Medida vem após mobilização nacional e veto de projeto semelhante em agosto deste ano
O anúncio foi feito no início da noite desta terça-feira e o decreto será publicado no Diário Oficial do Estado nesta quarta (20). Com um investimento de R$ 5 milhões, a estimativa é que a medida atenda cerca de 50 mil estudantes, de 10 a 19 anos, da rede estadual inseridas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
Para a compra dos produtos, os recursos financeiros necessários serão repassados aos Conselho de Escola, por meio do Programa de Gestão Financeira (Progefe). “A medida visa à promoção da saúde e o enfrentamento da exclusão escolar por meio do combate à precariedade menstrual. A distribuição gratuita de absorventes higiênicos será realizada por meio de cotas mensais, em quantidade adequada, a cada estudante do sexo feminino durante o período letivo”, informa o governo do Estado.
Ao anunciar a assinatura do decreto, a vice-governadora do Espírito Santo, Jacqueline Moraes (PSB), comemorou a decisão e ressaltou a importância do acesso a esses itens de higiene. “É uma política pública importante, porque a vulnerabilidade social tira essas meninas muitas vezes das escolas no seu período menstrual. Nós estamos atentos à política social. No ES Solidário, fizemos uma grande campanha com a sociedade capixaba pela doação desses absorventes e hoje o nosso governo concretiza essa política pública”, declarou.
A autorização para distribuição dos absorventes nas escolas capixabas surge em um momento em que a pobreza menstrual orienta diversos debates pelo Brasil. O tema já era discutido ao redor do mundo, mas ganhou força no país após o presidente da República, Jair Bolsonaro, vetar o trecho de um projeto de lei que previa o fornecimento do produto para estudantes de baixa renda, pessoas em vulnerabilidade socioeconômica, mulheres em situação de rua e presidiárias.
O presidente excluiu a parte do projeto que estabelecia a distribuição gratuita, mantendo apenas uma campanha informativa sobre o assunto. A ação foi alvo de críticas de políticos, entidades não governamentais e coletivos que defendem o direito das mulheres e meninas que menstruam.
Um relatório divulgado em maio deste ano pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) sobre a pobreza menstrual no Brasil mostra que, sem acesso a absorventes menstruais, pessoas em situação de vulnerabilidade utilizam métodos alternativos para conter o fluxo menstrual, como pedaços de pano usados, roupas velhas, jornal e até miolo de pão.
“É evidente que entraves para acessar direitos menstruais representam barreiras ao completo desenvolvimento do potencial das pessoas que menstruam. Por isso, é fundamental que se investigue mais profundamente o tamanho do impacto econômico na vida delas, que pode gerar reflexos ao longo da vida adulta. Faz-se urgente entender, ainda, a importância das perdas econômicas (ou não ganhos) implicadas, não só para elas como para toda a sociedade”, diz o relatório da entidade.
Havia também uma mobilização nos estados, que se posicionaram na contramão do veto do governo federal. Um levantamento do Estadão identificou que, ao menos 13 estados brasileiros, e o Distrito Federal, adotaram alguma medida para combater a pobreza menstrual. Até o anúncio desta terça-feira, o Espírito Santo ainda estava fora da lista.
Em agosto, uma proposta que também estabelecia a distribuição dos absorventes nas escolas foi barrada pelo Governo do Estado. O Projeto de Lei 165/2021, do deputado estadual Rafael Favatto (Patriota), que previa o fornecimento do produto em escolas públicas, por meio do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, foi aprovado na Assembleia Legislativa, mas vetado por Casagrande.
A justificativa foi que a proposta assumia uma competência privativa do governo do Estado, interferindo na execução dos serviços prestados pelas escolas públicas, ao elevar seus custos cotidianos. Na época, o projeto também foi contrariado pela Secretaria de Estado da Educação (Sedu), que alegou não ter dados indicativos que correlacionassem o período menstrual à evasão escolar.
O posicionamento da pasta alegava que o projeto era nobre, mas exigiria “estudo fundamentado em dados reais”, além do planejamento de investimentos e de protocolos de implementação. Procurada por Século Diário nessa segunda-feira (18), a Sedu havia informado que realizava um levantamento do número de alunas em situação de pobreza menstrual.
No entanto, números divulgados anteriormente pela Unicef e pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) já mostravam a urgência do combate à pobreza menstrual. Em uma pesquisa realizada pelas entidades, 62% das entrevistadas que menstruam responderam que já deixaram de ir à escola ou a outros locais em razão do período menstrual, enquanto 71% disseram que nunca tiveram acesso a palestras ou aulas sobre os cuidados menstruais na escola.