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Enem será ‘descolado da realidade brasileira’, apontam ativistas capixabas

Esta semana, Bolsonaro afirmou que a prova, que será aplicada no domingo, começa a ter a “cara do governo”

O primeiro dia do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é no próximo domingo (21), e as preocupações, este ano, superam o tema da redação. Além das recentes denúncias de possíveis interferências no conteúdo das provas, integrantes do movimento estudantil no Espírito Santo acreditam que o exame será marcado, sobretudo, por um distanciamento da realidade brasileira, e pela exclusão de milhares de estudantes pretos e pobres do direito ao ensino superior.

“Vai ser justamente o que a gente vê nessa gestão, que não tem comprometimento com o povo, não fala sobre a sua realidade, não fala sobre os seus problemas, não fala sobre as relações sociais de poder que constituíram o nosso país, e se nega a debater a população brasileira”, aponta a integrante da União Nacional dos Estudantes (UNE) no Espírito Santo, Emanuelle Kisse.

Após o presidente da República, Jair Bolsonaro, declarar que as provas começam a ter a “cara do governo”, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, chegou a afirmar que a frase se referia à “competência, honestidade, seriedade”, mas não convenceu deputados e entidades do movimento estudantil, que temem por possíveis interferências no conteúdo das questões.

Nessa quarta-feira (17), a Defensoria Pública da União (DPU) entrou com uma ação na Justiça cobrando que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela gestão do exame, comprove que não houve fraude ou vazamento de informações durante o desenvolvimento das provas.

Outro ponto de preocupação são as instabilidades no próprio Inep, principalmente após 37 servidores da autarquia, ligados a cargos em comissão destinados à realização do Enem, terem renunciado às próprias funções.

Raphael Reis, diretor de acesso ao ensino superior da UNE no Espírito Santo, acredita que esta será uma prova diferente dos anos anteriores, que sempre levantou questões com temáticas sociais e econômicas que dialogavam com a realidade do país. “Isso gerava reflexões sobre a vida e as questões sociais do Brasil”, ressalta.

Já Emanuelle lembra que a gestão atual é marcada por constantes tentativas de revisionismo histórico, o que também é preocupante. “É muito importante que a gente fique atento a como a nossa história e a do Brasil vão aparecer nesse Enem, como vão querer contar essa história da nossa população”, ressalta.

Os mobilizadores estudantis lembram que, ao longo do ano, alguns problemas já apontavam para o contexto de instabilidade atual. Um deles foi a tentativa de se restringir as possibilidades de isenção do pagamento da inscrição no Enem, exigindo que candidatos que faltaram à última edição justificassem a ausência para ter direito à abstenção do valor. Em setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela reabertura do prazo para pedidos de isenção, sem a exigência de comprovação.

Exclusão e falta de acesso

Raphael tem contato próximo com estudantes que se preparam para as provas e teme que alunos pretos e de baixa renda sejam os mais prejudicados. Ele participa da organização do cursinho de educação popular Tereza de Benguela, que oferece aulas a vestibulandos em situação de vulnerabilidade.

“A gente via uma universidade que estava se popularizando, cada vez mais com a cara e o sentimento do povo brasileiro, com pessoas fazendo estudos importantes a partir das suas realidades. Quando essas pessoas ocuparam esses espaços, principalmente os negros e negras, por meio das cotas, e as pessoas mais pobres também por meio das cotas sociais, eles começaram a querer pesquisar e produzir academicamente e produzir conhecimento a respeito de suas vivências, a partir de suas realidades”, aponta, alertando que “a falta dessas pessoas na universidade vai gerar um atraso nessa compreensão, que é tão importante para gente saber, de fato, qual é o retrato do Brasil”.

Um dos motivos de preocupação do mobilizador é a falta de apoio tecnológico para os estudantes durante a pandemia, período em que os alunos tiveram que se adequar ao ensino remoto. Para ele, uma das consequências das instabilidades na realização da prova pode ser a repetição do que se viu na última edição: a falta de perspectiva de se ingressar no ensino superior.

Em relação à “cara do Enem 2021”, os mobilizadores não têm uma perspectiva animadora, principalmente considerando os baixos níveis de realização do exame na edição passada e inscrição nesse ano. Para Emanuelle, levando em conta as políticas atuais do governo federal, que já afirmou que “a universidade é para poucos”, as provas serão marcadas pela exclusão.

“A gente sabe que quem vai ser excluído da prova e deixar de adentrar à universidade, vai ser a população negra e periférica, os trabalhadores, jovens e pessoas mais velhas. A gente sabe que essa parte da população é a que mais tem sofrido com o governo Bolsonaro e também vem perdendo o seu acesso e permanência dentro da universidade”, enfatiza.

O Enem 2021 será aplicado no próximo domingo (21) e no dia 28 de novembro, tanto para quem vai fazer a prova física quanto a digital. De acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), as provas que serão utilizadas no Espírito Santo já estão em território capixaba, armazenadas em um depósito que está sob coordenação dos Correios.

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