Raciocínio simplista: se nem somos uma civilização perfeita, por que seríamos a única?
Superados os estragos que a pandemia trouxe para a humana raça, as quatro maiores fortunas do mundo se uniram para fabricar aviões mais rápidos que a luz, decolando de um vasto aeroporto afastado dos locais habitados. Leia-se: ex-Floresta Amazônica. Nem o rio sobrou. Não sei se perceberam um pequeno detalhe: decolando, mas não aterrissando. Vai quem quer, ninguém é forçado, e como nos inícios das colonizações do continente americano, vão também os condenados a penas longas ou à pena máxima. Implantam-lhes um minúsculo chip no cérebro – cometendo qualquer delito, Boom! Morte súbita.
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Os que partem assumem apenas um compromisso – enviar fotos e o máximo de informações sobre o que virem e descobrirem para as autoridades. Fato é que cientistas e técnicos não acharam um jeito de trazer as naves de volta – elas podem vagar no espaço, descer em outros planetas que as aceitem, ficar ou partir – menos na Terra. Estranho é o comportamento humano: nunca faltaram passageiros nas saídas anuais dos aviões intergaláticos, mesmo sem informações precisas quanto às possibilidades de retorno: Em algum momento, mas não sabemos quando nem como…Crianças não estão autorizadas a partir.
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Em um dia chuvoso, moral abaixo de zero, fui também – os filhos sumiram pelo mundo, nem e-mails respondem; o marido se mandou com uma funcionária pública aposentada, pensão maior que a minha. O médico mandou pelo correio o diagnóstico – último estágio. Não dão mais essas notícias cara a cara. Tem alguém para quem eu possa mandar o resultado dos exames? Um aceno negativo de cabeça. Então enviaremos pelo correio em dois ou três dias…mandaram.
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Nada posso contar sobre o voo – Anos-luz…quanto tempo é isso? Dormimos, acordamos com as luzes se acendendo, as TVs de bordo chiando à procura de sinais…Primeira refeição servida. As perguntas enchem o ar – Em que ano estamos? Qual o planeta mais próximo? O universo parece um quadro que ficou pendurado na minha sala – tons de azul e caos – o universo em decomposição, pontos de luz nos espiando de longe. Mas de repente…o que é aquela bola vindo em nossa direção? Algum planeta habitado? Ainda não encontraram outras civilizações no insondável deserto intergaláctico, mas não foi também cientificamente comprovado que não existem. Raciocínio simplista: se nem somos uma civilização perfeita, por que seríamos a única?
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Chegamos perto de alguma estrela e parece o dia amanhecendo na terra: vemos esferas que podem ser estrelas, luas e planetas flutuando ao nosso redor, indiferentes à nossa intromissão. Uma bola esverdeada se aproxima – ou nos aproximamos dela. A voz sem dono soa nos alto-falantes: Planeta Agus 345, Nebulosa Vertical 01D7. Possibilidade de água e oxigênio, a cor esverdeada pode indicar vida vegetal…Abordagem centrífuga em duas horas. Apertem os botões em seus celulares – verde, abordar, vermelho, prosseguir. Boa sorte! Fico me perguntando, porque vermelho tem gênero variável e verde não tem?