Justiça determinou que Companhia assuma tratamento de água e esgoto, hoje sob execução da associação de moradores
Mesmo após duas sentenças judiciais, a Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan) e a Prefeitura de Nova Venécia continuam sem assumir o tratamento de água e esgoto na comunidade rural de Cedrolândia, no noroeste do Estado, serviços que foram delegados à operação pela Associação de Moradores local, a partir da implementação do Programa Pró-Rural, em 2009.
O último prazo estabelecido pelo juiz Maxon Wander Monteiro venceu no final de setembro, mas o serviço de abastecimento de água continua sendo operado de forma precária e o esgoto continua sendo lançado in natura no rio Guararema, que atravessa a localidade.
A estiagem que se abateu sobre a região durante o último inverno agravou ainda mais a situação dos moradores, pois o córrego Travessa do Cedro teve drástica redução da vazão e o abastecimento passou a ser feito a partir de um poço artesiano construído há muitos anos na praça da comunidade, e cuja água tem alto teor de ferro, conforme registrado nos autos do processo, a partir de análises feitas pela própria Cesan.
Já o reservatório onde é feita a captação da água do córrego é aberto, sendo utilizado também para dessedentação de animais como bois e vacas.
“O juiz deu a ordem para a Cesan assumir essa água em 90 dias e já se passaram 180 dias e a Cesan não assumiu. Temos crianças, idosos, tudo com problema de saúde por causa dessa água com ferro”, relata o morador Carlos Alberto da Silva, o Betão.
“As pessoas usam essa água pra fazer o alimento em casa. A escola e o posto de saúde também recebem essa água. O teor de ferro é alto, a água é amarela, certamente prejudica a saúde das pessoas. A gente vê no vaso sanitário, quando dá descarga, fica amarelo, da água com ferro. Para beber, quem pode, compra água mineral”, descreve Betão.
O esgoto também é responsabilidade da Cesan, segundo a sentença judicial, mas é outro aspecto negligenciado pela concessionária. “Esse esgoto corre dentro do córrego. A Cesan também não assumiu. A gente está aqui ‘ao Deus dará'”, lamenta.
Já as contas mensais, aponta o morador, continuam chegando, apesar do péssimo serviço. “A Cesan cruza os braços e quem sofre são os consumidores. Já era pra ter assumido a água, com a liminar, mas ela cruzou os braços e está passando por cima da Justiça. Se a Cesan acatar a ordem judicial e assumir a nossa água, eu acredito que acaba esse problema e vai melhorar muito pra comunidade”.
Viabilidade econômica
As sentenças foram expedidas no âmbito da Ação Civil Pública – processo nº 0001351-31.2019.8.08.0038 – impetrada pela Associação Nacional das Donas de Casa e Defesa dos Consumidores do Brasil.
Em suas decisões, o magistrado baseou-se na constatação de que, apesar do contrato referente ao Pró-Rural, a Cesan e a Prefeitura continuam como responsáveis legais pela qualidade dos serviços de água e esgoto que atendem às comunidades.
O juiz criticou especialmente a alegação feita pela Cesan de que “não opera o Sistema de Abastecimento de Água e Sistema de Esgotamento Sanitário da comunidade de Córrego da Penha (…) porque (…) nas localidades onde não ocorre viabilidade econômica [para o serviço] (…) este programa trabalha com a dinâmica do autogerenciamento: a comunidade é mobilizada e torna-se responsável pela operação e manutenção do sistema implantado. Neste caso, a união dos moradores e o suporte do município são considerados imprescindíveis para a operação e manutenção do sistema através da autogestão”.
Para Maxon Wander Monteiro, “chega a ser ofuscante a confissão da empresa de que a concessão a si conferida é tratada meramente como um negócio, deixando de lado e pode-se até dizer esquecida, a finalidade precípua do contrato em debate, que deveria ser a prestação de um serviço público de qualidade aos moradores do interior de Nova Venécia, para que tenham acesso à água potável e ao esgotamento sanitário”.
Além disso, “em nenhum momento o Poder Legislativo veneciano autorizou a concessão para prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário para a Cesan, condicionando a prestação desse serviço pela concessionária à sua viabilidade técnica ou econômica”.