Aquecimento global ressalta necessidade de proteger a Reserva de Sooretama da duplicação da BR-101
“A Mata Atlântica do Brasil mudará mais nos próximos 50 anos do que em qualquer momento desde a última Era do Gelo”. A afirmação intitula um artigo publicado no portal The Conversation, que levantou entre pesquisadores capixabas o debate sobre a necessidade de intensificar os mecanismos de proteção da Reserva Biológica (Rebio) de Sooretama, no norte do Espírito Santo, especialmente diante da atual polêmica em torno do licenciamento ambiental para a duplicação da BR-101.
O esforço de recuperação do bioma no Brasil não pode perder de vista remanescentes do porte de Sooretama e demais áreas protegidas do seu entorno, como a Reserva Natural da Vale e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), que somam mais de 50 mil hectares de floresta primária, o maior remanescente de Mata Atlântica de Tabuleiro do país.
Esse conjunto de áreas protegidas, qualifica o biólogo Ygo Silvestre de Deus, “é espetacular” e abriga espécies de grande porte, como onça-pintada, jaguatirica, harpia e anta, que encontram, nessa planície florestada, o último refúgio para sobrevivência em todo o Espírito Santo e um dos poucos do bioma.
Mestre em Ecologia, Ygo destaca que o bloco formado por Sooretama concentra 52,3% do total de espécies reconhecidamente ameaçadas de extinção no Estado. Considerando as espécies classificadas na categoria mais grave, “Criticamente em Perigo”, 60,6% estão ali. E na segunda pior, “Em Perigo”, são 72,2%. “Quando se tem mais da metade da fauna ameaçada concentrada num lugar, a prioridade de conservação é inquestionável”, afirma.
Espécies lenhosas, esclarece, possuem troncos mais robustos, diferentemente das espécies herbáceas e gramíneas que caracterizam esses ambientes invadidos. A mudança, que pode parecer positiva por fazer aumentar a área com espécies florestais, na verdade representa, objetivamente, uma perda imensa de biodiversidade e um dano que deve ser evitado.
“Cada espécie perdida, suplantada por outra, significa menos diversidade para manter o equilíbrio ambiental, que é um direito constitucional de todo cidadão”, afirma. “Devemos intervir e fazer um manejo para evitar e reverter esse processo”, ressalta.
Nesse sentido, a proteção de um santuário da relevância mundial como Sooretama e suas áreas adjacentes é colocado no centro dos esforços não só estaduais, mais nacionais e globais. A duplicação da BR-101, que atravessou ilegalmente a Rebio no final da década de 1960, vinte anos após a criação da Reserva, é uma oportunidade de reverter esse verdadeiro crime ambiental.
O debate, no entanto, já encontra apoio na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal, onde há a promessa de uma audiência pública a ser realizada em breve. O proponente da audiência, deputado Da Vitória (Cidadania), também já fez uma representação no Ministério Público Federal (MPF) sobre a responsabilidade da ECO 101 nas mortes decorrentes de acidentes de trânsito na BR sob sua gestão, em função do atraso nas obras também no trecho sul da rodovia, onde não há qualquer impasse ambiental que justifique tamanho atraso no cronograma de obras.
A importância de Reserva para a conservação da biodiversidade e do clima, bem como os problemas trazidos pela BR-101 – como atropelamentos de animais e a pressão antrópica no entorno, com barragens e cultivos agrícolas – entraram no escopo do episódio dedicado a Sooretama dentro da série Parques do Brasil, produzida pela Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), em parceria com a Casa de Oswaldo Cruz da Fundação Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).