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‘Não vamos desistir da luta e do nosso território’, ecoam indígenas em ato na Capital

Tupinikins e Guaranis enfrentaram a chuva em marcha por direito à terra e contra o Marco Temporal

Leonardo Sá

Tupinikins e Guaranis de Aracruz, norte do Estado, ocuparam a capital capixaba nesta quarta-feira (1). Em frente à Assembleia Legislativa, jovens, crianças e anciãos das 12 aldeias defenderam a demarcação de terras, protestaram contra o governo Bolsonaro e participaram da Primavera Indígena, mobilização realizada em todo o Brasil contra o Marco Temporal.

Durante a manhã, os manifestantes saíram da Praça do Papa e ocuparam uma faixa da Avenida Américo Buaiz. Com cantos, faixas e tambores, caminharam em direção ao prédio da Assembleia. Duas viaturas da Polícia militar acompanharam o trajeto.

Sara de Oliveira

No legislativo estadual, os indígenas deram continuidade às manifestações simbólicas, com danças e pronunciamentos contra a tese do Marco Temporal e contra a agenda anti-indígena do governo federal.

“Vamos dançar, balançar o catimbó, vou trazer o Bolsonaro amarrado no cipó”, cantavam os indígenas em frente à Assembleia. 

Leonardo Sá

 “Essa manifestação somada no Brasil inteiro é de repúdio a essas leis que estão tramitando e outras PEC’s [Propostas de Emenda à Constituição] em curso pelos ruralistas, bolsonaristas e o próprio governo Bolsonaro. Nós faremos todas as manifestações políticas necessárias, agora, amanhã e depois”, disse o vereador de Aracruz e ex-cacique Vilson Jaguareté (PT).

Leonardo Sá

 Da escadaria da Assembleia, a deputada estadual Iriny Lopes (PT) também fez um pronunciamento em apoio ao ato dos povos indígenas. A parlamentar disse que acompanha as manifestações nacionais e ressaltou que os indígenas são uma referência para quem luta pelos direitos humanos.

A vida de vocês nunca foi fácil. Sempre tiveram que lutar pelos seus territórios, pela proteção e manutenção das suas culturas, seja a pesca, seja o manejo da terra, seja o tipo de alimentação. Mas vocês nunca arredaram o pé da luta, também nunca se entregaram. Vocês vêm tocando secularmente a luta de vocês, com força, com garra, com esperança, com alegria e com confiança na vitória”, ressaltou.

Leonardo Sá

No período da tarde, os indígenas permaneceram acampados na Assembleia Legislativa, acompanhando a votação do Marco Temporal pelos celulares. O saguão da Casa de Leis foi cedido para que os manifestantes pudessem se proteger da chuva. Após a realização de outras apresentações culturais, o retorno para Aracruz foi por volta das 16h.

“Aqui, a gente mostra que o povo Tupinikim e Guarani existe no Espírito Santo, somos unidos. Nem a chuva impediu o povo de sair de casa para vir para esse ato, além de mostrar apoio aos outros povos indígenas que estão em Brasília. Nós não vamos desistir da nossa luta, do nosso território, e vamos sempre continuar lutando”, destacou. 

Apoena

Gerações em luta

Assim como as recentes manifestações pelo Brasil, o ato em Vitória foi marcado pela presença da juventude indígena. Mesmo com a chuva, crianças de diversas aldeias marcaram presença no ato, participando das danças e das manifestações simbólicas. Ramily dos Santos, de 15 anos, decidiu sair de Aracruz mesmo sem a companhia dos pais. “Viemos para mostrar que a gente ainda está aqui e para marcar que a terra é nossa, para deixar nossa marca também contra esse governo”, destaca a adolescente.

Os atos também mostraram uma luta conjunta entre gerações. Do centro da roda, a anciã dona Helena, de 72 anos, chamava os jovens para a dança Tupinikim. “A gente tem que se unir para defender o que é nosso. Nasci, cresci e criei meus filhos em Caieiras Velha. Já tenho neto, bisneto e tataraneto, mas, tendo minha força, vou estar aqui junto com eles”, declarou ela.

Carlos Rosário Tupinikim, de 68 anos, é da aldeia Areal, e também decidiu se juntar aos parentes contra o Marco Temporal. “Nós somos legítimos brasileiros. Ninguém vai tomar aquilo que é nosso […] Bolsonaro está tentando roubar nossa terra, mas não vai conseguir, porque nós vivemos aqui e não vamos entregar nossas terras para ele”, disse.

Leonardo Sá

STF e o Marco Temporal

Os atos em Vitória fazem parte da mobilização permanente dos povos originários em todo o país. Após decisão em plenária do acampamento Luta pela Vida, foi decidida a realização de protestos tanto em Brasília quanto nos territórios espalhados pelo Brasil, até que o Marco Temporal seja julgado.

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou a análise do caso nesta quarta-feira (1). Após dois adiamentos na última semana, a Corte deu início às sustentações orais da ação, com falas de representantes da Articulação dos Povos Indígenas (Apib) e do Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina. Ao todo, 39 falas estão previstas. O julgamento prossegue nesta quinta-feira (2).

Leonardo Sá

O caso analisado é o Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que discute uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklãnõ. No entanto, a ação tem repercussão geral, o que significa que servirá de parâmetro para outras 82 decisões no País, considerando território indígena apenas aqueles que já estavam sob sua posse em 1988.

No Espírito Santo, a tese do Marco Temporal ameaça terras demarcadas em 1998, 2002 e 2008. Durante as mobilizações, Iriny Lopes lembrou que a homologação e autodemarcação de terras indígenas foram conquistadas a duras penas no Estado, em luta contra a atual Suzano – ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria. “Foi um momento histórico não só na luta indígena, mas na luta popular de todos que lutam pela liberdade, independência, autonomia e respeito às diferenças”, destacou.

Sara de Oliveira

Diante das ofensivas e ameaças não só do Marco Temporal, mas de toda a agenda anti-indígena em curso no Brasil, os povos originários aldeados no Espírito Santo se somam à luta nacional e prometem resistência.

“Estão querendo matar a comunidade indígena de forma bem devagar. As comunidades indígenas estão chorando. Estão matando nossas matas, nossos rios, e nosso país inteiro, mas não vamos deixar isso acontecer no nosso Brasil”, avisou o cacique Karaí-Peru (Pedro), da aldeia Piraquê Açu, durante o ato desta quarta-feira.  

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