Comunidade é descendente do mestre jongueiro Pedro de Aurora e busca certificação da Fundação Palmares
Uma safra recorde de pimenta-rosa (aroeira) agraciou este ano a comunidade quilombola do Córrego do Felipe, uma das que compõem o Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, em Conceição da Barra e São Mateus, no norte do Estado.
Foram 15 toneladas da especiaria, colhida artesanalmente pelas 40 famílias que vivem no local, em forma de mutirões, gerando uma renda que é a mais robusta do ano e garante apoio financeiro para os próximos onze meses.
“Já somos reconhecidos como referência em pimenta-rosa em Conceição da Barra. O Incaper [Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural] planeja trazer cursos e formações aqui pra gente”, comemora Diogo Gomes, presidente da Associação Quilombola de Pequenos Produtores Agrícolas do Córrego do Felipe (AQPPACF).
Nos mutirões, as famílias pagam aos vizinhos em média R$ 2 por quilo colhido, mas esse ano foi necessário chamar pessoas de fora para ajudar e não perder nenhuma semente. O volume colhido precisa ser vendido no mesmo dia.
O preço médio deste ano foi de R$ 8 a R$ 10 por quilo, mas Diogo ressalta que os atravessadores que compram a mercadoria conseguem vender o mesmo quilo por R$ 20 ou até R$ 30. Por isso, a busca da comunidade por melhorar sua infraestrutura e conseguir melhores rendimentos.
“É um produto de alta qualidade, usado como alimento, medicamento e cosmético, e vendido até no exterior. Queremos extrair o óleo da aroeira, mas para isso precisamos de energia elétrica aqui na comunidade”.
A energia elétrica é uma necessidade que vai além da aroeira, sendo importante para garantir mais qualidade de vida para as famílias e para melhorar a estrutura de irrigação, fundamental para as demais culturas (a aroeira não precisa de irrigação) de subsistência, como mandioca, milho e hortaliças, e as criações de suínos e aves e as frutas, como coco, banana, maracujá e cacau. O excedente da produção desses itens, hoje consumidas nas residências e trocados entre os moradores, poderá ser destinado ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e outras formas de comercialização, ampliando a renda familiar.
A energia elétrica também vai incentivar a adoção da energia solar, pois o sistema de transmissão da concessionária EDP Escelsa sendo instalado na comunidade, o custo de implantação dos painéis é menor, sem necessidade de bateria, com o excedente de energia sendo comprado pela concessionária, num formato em funcionamento há alguns anos no país.
Já há um local eleito para a construção de um galpão, com sala de processamento para a futura agroindústria, que funcionará ao lado da casa de farinha, da casa de oração e do centro cultural, onde as manifestações culturais tradicionais poderão ser fortalecidas, com destaque para o jongo, manifestação folclórica que imortalizou o fundador da comunidade, mestre Pedro de Aurora, reverenciado no documentário de Orlando Bomfim Netto.
No filme, o saudoso cineasta apresenta Pedro como “Tirador de Jongo raiz”, e o mostra em cena entoando seu jongo “Pra ficar menos custoso”.
A partir de 2004, descreve o relatório, as primeiras iniciativas de retomada das terras aconteceram no Sapê, embasadas no Decreto 4.887/2003, que reconhece os territórios quilombolas e estabelece os procedimentos de titulação das áreas aos descendentes.
No caso da retomada do Córrego do Felipe, o protagonista foi o neto de S. Pedro de Aurora, Benedito Santos Guimarães, o Neguinho, cumprindo o desejo de seu avô, que “sempre manteve o desejo de voltar às suas origens”.