação é do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Espírito Santo (Sindaema), que entende o bloco único como uma forma de impedir que as empresas privadas fiquem com áreas mais rentáveis do Estado, como a região metropolitana e grandes cidades, deixando apenas os municípios menores e deficitários sob responsabilidade do poder público.


A proposta de bloco único consta no Projeto de Lei Complementar (PLC) de Criação da Microrregião de Águas e Esgoto do Espírito Santo e está em consulta pública até a próxima terça-feira (15) no site da Secretaria de Estado de Saneamento, Habitação e Desenvolvimento Urbano (Sedurb), atendendo ao prazo estabelecido no novo marco que, caso não fosse atendido, poderia abrir espaço para que o governo federal fizesse sua proposta de regionalização do Estado.
“O que está sendo proposto na consulta pública é um bloco único. Isso dificultaria a privatização, seria uma forma de proteger a companhia estadual [Cesan – Companhia Espírito-Santense de Saneamento] e os sistemas municipais, os SAAEs [Serviços Autônomos de Água e Esgoto]”, afirma João Ramos, presidente do Sindaema, que ressalta “o foco pura e simplesmente de privatizar sem nenhum critério” do governo federal.
“Nós estamos acompanhando de perto, temos a nossa preocupação com o risco de privatização, entretanto, o que está posto [pela Sedurb] é uma oportunidade para que os trabalhadores e a população possam participar do processo de sugestões de alteração no projeto de lei”, avalia.
A entidade – que participa há anos da luta nacional empreendida pelos demais sindicatos estaduais, por meio da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e outras entidades nacionais – salienta o presidente, segue conversando com os atores estaduais e municipais para preservar as companhias estaduais e os SAAEs. O foco, sublinha, “é universalizar o saneamento, não é apenas proteção do emprego”.
No conjunto de defesa das entidades, está ainda o “saneamento público de qualidade com tarifas justas e adequadas”, questão que é “um grande problema da privatização, que sempre faz as tarifas subirem consideravelmente”.
O Sindaema alerta que, “nesse momento, a participação de todos os trabalhadores no processo é fundamental” e orienta a categoria a enviar suas contribuições.

Judicializações
Em paralelo à consulta pública aberta pelo Estado, caminham na Justiça duas Ações Diretas de Inconstitucionalidades (ADIs) contra o novo marco legal imposto pela Lei 12.026/2020. A primeira, a ADI nº 6536, foi impetrada em agosto de 2020 pelos partidos PT, Psol, PCdoB e PSB, e teve pedido de pauta de julgamento feito pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux na última segunda-feira (7).
A FNU e a Confederação Nacional dos Urbanitários, ligada à Central Única dos Trabalhadores (CNU/CUT), explicam que “o julgamento da ADI pode decidir pela continuidade dos contratos de programa, resultando na reversão dos contratos de concessão previstos na nova lei e que desestrutura totalmente o sistema de solidariedade entre entes federativos, prevalecendo a exploração do setor privado sem qualquer resguardo para a preservação do interesse público”.

Doze estatais terão dificuldades
O assessor jurídico da FNU/CNU, Luiz Alberto Rocha, autor da ADI, explica que uma das principais inconstitucionalidades apontadas na ação é o fato de que o novo modelo legal do saneamento permite a privatização seletiva dos serviços dos municípios maiores e mais rentáveis, migrando-os para as empresas privadas, enquanto os municípios deficitários, incluindo municípios com população economicamente vulnerável, permaneceriam bancados pelo poder público.

Na sexta-feira passada (4), outra ADI foi impetrada pela Associação Brasileira de Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe). Ao noticiar a ação, o jornal Valor Econômico destacou que a principal crítica da ADI à Lei nº 14.026/2020 é o prazo estabelecido para que as empresas – públicas e privadas concorrentes aos futuros editais de concessão – apresentem toda a documentação para a análise, até março de 2022, da capacidade de executar os investimentos propostos para as regiões oferecidas à concessão.
“Um executivo observa que o próprio governo atrasou em sete meses a publicação do decreto, o que diminuiu muito o prazo das empresas para a comprovação. A lei exigia que a norma fosse divulgada até outubro de 2020, mas saiu só nesta semana”, expôs o jornal, acrescentando que “a avaliação é que até mesmo grupos que conseguem cumprir os requisitos terão dificuldade para obter os documentos a tempo”.
Ainda segundo o Valor, “uma fonte do setor privado estima que cerca de 12 estatais dificilmente cumprirão os requisitos da primeira etapa de comprovação. Nestes casos, a solução prevista é que a empresa seja privatizada ou abra mão de parte dos contratos”.
Europa faz reestatização do setor
De fato, conforme vem alertando a FNU e demais entidades desde antes dos preparativos para o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama), em 2017, a opção brasileira de favorecer a privatização predatória do saneamento vai na contramão do movimento conduzido pelos países europeus, de reestatização das companhias privatizadas, devido aos péssimos resultados obtidos com a entrada da iniciativa privada, seja na qualidade, quanto na universalização quanto no valor das tarifas cobradas.
A proposta em curso atualmente foi lançada pelo então presidente Michel Temer, por meio de uma Media Provisória em 2018 (“MP Temerosa”). Alvo de intensas críticas orquestradas por um amplo conjunto de entidades estaduais e nacionais ligadas aos trabalhadores e às companhias públicas, a MP foi derrubada, mas depois reeditada no final daquele ano. Em 2019, a proposta temerosa caminhou no Congresso Nacional sob a forma do Projeto de Lei 4162, sendo aprovada com apoio da bancada capixaba.
Ao longo de toda essa mobilização, as entidades asseveram: a solução para universalizar e melhorar a qualidade da péssima cobertura de saneamento básico brasileiro não passa pela privatização, mas pelo investimento público previsto na legislação de 2007, que o novo marco substituiu.
E o investimento não deve se limitar a obras de infraestrutura, como estações de tratamento, elevatórias, redes de água e esgoto, deve também incluir a modernização da gestão, pontuou o urbanitário capixaba Fábio Giori, à época da mobilização nacional contra a MP em elaboração por Temer.
“Falta gestão, mesmo. E gestão pública”, sublinhou. “Fala-se que gestão privada é eficiente, mas eu cito três Parcerias Público-Privadas (PPPs) no Espírito Santo que provam o contrário: o Transcol na Grande Vitória, a Rodosol e a ECO 101”, comparou.

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