Não é seguro o retorno das aulas presenciais em todos os níveis a partir do dia 21 de junho em todo o Estado, incluindo municípios em risco alto de transmissão do coronavírus (SARS-CoV-2), conforme anunciado pelo governador Renato Casagrande nessa sexta-feira (11). A avaliação é de educadores ouvidos por Século Diário, que representam o Laboratório de Gestão da Educação Básica (Lagebes/Ufes) e o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes).
“Semana que vem 100% dos profissionais de Educação estarão vacinados com a AstraZeneca, que provoca uma imunidade grande já na primeira dose”, destacou Casagrande, alegando que essa vacinação, somado com a melhoria da classificação dos municípios no Mapa de Risco que entra em vigor nesta segunda-feira (14), cria um cenário de segurança para o retorno dos trabalhadores e alunos para as salas de aula, mesmo em municípios que estiverem em vermelho no mapa.
O retorno, declarou o governador, seguirá as regras atuais, em que os alunos são divididos em grupos que se alternam semanalmente nas aulas presenciais.
“A partir do dia 21, voltam a educação fundamental, o ensino médio, o ensino superior, os técnicos, todos os níveis. Só se voltarmos a risco extremo, poderemos fazer alguma mudança nessas regras”, afirmou, argumentando que “controlando e coordenando a gestão da pandemia, podemos retornar as aulas nas escolas em benefício para nossa juventude” e que “a cada semana a gente discute se pode dar mais passos”.
A decisão, no entanto, contraria uma série de recomendações científicas, promessas feitas pelo governo do Estado e reivindicações exaustivamente encaminhadas pelos educadores capixabas.
Contexto epidemiológico inseguro
Mesmo a alegada vacinação plena dos trabalhadores da Educação, ainda não aconteceu. Apenas os professores estão sendo imunizados, incluindo os que estão sem salas de aula e os que estão em cargos de coordenação pedagógica, mas deixando de fora uma série de categorias profissionais de apoio.
E, entre os professores e pedagogos, apenas a primeira dose terá sido aplicada antes do prazo determinado para o retorno presencial. A resposta imunológica completa, no entanto, só acontece no organismo três semanas após a aplicação da segunda dose.
Falta transparência
Coordenadora do Lagebes, a professora da Ufes e doutora em Educação Gilda Cardoso repudia o retorno presencial irrestrito neste mês, listando todos os pontos acima, sistematicamente negligenciadas pelo governo do Estado, no afã de atender à pressão do capital privado que, mesmo sendo uma concessão estatal para funcionar e atendendo a menos de 20% da comunidade escolar do Espírito Santo, tem ditado as regras do ensino durante a pandemia.
“Calcular o risco pelo número de leitos desocupados? O próprio governador fala que outros estados estão em ascensão [nos indicadores da pandemia]. O Espírito Santo está numa queda que não é expressiva, o que é muito pior, porque quando voltar a subir, vai ser a partir de um patamar ainda alto. E, mesmo assim, o governo abre tudo! Quantas pessoas mais vão precisar morrer?”, indigna-se.
Vacinação limitada
A
extensão da vacinação, especialmente, é frontalmente contradita. “Quem está nos grupos de vacinação de todas as prefeituras são apenas os professores. E a escola tem outros trabalhadores, que são os mais vulneráveis. Se essas pessoas não têm 50 anos ou mais, não têm deficiência ou não têm comorbidades, estão expostas ao risco e ainda mais sem os EPIs adequados. Esses serviços, praticamente na totalidade das escolas, são feitos por terceirizados, desde o porteiro passando pela limpeza, até a merenda”, expõe Gilda.
Sem falar nos alunos, que, devido à lentidão do governo federal em disponibilizar doses para os estados e municípios, ainda muito distantes de um horizonte de imunização, apesar da autorização dada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para aplicação da Pfizer em crianças a partir de 12 anos.
A coordenadora do Lagebes faz também um apelo para que os trabalhadores se unam mais e promovam outras formas de reivindicação junto ao governo do Estado. “Por uma questão de solidariedade aos trabalhadores terceirizados, que sabemos como estão fragilizados do ponto de vista sindical, é mais do que justo uma greve sanitária da Educação”, pondera, remetendo-se a uma
possibilidade já levantada por coletivos de educadores capixabas no final de 2020.
O Sindiupes concorda com a falta de segurança do retorno anunciado para os municípios em risco alto. Diretor de Comunicação da entidade, Gean Carlos Nunes também se apoia no contexto nacional para exacerbar o perigo de abrir a guarda no Espírito Santo.
“Nunca fizemos um lockdown de verdade, temos um ‘genocida’ no comando do país, provocando aglomerações, pedindo para as pessoas não usarem máscaras”, lembra, citando países como Israel, Austrália, Nova Zelândia e Estados Unidos, “que estão voltando à rotina, mas com segurança, porque a maior parte da população está vacinada. Aqui não é assim. Nem 30% da população foi imunizada. O Brasil precisa vacinar quase três milhões de pessoas por dia, mas não temos feito nem 10% disso”.
O Sindicato, afirma, “conclama o governador para que acelere a vacinação”. “Queremos muito retomar as nossas atividades, nosso trabalho, nossa vida pública, mas num contexto de segurança”.
Além do Executivo, também os poderes Legislativo e Judiciário capixabas precisam mudar o rumo da gestão, avalia o diretor sindical. “Estamos de olho na Assembleia e seu clamor de abrir tudo. O Judiciário não se posicionou em nenhuma das três ações que impetramos junto com a Assopaes [Associação de Pais de Alunos do Espírito Santo]”, relata.